Este documentário é uma produção da Associação Tchiweka de Documentação e da Geração 80, cuja apresentação trazemos com o possível resumo.

"Tivemos uma das lutas de libertação mais longas de África, com uma guerra que durou 13 anos. Durante esses anos vivemos a luta nos mais diversos cantos em Angola e no mundo. Não éramos só uma geração de jovens com ideias revolucionárias. Éramos homens e mulheres comuns, de várias gerações, de diferentes regiões de Angola e diversos percursos de vida."- esta é a nossa memória.

O documentário "Independência" nasceu da necessidade de preservar a história e as histórias dos que participaram na luta de libertação de Angola. Muitos ainda estão vivos e lúcidos, mas poucos documentaram o seu percurso ou tiveram a oportunidade de falar do que viveram, fora do círculo da família e amigos.

O filme resultou do projecto angola - nos trilhos da independência, que juntou a produtora audiovisual Geração 80 e a Associação Tchiweka de Documentação, instituição dedicada à preservação de documentos e divulgação da história daquela luta.

O projecto arrancou em 2010 e pretendia recolher o maior número possível de testemunhos pessoais. A tarefa era urgente, pois a cada dia se perde mais uma voz dos protagonistas. O momento era oportuno, no país finalmente sem guerra e com o distanciamento histórico e a serenidade que este tipo de depoimentos requer.

Entre 2010 e 2015, angola - nos trilhos da independência produziu mais de 1.000 horas de entrevistas a cerca de 600 participantes da luta pela independência e personalidades, nacionais e estrangeiras, com ela relacionadas. Foram filmados locais associados a essa luta, alguns pela primeira vez. diversos países foram visitados, mas o maior volume de trabalho foi, naturalmente, em angola.

O projecto, dirigido por Paulo Lara, teve diversos apoios individuais e de instituições públicas e privadas. Um projecto destes permitirá fazer vários filmes. A opção por um documentário como independência explica-se pela obrigação de devolver à sociedade angolana um pouco do que dela recebemos e pela convicção de que, por mais importante que seja o arquivo, é preciso fazer algo para o presente.

Se a memória dos mais velhos é a matéria- prima do documentário, o público-alvo foram, desde o início, as gerações nascidas depois de 1975, que não conheceram o sistema colonial e pouco sabem do passado. Independência apresenta uma outra imagem da resposta angolana ao domínio colonial e da luta de libertação nacional, vista por quem nela participou.

Nota do Realizador

"Como a maior parte das pessoas da minha geração, eu tinha um desconhecimento profundo do nosso passado, ensinaram-nos mais a estar e a reagir no presente. As poucas reflexões sobre o passado eram sempre partilhadas pelos kotas com uma dose de saudosismo e amargura. Comecei a querer conhecer melhor as pessoas e as ideias daqueles que lutaram pela independência do nosso País. Trabalhar seis anos no projecto Angola - nos Trilhos da independência , com acesso ao centro de documentação da Associação Tchiweka, foi essencial para conseguir fazer este documentário. A narrativa e estética do filme baseiam-se muito no processo e na experiência que tive durante esses anos, convivendo com as memórias daqueles que deram os seus testemunhos e com os materiais de arquivo. Ler num jornal a notícia das prisões do "processo dos 50", ouvir uma gravação de Che Guevara reunido com nacionalistas angolanos no Congo, ou ver as fotos do dia-a-dia nas bases de guerrilha, deixavam-me sempre emocionado. Por isso, em todos os mapas, fotos, documentos, jornais, cartas do filme, sente-se essa procura, esse revelar e encontrar o passado, depois de mais de 40 anos. O ponto de vista do filme é o da geração que participou na luta, são eles a partilhar as suas memórias. A própria intervenção do narrador foi escrita nesse tom, de alguém que hoje olha para trás e faz uma reflexão sobre esse tempo, e se pergunta, "que memória resta da nossa luta?" Concluído o filme, espero que ele consiga criar diálogo entre as gerações que participaram na luta e as que nasceram depois de 1975. Está na hora de olharmos para o passado com os pés bem assentes no presente, e reflectirmos sobre onde estamos e o que somos, como pais, 40 anos depois da nossa independência."

História e Memória

A 11 de Novembro de 1975 Angola proclamou a independência. 14 anos depois do inicio da luta armada contra o domínio colonial português .

O regime de Salazar recusava qualquer negociação com os independentistas aos quais restava a clandestinidade, a prisão ou o exílio quando quase toda a África celebrava o fim dos impérios coloniais. Angola e as outras colónias portuguesas seguiam um destino bem diferente. Só após o golpe militar de 25 de Abril de 1974 ter derrubado o regime. Portugal reconheceu o direito dos povos das colónias à autodeterminação.

Independência parte de memórias da situação colonial. Revela os passos iniciais da luta e percorre alguns dos seus principais cenários. De 1961 a 1974, a guerra em Angola alastrou das matas do norte e de Cabinda para as chanas do Leste, envolvendo inúmeras pessoas, combatentes ou apoiantes da guerrilha.

Entretanto, prisões e campos prisionais enchiam-se de presos políticos mas, através do esforço militar e de reformas económicas e jurídicas, Portugal pôde prolongar uma guerra que não poderia vencer.

Os anos de luta evocados em "Independência" determinaram o rumo de angola após 1975. Opções políticas, conflitos internos, alianças internacionais começaram a desenhar- se durante a luta anticolonial.

As principais organizações (FNLA, MPLA e mais tarde UNITA) nunca fizeram uma frente comum e as suas contradições eram ampliadas pelo contexto da guerra fria. A independência foi proclamada já em clima de guerra mas com muita emoção e orgulho, como contado no filme. Nenhuma história, "toda a história".

Independência conta a luta a partir de dentro, dando voz a protagonistas angolanos de diferentes origens sociais. Regionais e políticas, cujos testemunhos são menos conhecidos. essa opção explica a ausência de outras vozes e a escolha dos entrevistados, cada um representando, de alguma forma, um grupo maior trazendo a sua vivência para uma narrativa colectiva.

A memória de uma nação faz-se de muitas memórias. Que urgente recolher. Usando a linguagem do cinema para articular memórias pessoais e arquivos. "Independência" coloca-se na linha da frente contra o esquecimento da história.