A Organização Mundial de Saúde (OMS), uma das principais armas globais contra os grandes surtos de patologias infecciosas, presente nas províncias do Kivu Norte e Ituri desde que a epidemia foi declarada, tal como os Médicos Sem Fronteiras (MSF), o UNICEF ou ainda as equipas sanitárias do Ministério da Saúde e das Forças Armadas da RDC (FARDC), acaba de lançar um novo alarme sobre esta epidemia de Ébola.

O Vírus está a ganhar terreno nas duas últimas semanas, depois de no início de Março a mesma organização ter feito alarde de uma quase vitória sobre a doença devido à quase nula ocorrência de novos casos. Segundo o porta-voz da OMS, Christian Lindmeier, 57 novos casos foram registados na primeira destas duas semanas trágicas, e 72 na segunda, ou seja, nos últimos dias.

Por detrás desta nova fase de alastramento daquela que é a segunda mais grave epidemia de Ébola - só suplantada pela de 2013/14 na África Ocidental, que fez mais de 11 mil mortos - desde que o vírus foi detectado em humanos em 1976, também da RDC, estão as mesas causas que justificam a resiliência da doença ao esforço global que está no terreno.

Em causa estão as múltiplas milícias e guerrilhas que geram violência nos territórios afectados e dificultam o trabalho das equipas sanitárias impedindo o acesso destas às áreas afectadas e ainda a crendice tradicional nas diversas formas de feitiçaria, que leva as pessoas a correr riscos absurdos por pensarem estar "protegidos" pela magia de feiticeiros e de artefactos de natureza esotérica.

Outro sinal de perigo surgido nos últimos dias é, como trouxe a púbico o Ministério da Saúde congolês, o facto de as mortes registadas nas últimas semanas estarem a acontecer fora dos centros de tratamento, o que indicia que as pessoas doentes estão a optar por se esconderem dos médicos nacionais e estrangeiros, acabando por morrer nas suas aldeias e nas suas casas, junto do seus familiares e vizinhos, gerando novos focos de dispersão do vírus que tem como meio de transmissão o contacto com os fluídos corporais das vítimas.

Um dos problemas mais sensíveis, perante estes cenários, é que as tradições locais, muitas delas ancestrais, alicerçadas em crenças animistas, passam por um contacto físico dos familiares e amigos do falecido com o seu cadáver em sinal de respeito, o que é um corredor aberto para novas contaminações.

Isto, a par da crença de um quarto das pessoas nas áreas afectadas de que a doença nem sequer é real, como concluiu um estudo feito pela revista médica The Lancet em Setembro do ano passado, agora recordado pela Reuters.

Por este conjunto de razões, de acordo com os números oficiais, já morreram, desde 01 de Agosto de 2018, 676 pessoas, estão contaminadas mais de 400.

E o número de mortes deve continuar a crescer se, como alerta a OMS, não foram travados os ataques das guerrilhas e das milícias locais aos centros de saúde instalados nas áreas afectadas, tendo nos últimos dias sido atacados pelo menos cinco destas unidades da linha da frente do combate à epidemia, o que levou os MSF a abandonar o trabalho em algumas das áreas mais sensíveis por não terem as mínimas garantias de que os seus voluntários observam as condições mínimas de segurança pessoal.

E, a par do alastramento local de casos, aumenta igualmente a hipótese de o vírus atravessar as fronteiras, especialmente as com os países mais próximos, o Uganda e o Ruanda, o que é uma preocupação acrescida para as organizações internacionais.

A RDC tem fronteiras com nove países, sendo a de Angola aquela que mais distante se encontra da zona onde decorre esta epidemia, a 10ª que acontece na RDC desde 1976, ano em que o vírus foi detectado em humanos, na província do Equador, no oeste do país, passando dos macacos, roedores ou morcegos, que são os portadores naturais, para as comunidades humanas.