A imagem do corpo de Jonas Malheiro Savimbi, tombado e cravejado de balas correu mundo em Fevereiro de 2002. Quinze anos depois da morte, qual o legado deixado pelo líder histórico da UNITA?

Para Alcides Sakala, porta-voz do maior partido da oposição, parte dessa herança permanece bloqueada pelo Governo, por "ignorância" na resolução de "casos pendentes".

"Muito pouca coisa foi devolvida. O nosso património é avaliado em milhões de dólares, portanto é imenso", aponta o responsável, que reclama um extenso espólio, composto sobretudo por edifícios, situados não apenas em Luanda mas em todo o país, como é caso da "Casa Branca" de Savimbi no Huambo.

"São os bens do partido e que, conforme ditavam os acordos de paz, deveriam ser devolvidos à UNITA, o que ainda não aconteceu. O que foi entregue são coisas mínimas", reforçou o também deputado à Assembleia Nacional, em entrevista à agência Lusa.

Da mesma forma que o partido do "Galo Negro" alerta para compromissos adiados há 15 anos, dois dos filhos de Savimbi lembram que continuam a lutar por um "funeral digno" para o pai.

"Vamos sempre fazer o pedido até que um dia aceitem e nos dêem os restos mortais. Gostaríamos de fazer um funeral digno na terra dele, na terra natal", adiantou Helena Savimbi, sublinhando que o pai "sempre quis ser enterrado" numa aldeia do município de Andulo, na província do Bié.

O outro filho, Aleluiah Savimbi, que tal como Helena falou com a agência Lusa a partir de Paris, sublinha que o processo "está nas mãos do Governo angolano".

"Nunca vimos o corpo do nosso pai e é muito difícil fazer o óbito para a família porque nunca tivemos o corpo dele e mesmo as nossas crianças hoje não sabem onde é que está o corpo do avô. É uma situação que é muito preocupante e que, infelizmente, nunca avançou até agora".

"Um homem que sempre amou Angola e África"

O problema das exéquias, segundo acrescenta o actual presidente da UNITA, Isaías Samakuva, radica no processo de exumação dos restos mortais de Jonas Savimbi, parado devido à necessidade de desminar o cemitério que deverá receber os restos mortais do fundador do partido.

"Não sabemos por que razão, mas este cemitério, já durante a guerra, chegou a ser minado. A área que circunda o cemitério e as vias de acesso tinham sido minados. Um evento como o funeral do doutor Savimbi requer muito mais cuidado", assinala o líder da UNITA.

O partido chegou em Maio de 2014 a criar uma comissão para tratar do processo de exumação dos restos mortais de Jonas Savimbi - que ficou sepultado, logo após a morte, no cemitério de Luena, Moxico - e trasladação para o cemitério da família, na aldeia de Lopitanga, município do Andulo, a cerca de 130 quilómetros a norte do Kuito, província do Bié.

"A comissão tinha um calendário [para tratar da exumação], mas ficou sem capacidade para continuar a andar porque uma parte das tarefas só podem ser executadas pelo Governo, nomeadamente a necessidade de se desminar a área onde se pretende que seja o repouso final dos restos mortais do doutor Savimbi", explicou Samakuva.

Além de relembrar as questões que, 15 anos depois da morte do seu fundador permanecem pendentes, a UNITA recorda o seu papel histórico.

"Era um homem muito corajoso, um homem profundo nas suas reflexões, um homem que sempre amou Angola e África. Essencialmente é um homem dedicado pela causa dos angolanos, pela qual deu a sua vida, morreu lutando por aquilo que acreditava que era melhor para Angola que é a própria democracia", observou Sakala, que foi colaborador próximo de Savimbi.

Segundo o porta-voz do "Galo Negro, poucas horas antes da morte em combate do antigo líder, preparava-se para se reunir com o mesmo para lançar "contactos exploratórios" com o MPLA.

"Ele achava por esta altura, antes de 22 de fevereiro [de 2002], que poderíamos nos encontrar para relançar o princípio da procura de contactos exploratórios entre a UNITA e o MPLA", apontou o também deputado, garantindo que essa pretensão esteve quase para ser concretizada.

Já Isaías Samakuva destaca o facto de as "profecias" do fundador sobre o país se terem cumprido.

"Todos os ensinamentos que o doutor Savimbi nos deixou, e todas as suas profecias, posso chamar assim, são vivenciadas agora, falavam de situações que acontecem agora. De um país que tem potencialidades enormes e é incapaz de facultar aos seus cidadãos uma vida condigna, aquilo que é de básico para a vida de qualquer pessoa", afirmou o líder da UNITA.

"Nós constatamos que as causas que levaram o país à situação presente são as causas que sempre foram previstas pelo doutor Savimbi. Ele dizia mesmo que o país corria o risco de ver uma burguesia que iria se comportar de uma forma pior do que os colonialistas e que cuidaria apenas dos seus interesses e não dos interesses do povo", enfatizou Samakuva.

Jonas Savimbi acabaria por morrer aos 67 anos, acossado por uma ofensiva das tropas governamentais, na região do Lukusse, zona leste do país.

O fim da guerra civil em Angola chegaria cerca de um mês e meio depois, com a assinatura dos acordos de paz entre a UNITA e o MPLA.