É certo que só tarde, no próximo dia 03 de Novembro, se saberá qual dos dois, Biden ou Trump, conseguiu caminho aberto para liderar a maior potência militar do mundo e a economia mais poderosa do planeta nos próximos 4 anos, mas é também facto que hoje - na verdade é nas primeiras horas de sexta-feira, mais logo, às 02:00 de Luanda, que o debate tem lugar - já se vai ter uma ideia bastante clara de quem vai à frente nestes derradeiros 13 (treze) dias de campanha.

O azar ou a sorte de um e de outro está em jogo e o apito inicial já foi ouvido nos bastodores, onde há muito se desenrola uma feroz batalha para garantir a vantagem no momento em que ambos vão suir ao palco e estarão perante mais de 70 milhões de teleespectadores, só nos EUA.

O Novo Jornal antecipa o que vai ser este confronto de titãs.

Como está presente na memória de quem tem interesse pelo que será o futuro dos EUA, o último, e único debate realizado até agora entre os dois, porque o segundo de três foi anulado devido à infecção pela Covid-19 de Donald Trump, ficou marcado pela forma pouco elegante como os dois adversários se trataram durante 90 minutos, mas com o ainda Presidente a, como os analistas foram rápidos a confirmar quase unanimemente, passar todas as marcas, nomeadamente quando optou por gozar com Biden por este ser "velho", apesar de ter apenas mais 3 anos que ele, 77 e 74.

A futura Administração norte-americana vai, como sucede sempre, ter uma influência tremenda no futuro da humanidade, como fica evidente pelo facto de desta eleição depender, por exemplo, se os EUA permanecem ou saem do Acordo de Paris, sobre o clima, na Organização Mundial de Saúde, na UNESCO etc.

E Angola que o diga - razão pela qual este debate deveria interessar de forma clara aos angolanos -, nem que seja porque é em Washington que muito se decide sobre, por exemplo, o restabelecimento das relações com os ancos correspondentes, que facilita o acesso à divisa norte-americana, ou ainda os acordos com o Fundo Monetário Internacional (FMI) ou com o Banco Mundial, para além da palavra decisiva que a Casa Branca tem no acesso dos países menos desenvolvidos aos grandes locais de decisão mundial, como o é o G20, que agrega os 20 países mais ricos do mundo.

E o que poderá ficar, para quem assistir ao debate de logo, como marca de água deste último duelo, é a forma como Trump vai usar a polémica em torno do alegado conteúdo de um computador antigo do filho de Joe Biden, Hunter Biden, onde o New York Post, um tablóide sensacionalista e de duvidosa credibilidade, afirma que encontrou provas de participação ilícita em negócios no estrangeiro, inclusive na Ucrânia, da família Biden, o que tem permitido ao candidato republicano lançar violentos ataques ao seu adversário democrata, chamando-lhe, inclusive "criminoso" e à família, um conjunto de gangesters, que deveriam ser julgados e presos.

O elefante na sala. Ou não...

Biden, sobre esta matéria, apesar de já ter desmentido tudo através dos seus assessores directos, tem tentado ignorar ao máximo e, devido à escassa credibilidade do Post nova-iorquino, os restantes media dos EUA, à excepção do grupo FOX, conservador e próximo dos republicanos, têm passado ao lado do alegado escândalo, tendo mesmo o Facebook e o Twitter gerado restrições à partilha e publicação de conteúdos relacionados com o tema.

Mas, mas isso não significa que Trump o vá fazer mais logo, neste último confronto mano-a-mano, porque sabe que tem ali um manancial para explorar.

E isso mesmo os seus conselheiros têm vindo a público dizer que será feito, nomeadamente não interrompendo Biden quando este estiver a falar, interpelado sobre o assunto, como que obrigando-o a desfazer o nó que lhe foi colocado na garganta pelo tablóide de Nova Iorque detido pela família Murdoch.

Robert Murdock, que criou a News Corp, que detém o NYP, entre dezenas de jornais em vários países, é conhecida nas sete partidas do mundo pelos seus valores conservadores e pela linha editorial sensacionalista dos seus jornais, cuja falta de credibilidade e ética tenta ultrapassar pela velha fórmula conhecida no meio dos media que é "quanto mais sangue, melhor!", sendo apoiantes claros e inequívocos de Donald Trump.

Donald Trump sabe que esta é uma derradeira oportunidade para alterar o rumo das coisas, visto que todas as sondagens lhe dão uma clara desvantagem face a Joe Biden, nalguns casos de mais de 10%, mas os EUA são uma singularidade eleitoral, porque uma maioria de votos sociológica pode não corresponder a uma vitória eleitoral, como sucedeu há quatro anos quando Hillary Clinton perdeu para Trump apesar de ter obtido mais 3 milhões de votos no país, devido à particularidade de a eleição ser decidida em colégio eleitoral com os estados a contribuírem com os seus grandes eleitores para a sua composição.

Para já, como nota a Associated Press, os conselheiros mais próximos do Presidente estão a passar para os media a ideia de que Trump vai trocar a sua postura agressiva que usou no primeiro debate para um estilo mais calmo, com o objectivo de "colocar Biden sobre os holofotes".

O que está em dúvida é se Donald Trump, por causa do seu carácter sanguíneo, vai conseguir seguir esse plano, que visa expor Joe Biden e a sua "suspeita" família, embora já tenha deixado um sinal de que poderá não se aguentar, depois de nas últimas horas ter, na condição de Presidente e não de candidato, ordenado ao Procurador-Geral, William Barr, que desse início a uma investigação federal sobre os conteúdos das notícias do New York Post.

O Post diz ter encontrado, num velho computador que o filho de Biden deixou a arranjar algures, um mail onde um dirigente da companhia de gás ucraniana, Burisma, agradece a Hunter Biden por ter conseguido arranjar um encontro com Biden, então vice-Presidente de Barack Obama.

Na sua defesa, a equipa de Biden já veio desmentir tudo, e, de forma simples e sem grande espalhafato, lembrou que da sua agenda oficial, altamente controlada pela condição de vice-Presidente, não consta qualquer encontro com o gestor da Burisma, a holding pública ucraniana que junta diversas empresas ligadas ao sector energético.

Recorde-se que o denominado caso Ucrânia conduziu a uma tentativa de destituição de Trump no Congresso, sendo o "impeachment" justificado com o facto de Trump ter usado a influência da Casa Branca para exigir, em forma de chantagem e sob ameaça de cortar a ajuda militar de 400 milhões USD, ao seu homólogo daquele país europeu, Volodymyr Zelensky, que ordenasse um inquérito público, através do Ministério Público, aos alegados negócios da família Biden em Kiev.

Medo do sprint final de Trump?

A questão está a ser encarada de forma séria do lado democrata, porque temem os efeitos nefastos das alegações republicanas na campanha e no desfecho das eleições de 03 de Novembro, a ponto de Barack Obama ter sido chamado à liça em defesa de Biden, lançando ataques às "mentiras diárias" de Trump considerando que estão a destruir "os valores da democracia americana" que são "valores historicamente tanto democratas como republicanos".

"Temos de garantir que a cidadania e a democracia vingam neste país contra as mentiras ditas todos os dias, impondo os valores americanos contra estas atitudes que podem destruir os pilares em que assenta a democracia americana", disse Obama, numa clara alusão às publicações do New York Post que estão a ser usadas por Trump para chamar "criminoso" a Joe Biden.

Por seu lado, Biden não deverá, segundo os analistas hoje profusamente citados nos media norte-americanos, largar aquele que tem sido o seu "ganha-pão" nesta campanha, o fracasso da Administração Trump no combate à pandemia da Covid-19, onde os EUA lideram de longe em número de casos e de morte conexas, com o Presidente a manter uma postura de gozo e iroia sobre o uso da máscara e ou os seus conselhos para que as pessoas ignorem a pandemia e mantenham o seu dia-a-dia normal, até à derrocada económica e ao crescente desemprego.

Este debate vai ser conduzido pela pivot na NBC News, Kristen Welker, que já sofreu fortes ataques de Trump, acusando-a de ser injusta e desagradável, estando com a garantia de mais de 70 milhões de telespectadores a acompanhar os 90 minutos de confronto, sendo que jamais de 40 milhões de eleitores votaram antecipadamente, como o prevê a lei eleitoral do país, sabendo-se que historicamente, como revela o historiador presidencial Michael Beschloss, citado pela AP, os últimos debates são fundamentais e podem ser decisivos.

Um dos pontos de acesa discussão entre os media locais e as redes sociais nos EUA é se Donald Trump, apesar da clara desvantagem nas sondagens, consegue, com um sprint final, como sucedeu em 2016, onde o cenário, apenas menos vincado - uma desvantagem menor que agora - consegue dar a volta por cima.

Se consegue ou não, só o tempo e as urnas de voto o dirão, mas sabe-se que o seu trunfo, provavelmente o único, são as mais que duvidosas notícias do tablóide New York Post, que já foi considerado o menos credível dos grandes jornais norte-americanos.