Kamwina Nsapu era um respeitado líder tradicional com forte implantação do Kasai e no Kasai Ocidental, regiões geograficamente próximas da fronteira angolana da Lunda Norte, e foi morto pelas Forças Armadas da RDC (FARDC) em Agosto de 2016, depois deste se ter sublevado contra o Estado congolês.

Depois da sua morte, eclodiram uma série de confrontos, alguns de grande violência, com sequelas de terror contadas por inúmeras execuções sumárias de um lado e do outro, com a descoberta de dezenas de valas comuns e ainda com o rapto e a decapitação de funcionários da ONU, somando mais de 400 mortos e mais de um milhão de deslocados, centenas em Angola.

Confrontado com a evidência de uma impossível solução militar, devido ao elevado número de fiéis de Nsapu, forte implantação regional e a coragem demonstrada em combate por parte das suas milícias, e face às preocupações crescentes da comunidade internacional, com Angola na linha da frente, o Governo de Joseph Kabila optou por encetar conversações com a família do antigo chefe costumeiro por forma a por fim a um dos mais graves, de entre vários em curso na RDC, que varrem o país.

Uma das reivindicações da família de Kamwina Nsapu e dos seus aguerridos seguidores é proporcionar ao falecido as cerimónias fúnebres tradicionais que não lhe foram concedidas aquando da sua morte em combate.

Para isso, Kabila acaba de enviar a Kananga, capital provincial do Kasai e coração deste universo costumeiro de Nsapu e das suas milícias, o seu ministro do Interior, Emmanuel Ramazani Shadary, para se sentar à mesa com os seus representantes.

A família de Nsapu que continua a reinar segundo os princípios costumeiros na região, tem um conjunto de reivindicações que, agora, o Governo de Kinshasa se viu obrigado a aceitar, especialmente quando a estabilidade em Kinshasa, onde também morreram nos últimos meses centenas de pessoas em confrontos de natureza política, depende da realização de eleições até final de 2017 e não é sustentável para o regime manter tantas "frentes" de tensão.

O ministro do Interior disse, citado pela radio das Nações Unidas, Okapi, à chegada a Kananga, que a sua presença na região tem como objectivo desenvolver conversações com a família de Nsapu, por forma a corresponder aos seus anseios e permitir a realização de um escrutínio "justo, livre e transparente" em todo o país, incluindo os Kasai.

Família exige exumar o corpo de Nsapu

Para a família Nsapu e para os seus seguidores, a primeira exigência e exumar o corpo e realizar cerimónias fúnebres conformes à tradição local e seguir o ritual costumeiro que corresponde a um chefe, o que não foi feito quando este tombou sob as balas das FARDC.

Por outro lado, as milícias já deixaram claro que têm de ser criadas condições para a designação de um novo chefe tradicional por parte da família reinante, cuja entronização resulta de uma formalidade a cargo do ministro dos Assuntos Costumeiros.

Ainda segundo as análises produzidas pelos media congoleses sobre este assunto, sendo natural que Kinshasa, depois de aceitar lidar de forma decisiva com este assunto, ele possa ser ultrapassado, permanece uma dúvida que pode conter alguns riscos.

Dúvida essa que passa pelas negociações com Kinshasa, visto que, de entre as razões para a sublevação de Kamwina Nsapu estavam questões de natureza autonomistas e de recusa de aceitar algumas instituições do Estado no seu "Reino".

Se este ponto vai continuar a afiar as lâminas dos guerreiros do antigo chefe tradicional só se vai saber depois da conclusão desta visita do ministro do Interior da RDC ao coração do "Reino" de Kamwina.