Mas este não é o único oráculo a "profetizar" dias maus para o sector do petróleo, mesmo que a Goldman Sachs tenha mais abrangência que a maioria dos restantes, porque diversos analistas citados pelas agências e pelos sites especializados têm insistido no mesmo argumento: os cortes foram insuficientes para aquilo que os mercados precisam.

Os 10 milhões de barris por dia (mbpd) que a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP) e os seus aliados na OPEP+, organização que agrega a Rússia e mais 10 produtores, como o México ou o Cazaquistão, acordaram cortar nas negociações que começaram na quinta-feira e terminaram no Domingo, são uma gota de água no oceano de 30 milhões que a crise gerada pela Covid-19 retirou à procura nos últimos dois meses e meio.

Ou seja, dos cerca de 100 milhões de barris que o mundo consumia diariamente antes da crise gerada pelo novo coronavírus descoberto na China e que rapidamente chegou aos 4 cantos do mundo, 30 milhões deixaram de ser comprados aos países que o produzem, o que é um forte factor de pressão sobre os preços, que, recorde-se, já caíram perto de 65 por cento desde Janeiro, quando o barril valia 67 USD face aos 31,3 - uma perda de 0,7%, apesar de ter iniciado o dia com ligeiros ganhos - que valia hoje, perto das 09.45, em Londres, onde o Brent local determina o valor médio das exportações angolanas.

E, como a abertura de hoje nos mercados, tanto do Brent como no WTI de Nova Iorque (com uma muito ligeira subida) demonstram de forma clara, os 10 mbpd enxugados à produção pela OPEP+, pouco mais fizeram que uma ligeira pressão, longe de chegar para inverter o curso desta já histórica crise financeira e económica mundial bem como o seu impacto no valor da matéria-prima da qual, ainda, depende a economia angolana.

Mas há um elemento que não pode ser ignorado. Os EUA, pela primeira vez na história, apresentaram-se ao serviço desta causa, defendendo os cortes para levantar o barril, que, em época de Páscoa, estava, e está, a precisar, de renascer das cinzas.

Estes cortes de quase 10 mbpd, que na verdade são um bocadinho menos, 9,7 milhões, vão, para já, ser aplicados em Maio e Junho, de forma a averiguar se é suficiente medida para estancar a sangria nos preços do crude.

Angola, no âmbito deste acordo, segundo o Ministério dos Recursos Minerais, Petróleos e Gás, assim que o plano de cortes for activado, a 01 de Maio, vai contribuir com cerca de 348 mil barris por dia, a partir da produção de 2018, que foi, em média, de 1,52 mbpd, que será a referência para este abatimento à produção nacional.

Mas o País tem a vantagem de estar a usar uma referência para os cortes que hoje já não existe, devido ao declínio da produção a que assiste nos últimos anos, essencialmente devido ao esgotamento dos campos em actividade, mas também devido ao desinvestimento das majors após a crise de 2014, quando o barril desceu dos 100 USD e acabou, no início de 2019, nos 29 USD, a partir dos quais iniciou uma recuperação que acabou evaporada agora pela COvid-19.

Recorde-se que a Agência Internacional de Energia (AIE) assumiu em Março do ano passado que em 2023 a produção angolana estará nos 1,29 mbpd, enunciado como razão precisamente a deterioração dos campos, o desinvestimento e o elevado breakeven do barril nacional.

Em síntese, o que a generalidade dos analistas sublinham é que sejam quais forem os cortes neste momento, muito dificilmente poderão exercer pressão suficiente para minimizar o impacto da crise sobre a procura, que vai, dependendo das fontes, dos 20 aos 30 mbpd, com dados adjacentes igualmente negativos, como o desemprego que em todo o mundo está a bater recordes mas nos EUA, como avança o Nobel da Economia Paul Krugman, vai chegar e ultrapassar os números do crash de 1929, considerado o maior da história na maior economia do mundo.

E a recessão já assumida para a generalidade das grandes economias mundiais é outro dado considerado como certo e seguro para este ano de 2020, o que prognostica dias aziagos para as economias que dependem das exportações de crude, obrigando a um esforço suplementar, como, de resto, ocorre em Angola, para a libertação da dependência do "ouro negro" e a consequente diversificação da economia como a ONU tem estado a aconselhar de forma vigorosa aos países nestas condições de forma a antecipar e contornar ainda mais prolemas no futuro.

A Reuters estima que o foco dos analistas para as próximas semanas vai ser a análise aos dados fornecidos pelo Departamento de Energia dos EUA sobre o volume das suas reservas estratégicas, actualmente quase a 100%, depois de o petróleo a valores historicamente baixos ter permitido esse reabastecimento em largo volume, tal como sucedeu no resto do mundo.

E a agência cita fontes que estimam que este reabastecimento vá continuar até ao seu máximo, mesmo perante ligeiros ganhos no barril resultantes da política de cortes da OPEP+, incluindo a China, que está agora a aproveitar para elevar ao máximo o seu armazenamento estratégico.

A razão para este desempenho de baixo-relevo nas economias globais - apenas com a excepção chinesa, que já saiu da crise da doença para começar a deletar a crise económica - resulta do total bloqueamento da actividade empresarial, industrial e comercial para bloquear a expansão da Covid-19, levando quase todas as economias nacionais a uma paragem radical.

E mesmo que a China já esteja a voltar ao seu ritmo normal, tem pela frente uma barreira para já intransponível, que é não ter para onde exportar a sua produção, visto que as economias de que depende estão pura e simplesmente congeladas.

Ou seja, a última linha de defesa para evitar o desmoronamento do sector petrolífero, que é a compra de crude para repor os stocks estratégicos, está à beira de esgotar a capacidade, sendo um bom exemplo a Índia, outra das grandes economias mundiais, com os seus 1,3 mil milhões de habitantes, que a Reuters diz que está a redireccionar milhões de barris para as suas reservas como forma de permitir às suas refinarias usar as cargas em excesso de que dispõem.