Depois de meses sem segurança dos militares da ONU, e apenas com a presença de uma pequena unidade da polícia congolesa, mal armada e mal preparada e corrupta nas proximidades da sua casa e da clínica onde trabalha, localizada em Panzi, na província do Kivu Sul, o Nóbel da Paz voltou a contar com a presença próxima dos homens da ONU, que têm na RDC a mais vasta e dispendiosa missão em todo o mundo.

Denis Mukwege notabilizou-se em defesa das vítimas de violência sexual na República Democrática do Congo, passou a estar em risco de vida e sujeito a constantes ameaças de morte oriundas dos grupos armados de guerilha e milícias que combate há largos anos depois de voltar a levantar a sua voz contra a acção destes grupos e a sua conduta perante as populações indefesas.

As Nações Unidas acabam retiraram-lhe a protecção que era garantida pela presença permanente de militares, "capacetes azuis", tanto na sua residência como na sua clínica, colocando, de forma inesperada, em risco a vida de um dos mais notáveis defensores da paz e dos mais fracos na RDC, país largamente dominado por grupos de guerrilha e milícias que disputam o território, especialmente no leste, devido, justificaram, a um surto de Covid-19 no Kivu Sul.

Foram várias as ameaças que Denis Mukwege recebeu nas últimas semanas depois de ter feito declarações condenando episódios repetidos de violência no seu país e clamando por justiça para aquilo que considera crimes de guerra e contra a humanidade perpetrados no leste da RDC por grupos de guerrilhas e milícias armadas, muitas delas oriundas dos países vizinhos, como o Ruanda e o Uganda, de onde são originários alguns dos grupos mais violentos.

Recorde-se que as províncias dos Kivu, Norte e Sul, e Ituri, as três localizadas no leste e com fronteiras com os pequenos países dos Grandes Lagos, estão, desde a década de 1990, mergulhadas em violência por acção de guerrilhas como, entre outras, a ADF (Aliança das Forças Democráticas do Uganda) e as FDLR (Forças Democráticas de Libertação do Ruanda), que se instalaram na região depois do genocídio de 1994 no Ruanda, onde mais de 800 mil tutsis foram massacrados pela maioria Hutu.

Com os seus comentários e declarações, Denis Mukwege enfureceu, como relata a imprensa do país, algumas altas chefias militares do Ruanda, de onde e onde chegam e têm apoio grupos de guerrilha, cujas tropas são acusadas de envolvimento em episódios de terror naquela região da RDC, especialmente em 2010, debruçando-se ainda sobre o martírio do povo congolês ao longo das múltiplas "guerras do Congo", que se prolongaram de 1995 a 2003, deixando largas centenas de milhares de mortos e milhões de deslocados e feridos.

Denis Mukwege tem sustentado as suas declarações numa investigação da ONU sobre esse período nefasto no Congo e em toda a África, que as forças aramadas ruandesas, incluindo o seu antigo ministro da Defesa, que chefiou estas forças na RDC, nessa época, entre 1996 e 1998, refutam e consideram "propaganda", apontando o médico congolês e Nobel da Paz como uma marioneta ao serviço dos que "perderam a guerra", nota o The Guardian, numa peça escrita pelo seu correspondente Jason Burke, que adianta ainda que os media estatais ruandeses têm dado ênfase a essa refutação e criticado o ginecologista do país vizinho.

Agora, após a denúncia na imprensa mundial destas ameaças, a que se juntou uma ONG norte-americana, os Médios para os Direitos Humanos, que veio a público denunciar o perigo a que estava sujeito um "campeão dos Direitos Humanos" e um "combatente contra a impunidade para a violência sexual e outras atrocidades", a ONU voltou a garantir a sua segurança, deslocando uma unidade para Panzi.