A Guiné-Bissau atravessa mais uma crise política grave com as eleições presidenciais à porta e as organizações internacionais a que este pequeno país lusófono da África Ocidental pertence, desta vez, decidiram tomar posição clara contra o autor da instabilidade, que é o ainda Presidente da República, José Mário Vaz, o que está a ser seguido pelos países mais próximos, como é o caso de Angola.

Este novo episódio de instabilidade política na Guiné surgiu depois de José Mário Vaz ter, de forma inusitada, demitido o Governo do primeiro-ministro Aristides Gomes, nomeando Faustino Imbali para o cargo, justificando a decisão com uma "grave crise política que está a por em causa o normal funcionamento das instituições", por causa de uma manifestação da qual resultou um morto no seguimento da repressão policial.

O Executivo de Aristides Gomes tinha sido investido no seguimento da vitória eleitoral do PAIGC nas Legislativas de Março deste ano, embora sempre com a clara insatisfação de Mário Vaz, cujo mandato terminou formalmente em Junho último mas que se manteve no posto em circunstâncias extraordinárias.

JOMAV, como é conhecido, ficou no cargo após um acordo com a CEDEAO (Comunidade Económica de Estados da África Ocidental), equivalente à SADC para a parte austral do continente, que tem assumido um papel mais interventivo na resolução de crises nacionais, como foi, por exemplo, o caso da Gâmbia, em 2017, com o afastamento de Yaya Jammeh após as eleições, embora com poderes limitados.

Esta demissão, que ocorreu fora do período Constitucional no exercício do cargo de Chefe de Estado, levou a CEDEAO - esta organização regional considerou o decreto ilegal -, mas também a CPLP e países como Portugal a virem a terreiro assumir um posicionamento contrário ao pretendido pelo ainda Presidente guineense, porque a sua condição de Presidente de transição não lhe permite demitir o Governo e ninguém vê razões que sustentem esta decisão.

Recorde-se que José Mário Vaz já tinha exercido forte pressão para que o PAIGC acabasse por não nomear para o cargo de primeiro-ministro Domingos Simões Pereira, presidente do partido mas com quem o PR mantém uma forte contenda pessoal.

Com este acto, e depois de publicado o decreto-Presidencial, na segunda-feira, a Guiné-Bissau ficou numa estranha condição de ter um PR e dois primeiros-ministros, um formal, Faustino Imbali, e o outro efectivo, Aristides Gomes, o que gera uma clara situação de ingovernabilidade.

Face a este cenário, o Governo angolano, através de um comunicado emitido pelo Ministério das Relações Exteriores (MIREX) vem formalizar o seu posicionamento, considerando o acto de José Mário Vaz como "indesejável" quando o país se prepara para realizar eleições Presidenciais a 24 de Novembro.

"O Governo da República de Angola tomou conhecimento, com grande estupefacção, dos últimos acontecimentos registados na cena política da República da Guiné Bissau", escreve o MIREX em comunicado, referindo-se à demissão de Gomes e do seu "Governo constitucional".

Depois, o MIREX recorda que esta nova situação de perigosa instabilidade em Bissau emerge de um contexto marcado pela aproximação do período eleitoral das eleições presidenciais no próximo dia 24 de Novembro, cuja campanha eleitoral começa formalmente dentro de horas, nas quais será eleito um novo Presidente da República.

O Governo angolano sublinha esta situação "configura um indesejável retrocesso na normalização da vida política daquele país, que só poderá ser alcançado com a finalização do ciclo eleitoral".

Face a este cenário, "o Governo da República de Angola associa-se a todos aqueles que se opõem à alteração da ordem constitucional e considera o Governo liderado pelo Primeiro-Ministro, Dr. Aristides Gomes, como o único legítimo e com o qual continuará a trabalhar, para o reforço das suas relações históricas de amizade e cooperação".

Entretanto, contrariamente ao que em sucedido ao longo das últimas duas décadas, as Forças Armadas garantem que não se vão intrometer nas questões políticas, o que é um garante de que qualquer tentativa de golpe de estado não contará com o apoio das actuais chefias militares do país.

O Chefe de Estado Maior General das FA da Guiné-Bissau, general Biaguê Na Ntan, tem repetido que enquanto estiver no cargo não haverá qualquer alteração à ordem constitucional, embora muitos o apontem como sendo o pilar em que JOMAV sustenta o seu comportamento de repetidos abusos de poder.

Recentemente, Biaguê Na Ntan, afirmou que consigo "à frente das Forças Armadas não há lugar para golpe de Estado. As pessoas podem falar à vontade...".