A visita de João Lourenço a Cabinda não é uma visita qualquer. O tratamento a dar a esta província mais ao Norte de Angola, pelas suas múltiplas especificidades, confere-lhe um estatuto diferenciado. João Lourenço vai a um enclave marcado pela descontinuidade geográfica, povoado quase por mais estrangeiros do que por angolanos e entalado entre dois países com apetites aguçados sobre as suas riquezas.

É sabido que encontrará em Cabinda uma franja da população que não morre de amores pela política do MPLA depois de sucessivas promessas não cumpridas de Eduardo dos Santos. Ao invés de prometer o irrealizável, espera-se que João Lourenço saiba estabelecer um diálogo franco e aberto com todos os actores, incluindo aqueles que, não partilhando dos pontos de vista do MPLA, se mostram dispostos a encontrar uma solução inspirada num "acordo que satisfaça as ambições" da população local, "enquanto território não autónomo" mas com um modelo de gestão administrativa diferenciado.

Uma diferenciação que aproxime a sua governação à qualidade governativa do Chile e que não se limite - como têm reivindicado alguns governadores do enclave - a colocar estes dois territórios mano a mano em termos orçamentais, sobretudo quando por aqui não se tem a mínima noção do valor dos dinheiros públicos.

Já estive na Argentina, perto do Chile, mas, sendo países vizinhos que partilham a mesma Cordilheira dos Andes, a Argentina é a Argentina e o Chile é o Chile.

Já fui algumas vezes a Cabinda, mas só de passagem. Estive no Congo Brazzaville quando estive em trânsito para Kinshasa, numa altura em que o encarregado de negócios era o falecido Kamú de Almeida. O meu grande companheiro de viagem era o também falecido Chico Ventura, treinador da TAAG, que, tendo sido meu Míster nas escolas do ASA, levava na bagagem um trunfo que entrava em campo à margem dos regulamentos da Taça da AFRA - Associação de Futebol das Companhias Aéreas Africanas : a lata de leite Nido!

Foi assim que conheci alguns dos mais famosos e corruptos dirigentes federativos do Zaire. Mas foi assim também que conheci gente muito culta cujo saber e competências intelectuais reconhecidos no estrangeiro nada têm a ver com os vendedores e micates importados daquele país que pululam pelas ruas das nossas cidades ou pelas zonas diamantíferas das Lundas e do Bié.

Mas, "cá entre nós", o que adorava mesmo conhecer era a Patagónia chilena e mergulhar, "ao vivo e a cores", na sua história e cultura e aprofundar o mistério que envolve o prolongamento do Império Inca. Adorava conhecer outras atracções turísticas, que permitem a este pequeno país, de 4.300 quilómetros de comprimento e 175 quilómetros de largura, arrecadar anualmente mais de 5 mil milhões de dólares de receitas com a entrada de turistas.

Adorava conhecer este "país de poetas", como Pablo Neruda, o mais famoso, que foi consagrado Prémio Nobel da Literatura em 1971, depois de Gabriela Mistral em 1945 e a quem o Chile homenageia diariamente com um Centro Cultural activo e arquitectonicamente fabuloso situado bem no coração de Santiago, a capital chilena. Não conheço o Chile. Paciência.

Mas sei que por lá houve uma revolução populista liderada por um idealista, movido pelas melhores intenções, que se propunha oferecer uma sociedade mais justa aos chilenos. Era uma revolução inspirada na "fé" castrista, que encantava o Terceiro Mundo mas à qual o Ocidente não achava graça alguma.

(Pode ler este artigo de opinião na íntegra na edição 477 do Novo Jornal, também disponível por assinatura digital, que pode pagar no Multicaixa)