Em nosso entender, o principal problema da FNLA radica na inaptação de um partido histórico de matriz étnica para um partido de abrangência nacional. Tanto ao nível do quadro legal como no discurso comum instalado, o ideal perseguido pelos partidos políticos é o universo do país, sob o risco de acusações de tribalismo, partidos de base étnica etc., etc.

Mesmo que o discurso politicamente correcto não o reconheça, a verdade é que a grande maioria (senão todos) dos nossos partidos tradicionais projectou a sua identidade política em função de uma identidade étnica ou vice-versa, ou seja, a identidade política foi definida também com o concurso da formação da identidade étnica.

O histórico de alguns desses partidos, a língua nacional predominante, os hábitos assumidos e até as igrejas que maioritariamente eram professadas pela maioria dos militantes e dirigentes desses partidos resultavam de pequenas representações das suas áreas de intervenção.

Muito da visibilidade política e social dos actuais e antigos dirigentes desses partidos históricos colocou-os em cargos e posições políticas que num partido mais abrangente não conseguiriam com tanta facilidade.

A identidade cultural não pode, por isso, ser afastada da expressão política na exacta medida em que a mobilização política para a luta armada de libertação contra o colonialismo se fez em boa parte por via da afirmação dos nossos valores culturais etnolinguísticos que eram recusados ou menorizados pelos colonialistas.

De resto, essa realidade é facilmente verificável na música, poesia e outras expressões culturais da época que representaram a base do processo de conscientização político-cultural que se registou.

Ao definir-se como objectivo a transformação legal e formal dos partidos de base étnica em instituições de abrangência nacional, isso pressupunha o abandono dessa base e a inclusão nas lideranças, práticas e maneiras de estar de uma visão nacional.

Os partidos teriam de se (re)construir tendo como ideal a heterogeneidade dos seus militantes e a defesa da unidade nacional, o que no caso da FNLA não resultou. E essa tentativa não conseguiu eliminar o regionalismo e o particularismo étnico da sua origem.

Partidos históricos, como é o caso da FNLA, ou novos, inspirados numa lógica de identidade cultural, ao não conseguirem transformar-se efectivamente em marcas nacionais em termos de visão, composição da estrutura dirigente e militantes, acabam irremediavelmente conduzidos à falência.

O nosso modelo eleitoral e político deveria ser flexível e menos "ocidental", permitindo que as identidades culturais e seus regionalismos se pudessem exprimir enquanto formas políticas, sem que isso representasse um perigo para a unidade nacional como se pretende fazer crer.

No plano do imaginário, isso seria o cenário ideal para a sobrevivência da FNLA que assim seria um partido de âmbito regional, com a promoção de lideranças locais e com a respectiva representação da identidade cultural representativa da sua zona de influência.

(Leia este artigo de opinião na íntegra na coluna "Democracia e Cidadania", publicada na edição n.º475 do Novo Jornal, nas bancas, e também disponível em versão digital, que pode pagar no MultiCaixa)