As pressões junto do Estado ultrapassaram há muito a fronteira das suas obrigações fundamentais para com os cidadãos, para se centrarem basicamente na protecção de muitos (demasiados) interesses estabelecidos. O que não significa de modo nenhum que defendamos que seja o mercado a regulamentar tudo e mais alguma coisa.

Exactamente porque os interesses económicos e financeiros se acabam por sobrepor aos políticos e os partidos nem sempre têm sabido lidar com uma situação insustentável como esta, é urgente forçar o controlo e a vigilância dos mercados, submetendo-os às grandes estratégias definidas para as questões verdadeiramente fulcrais a que o Estado tem de responder. O resultado de uma continuidade injustificável desta situação é que as pessoas ficam sem perceber que há, na realidade, alternativas quer ao capitalismo selvagem quer à economia administrada, na feliz expressão de Alain Touraine.

É verdade que há sempre o risco de, conseguindo colocar-se os problemas ao nível do desenvolvimento social, a sua solução poder à mesma criar novos grupos clientelares. Daí a necessidade de, numa perspectiva de médio-longo prazos, as funções estatais não deverem impedir que, a nível de todo o país, os conceitos de vida social e vida cultural se tornem cada vez mais autónomos. A Nação é que tem e deve ser colocada ao nível do sistema político. E aí entram as definições gerais das grandes políticas que resultam também de opções ideológicas: no trabalho, na educação, no ensino, na saúde, no desporto, na justiça, enfim, em todas as áreas onde o Estado tem forçosamente uma palavra a dizer.

Numa lógica de aumento da criação da riqueza interna, de reforço da unidade nacional e na preservação e aprofundamento das conquistas sociais que devem ser uma das bandeiras de partidos de matriz progressista: sempre na perspectiva de beneficiar os trabalhadores nacionais, a mão-de-obra local, os criadores de riqueza, os pequenos, médios e grandes produtores agrícolas, os que apostam na consolidação e retorno à estratégia da agro-indústria, enfim, os que, na verdade, contribuem para o aumento concreto da produção nacional, sem estarmos de olhos vidrados no petróleo e nos diamantes.

Um dos problemas mais graves que vivemos e que, quarenta anos depois da Independência, até pelo esforço gigantesco que o estado desenvolveu nessa matéria, já devia estar mais do que minorado, é o da educação. Elevar o nível da educação, mais até que o da qualificação, numa realidade em que o essencial continuar a ser o saber ler; preparar bases sérias de um ensino primário, secundário e técnico-profissional em lugar de criar dezenas de universidades de onde saem licenciados que, na sua maioria, nem a língua portuguesa escrevem correctamente.

A falta de cultura do cidadão médio, a incapacidade de um conhecimento mínimo da realidade que o circunda, a inexistência de uma preparação científica e humana consistente, a quase nula existência de convicções e de juízos de valor, continuam a ser, como há muitas décadas, um dos maiores desastres do nosso tempo.

A falta de bases sólidas na formação intelectual de qualquer cidadão, facilita a penetração de ideias como as de que os efeitos de uma sociedade a que se chama hoje "de informação" são os mesmos deste triunfo momentâneo do chamado capitalismo financeiro.

A cultura humana acaba com a ignorância, destrói dependências religiosas que as mais das vezes embrutecem e aumentam as dependências do homem, prepara-o para, em consciência encontrar a sua luz e a comunidade em que se integra. Escrevia um intelectual do séc. XX: "Como tudo neste mundo, a cultura é uma tendência do Homem para definir, racionalmente, a sua consciência e a sua verdadeira posição valorativa na sociedade em que vive e de que faz parte. Um Homem será tanto mais culto quanto mais for capaz de compreender e consciencializar o jogo de relações que o prendem à realidade em volta e os graus terminais das suas possibilidades e dos seus limites".