Já ninguém duvida que questões políticas estiveram em causa para que as duas operadoras decidissem expurgar os "incómodos" canais portugueses, e esta tomada de decisão é tudo menos um acto isolado ou casual, pois trata-se na verdade de um posicionamento com motivações políticas de sobra que parte de uma esfera que não é necessariamente aquela que nos habituamos a ver tradicionalmente a aplicar a censura, como, de resto, ficou bem patente no caso do retrógrado pacote legislativo sobre a comunicação social. O que representa um claro sinal de que não há coincidências gratuitas.

Tudo a que tínhamos assistido até aqui foram decisões políticas a determinarem a actuação de grupos económicos. Ou seja, vimos emergir uma elite política que ao mesmo tempo actuou sempre como empresária, que fazia e faz - agora de forma mais velada - negócios com o Estado.

Ao longo desses anos, essa elite precisou de um "passaporte" político para conseguir penetrar e pôr-se à vontade nos vários negócios, e em muitos deles o próprio Governo era o principal cliente.

Contudo, a mudança de protagonistas ao nível do poder político em Angola que se avizinha com a realização das eleições em Agosto faz com que o centro desse poder comece a deslocar-se para uma outra esfera: a económica. Na verdade, onde sempre esteve e de onde teve origem, só que agora começa a assumir o seu poder real.

Porque o poder político, que constituiu anteriormente a rampa de lançamento da elite empresarial, é hoje mais suportado pelo poder económico do que o contrário. É esse poder que se assenhorou dos grandes interesses nos vários sectores empresariais e económicos do país e começa agora a dar sinais de como o país vai politicamente passar a coser-se no que depender da sua acção. Logo, essa deslocação do centro de decisão política para a esfera económica vai ser determinante em muitos casos em que estarão em causa motivações e interesses políticos.

E a decisão de suspender os canais SIC já obedece a essa lógica. Ninguém pode acusar o regime de o ter feito.

A questão legítima que se levanta será: o que tem uma operadora a ver com outra, partindo do princípio que uma é sul-africana e outra de direito angolano?

(A opinião de Nok Nogueira pode ser lida na íntegra na edição semanal do Novo Jornal, nas bancas, ou em formato digital, cuja assinatura pode pagar no Multicaixa)