Num comunicado enviado à imprensa, Ban Ki-moon enfatiza o receio da comunidade internacional de que Bissau não tenha capacidade de resposta à altura para um cenário em que a Al-Qaeda, ou outros grupos de extremistas islâmicos do Norte de África, se instalem no país, aproveitando as óbvias fragilidades do Estado guineense.
Este cenário, traçado no documento é claramente exponenciado pela prolongada crise política que o país atravessa, gerada por sucessivos desentendimentos entre os partidos, especialmente entre o Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC) e o Partido da Renovação Social (PRS), o Parlamento e a Presidência da República.
Mas o que diversos analistas admitem como mais plausível como razão para os receios da ONU, e do seu secretário-geral, é a forma como, com maior ênfase nas últimas três décadas, o Islão tem conseguido implantar-se no país, convertendo várias das mais de três dezenas de etnias que existem no país, algumas delas com tradições cristãs, mas essencialmente praticante de cultos animistas.
A Arábia Saudita é o maior financiador da construção de dezenas de mesquitas no país e são conhecidos esforços de Riad para fomentar na Guiné-Bissau o waabismo, uma versão radical do Islão, mas também financiando excursões de guineenses a Meca, que é um dos pilares essenciais do Islão que todos os muçulmanos devem cumprir pelo menos uma vez na vida.
Uma das questões mais prementes, segundo contactos feitos pelo Novo Jornal Online, é a existêndcia de internatos financiados pelos sauditas onde as autoridades guineenses não controlam os programas nem sabem que tipo de ensino é ali praticado.
Estes centros de ensino não convencionais, estima-se em Bissau, integram largas centenas de crianças, podendo ser milhares porque não há registos oficiais.
Neste documento, que hoje é divulgado oficialmente em Nova Iorque, Ban Ki-moon recorda que outras instituições mundiais, como o Banco Mundial ou o Banco Africano de Desenvolvimento e a União Europeia interromperam o financiamento ao país, por causa da crise política e da perene dificuldade dos seus dirigentes em encontrar soluções que abram a porta à estabilidade duradoura.
Este dado é de extrema importância porquanto cerca de 80 por cento do financiamento do estado guineense é suportado pela ajuda internacional, sem a qual o país deixaria de funcionar nos moldes em que funciona um Estado, especialmente pelo aprofundamento da incapacidade, já grande, de controlo das suas fronteiras.
De sublinhar que a Guiné-Bissau tem um sistema judicial extremamente fragilizado, a corrupção é endémica, as forças de segurança carecem de urgente reorganização e o Estado não garante os deveres mínimos recomendáveis pelas organizações internacionais em áreas como a saúde e a educação.
Não surpreende, por isso, que a ONU exponha publicamente os mais sérios receios de que, depois dos traficantes de droga sul-americanos, também os radicais islâmicos encontrem no território um refugio seguro para alguns dos seus dirigentes mais procurados ou ainda para organizar e preparar eventuais atentados fora de fronteiras.
Outro dado que está sempre presente neste tipo de análises à situação na Guiné-Bissau é a sua localização geográfica privilegiada, na África Ocidental, entre o Senegal, a Norte, e a Guiné-Conacry, a Sul, com um arquipélago constituído por mais de uma centena de ilhas e ilhéus, os Bijagós, a escassos quilómetros das suas costas, alguns deles desabitados e sem a mínima vigilância pelas autoridades do país.