Que não permite o aprofundamento do sentido de responsabilidade, quer individual quer colectiva. Que impede a culpabilização directa e transversal dos maus resultados quando consequência de processos de má gestão generalizada.

Que facilita o apontar de culpado(a)s sempre entredentes. Em todo este já longo processo, eis-nos a chegar ao momento em que vamos ter pela frente um acto eleitoral que se encarregará de eleger, por via indirecta, é verdade, um novo Presidente da República.

Estas funções, como quaisquer outras, não são exercidas linearmente. Queremos dizer com isso que o cidadão que venha um dia a ocupar esse lugar naturalmente que o adaptará às suas convicções, ao seu percurso, à sua idiossincrasia. É verdade que não deve nem pode esquecer que está ao serviço da comunidade (e não o inverso) e que, assegurada a vitória eleitoral, é obrigado a representar o conjunto da Nação e não apenas aqueles que pertencem à força partidária em que se integra.

O que temos vindo a verificar é a máquina eleitoral do partido da situação repetir os seus mecanismos de sempre (o que não é reprovável se tivermos em conta que têm produzido resultados vitoriosos, mas nem sempre é aconselhável). Recorre praticamente aos mesmos chavões de há anos. Repete as promessas já antigas, muitas delas difíceis ou quase impossíveis de serem cumpridas. Utiliza os recursos que tem à sua disposição para ver ratificada, nas eleições, a sua intenção de permanecer no poder, não nos informando, em toda a sua plenitude, da real e concreta situação em que vivemos.

Sucede que o candidato a Presidente da República em nome do MPLA já não se chama José Eduardo dos Santos. E, na nossa realidade concreta, esse aspecto deve não apenas ser cuidado, como obriga, por razões de estratégia política, a que devam deixar uma larga margem que permita a João Lourenço agir, falar e actuar em função de si próprio, do seu pensamento e do conceito pessoal que naturalmente terá, a propósito do exercício das funções presidenciais.

Prendê-lo a formas de estar, de se expressar, de contactar as populações como se de actos mecânicos se tratassem, não dando espaço ao que corresponde à sua real natureza, é colocá-lo numa camisa de muitas varas e impedi-lo de vir à liça dizer de sua plena e absoluta justiça.

Pretender padronizá-lo entre o que foi sendo ao longo destes anos o Presidente José Eduardo dos Santos e os múltiplos interesses que se cruzam dentro do MPLA é um erro grave. Porque lhe retiram a autonomia a que tem pleno direito a ter. Porque o prejudicam, não deixando passar a imagem de quem é o cidadão, o candidato, o seu pensamento.

Aliás, é curioso verificar-se como o Presidente José Eduardo dos Santos tem dado esse exemplo, desaparecendo praticamente de cena e dando espaço a João Lourenço para que este tenha esse espaço de manobra e de afirmação, que é fundamental num país dirigido há tantos anos pelo mesmo cidadão.

Pena que quem normalmente está sempre ansioso por debitar os mais disparatados elogios ao actual PR, entrando claramente em contravenção com a maneira de ser e de estar a que desde sempre nos habituou, não veja a floresta e continue preocupado com esta ou aquela árvore.

Assim acompanhassem a discrição, o silêncio e algum afastamento mediático que José Eduardo dos Santos vem configurando, metodicamente como sempre fez.

Assim aprendessem que só deixando o seu candidato sem amarras, mas também sem prévias e já antevistas marcações de lugares, para, como sempre fizeram, poderem cobrar a posteriori, ganhando João Lourenço as eleições, ele poderá seguir o rumo da sua própria afirmação.

Acima de tudo, deixar que João Lourenço percorra o seu caminho, à sua maneira, do seu jeito particular e singular. Tão autónomo quanto um candidato a Presidente da República pode e deve ser.