Há mais de seis meses que os mercados petrolíferos não se mostravam tão satisfeitos, chegando mesmo, na segunda-feira, a trepar 10% nos gráficos de Londres e Nova Iorque, mas acabou por consolidar uma subida média de 8% entre o Brent e o WTI, porque aquilo que as economias de todo o mundo aguardam com maior expectativa é uma solução para a pandemia que desde Fevereiro deste ano está a destroçar a procura pela matéria-prima enquanto reflexo de acentuadas quebras na produção industrial generalizada mas com maior ênfase em países como os EUA, a China, a Índia ou mesmo o Brasil.

Entretanto, depois dos foguetes lançados na segunda-feira com o anúncio feito pela farmacêutica norte-americana Pfizer, como o Novo Jornal noticiou aqui, a normalidade voltou hoje em força a mostrar-se na abertura dos mercados e o avanço da pandemia, como é disso exemplo a passagem da barreira psicológica dos 10 milhões de casos nos Estados Unidos da América, está, de novo, a esmagar o preço do barril, apesar de ainda, perto das 10:00 de Luanda, não de forma negativa.

Assim, o barril de Brent, referente a contratos para Dezembro, estava a valer a essa hora 42,64%, mais 0,47% que no fecho de ontem, segunda-feira, e no WTI, a medida padrão universal para o crude valia 40,57 USD, mais 0,69 que no encerramento da última sessão.

Face a esta situação, resulta evidente que uma vacina é, e sê-lo-á ainda mais efectivamente quando estiver disponível, um tremendo "game-changing" para os mercados petrolíferos, como a casa financeira JP Morgan, citada pela Reuters, disse numa nota divulgada nas últimas horas.

O facto de já hoje as coisas terem arrefecido nos mercados e tudo parecer mais "normal" é resultado da constatação de que os números da pandemia continuam a progredir em todo o mundo, sem que, para já, os severos confinamentos que voltaram a ser aplicados na Europa, mas também noutras partes do mundo, estejam, para já, a mostrar serem eficazes, ao mesmo tempo que aumenta os protestos populares a esse tipo de medidas restritivas da mobilidade na comunidade.

E isso mesmo será ainda mais incisivo nos mercados quando os Estados Unidos, pelo menos nos estados democratas, anunciarem medidas similares à europeias e o país, no seu conjunto dos 50 estados, fizer o mesmo a partir de 20 de Janeiro, data em que o negacionista Presidente Trump deixará obrigatoriamente a Casa Branca para dar lugar ao Presidente Joe Biden, um defensor acérrimo de medidas eficazes para travar a expansão do novo coronavírus.

Por outro lado, a OPEP+, a organização que agrega os produtores cartelizados (OPEP) e a Rússia à frente de um conjunto de produtores não-alinhados, já veio dizer que poderá rever o seu plano de cortes em actividade se as condições globais assim o aconselharem.

Isto quer dizer que a diminuição prevista nos cortes em 01 de Janeiro de 2021 dos actuais 7,7 milhões de barris por dia (mbpd) para 5,5 mbpd poderá ser revisto e manter, ou até mesmo aumentar os cortes, se a vacina não estiver no terreno e a ser distribuída entretanto.

A OPEP+ vão ter uma nova e quiçá decisiva reunião nesse aspecto no final do mês de Novembro, para a qual se espera uma clarificação daquilo que o "cartel" ode ou não estar disponível para fazer na resposta às oscilações do mercado.

A importância dos sinais que chegam da "América"

Com o somar continuado de sinais de que Donald Trump, o Presidente que mais apostou no sector petrolífero norte-americano, especialmente na sua indústria alternativa do xisto, ou fracking, e, por isso, o melhor amigo dos hidrocarbonetos, iria perder a reeleição, os mercados petrolíferos mostraram receio e o barril passou em baixa a casa dos 40 USD em Londres.

Foi assim na passada semana, logo a 04 de Novembro, um dia depois da ida às urnas na maior economia mundial e, por isso, onde o petróleo mais é influenciado no seu sobe e desce permanente, partindo dos 41,30 USD por barril para os 39,2 a 06 de Novembro, ameaçando transformar a derrota de Trump num terramoto nos mercados energéticos.

Mas não foi isso que sucedeu. Já na sexta-feira, quando a vitória de Joe Biden se começava a impor no horizonte, os mercados assumiram que, afinal, a saída de cena de Donald Trump até poderia ter efeitos positivos.

Isto, porque o equilíbrio dos mercados resulta de múltiplos factores e, como admitem vários analistas, uma economia como a dos EUA, a maior do planeta, não pode viver indefinidamente sem um plano concreto de combate à pandemia da Covid-19, que é o factor nº1 da actual crise no sector, e isso só Biden o garante, como ficou claro na campanha eleitoral, na qual Trump sempre minimizou os efeitos pandémicos.

Mas, depois de passar o efeito furacão das eleições norte-americanas pelos mercados petrolíferos, a ventania tende a amainar e nos próximos dias, quando para o final do mês está prevista mais uma reunião importante da OPEP e da OPEP+, organização que junta, desde 2017, os exportadores cartelizados e um grupo desalinhado liderado pela Rússia, deverão voltar a repor a Covid-19 como o elefante verdadeiro dentro da sala de porcelanas.

Isto, porque da Europa à Índia, dos EUA ao Brasil... as grandes economias mundiais, de onde apenas se safa, aparentemente, a China, os confinamentos agressivos estão a voltar a ser o pão nosso de cada dia, como é o caso de Portugal, que regressou hoje ao estado de emergência, a condição legal mais opressiva para aquele país europeu, que, tal como nos restantes, a pandemia não parece querer dar tréguas.

E o mesmo deverá suceder nos EUA, até aqui, por causa da permissividade de Donald Trump, o lugar no planeta com menos restrições contra a pandemia, mas com o Presidente eleito a já ter anunciado a formação de uma equipa de peritos para desenhar a aplicação de um programa nacional de combate à Covid-19 que, apesar de o actual inquilino da Casa Branca ainda ter plenos poderes até 20 de Janeiro, naturalmente que deverá - embora com Trump seja difícil de garantir que assim será - ir acolhendo os conselhos destes peritos indicados pela "Administração" Biden/Harris.

Um outro indicador que está a emergir na "rede" é uma normalização das relações comerciais dos EUA com a China, a segunda maior economia do mundo e aquela que mais cresce, gerando as maiores oscilações positivas para o mercado energético.

Depois de quatro anos de sucessivas guerras comerciais declaradas pela Administração Trump, o que, logo a seguir à pandemia da Covid-19, foi o factor que mais desestabilizou os mercados nos últimos tempos, especialmente com as taxas extraordinárias que Trump aplicou a Pequim, sobre mais de 300 mil milhões USD de importações Made in China, ao que do outro lado da barricada surgiu como resposta medidas semelhantes, embora menos ruidosas, com Biden tudo tende a estabilizar.

E quando os dois "elefantes" da economia global deixam de lutar, o "capim", as economias mais pequenas e dependentes das exportações de crude, como é o caso de Angola, podem, naturalmente, respirar melhor e aguardar com alguma esperança por melhores dias, que, apesar de tudo, só o tempo poderá confirmar ou infirmar.

Outro tema que poderá influir nos mercados com o assumir da Administração Biden/Harris é o que vai ser a política de Washington para com o Irão, especialmente, mas também Venezuela, dois gigantes da produção petrolífera que foram esmagados pelo poder de influência e bloqueios decretados por Donald Trump.

Ou seja, se Biden realinhar o azimute que ele próprio ajudou a desenhar, quando era vice-Presidente de Barack Obama, do acordo nuclear de 2015 com Teerão, que envolveu ainda a China, a Rússia e a União Europeia, aliviando de novo as restrições económicas a este produtor do Médio Oriente por troca com o congelamento do programa nuclear do Irão, serão, naturalmente, mais centenas de milhares, pelo menos, de barris de crude que regressam aos mercados, podendo isso empurrar o valor da matéria-prima para baixo.

E o mesmo sucede com a Venezuela, cuja produção, por causa da grave crise económica e política que atravessa, fortemente impulsionada pela pressão feita por Washington, viu a sua capacidade de extracção reduzida à insignificância, apesar de ser o país com as maiores reservas provadas do mundo, cerca de 300 mil milhões/barris.