Não é tanto o problema do turismo que nos preocupa. Seria preciso um avanço a uma velocidade esmagadora, quer no plano das infraestruturas quer no humano, para que Luanda,em menos de dez/quinze anos, tivesse condições criadas para poder fomentar a indústria do turismo. Não podemos cair no ridículo de acreditar que, tendo transformado quase na totalidade esta cidade numa cópia ordinária e mal concebida de paranóias dubaianas e/ou europeias, em meia dúzia de meses seja possível transformá-la na capital bonita, arejada,virada para o mar ( "debruçada sobre o mar" como escreveu o poeta Eleutério Sanches), com praias brancas e limpas quer seguindo para o sul quer virando para a Baía. Que, apesar de tudo, já foi.

Quando, em 1996, Rui Carvalho (nosso Mestre e de muitas gerações de jornalistas do país) foi nomeado Governador de Luanda e rapidamente gizou um plano denominado "Vamos Salvar Luanda", chamando um grande número de gente pensante para se reunir no (também defunto) Cinema Karl Marx para debater o que era ainda possível fazer para recuperar a cidade, rapidamente foi deposto. Os interesses de sempre (já então os mesmos, entretanto ramificados e alargados...) falavam então mais alto, Rui Carvalho tentava reorganizar toda a estrutura do GPL, era óbvio que ia impedir a evolução da capital no sentido trágico para o qual evoluiu e foi, em pouco mais de um ano reduzido ao silêncio e a uma conveniente exoneração.

Mais recentemente, alguns "génios" decidiram conceber à pressa o monumento ao Soldado Desconhecido, fechando duas das ruas mais importantes que permitiam a entrada e saída da Marginal, sem ouvirem ninguém, sem pedirem a opinião de ninguém, num repentino e estranho sentido de urgência.

A baixa de Luanda é hoje um cemitério, a partir das 20 horas. Não há luz, não há movimento. O Palácio da Pena, onde ficava a saudosa Lello, devia estar também já com o destino traçado - esperemos que a nova governação impeça mais esse crime - lá está, aguardando o camartelo. Destruiram o Hotel Turismo para lá ficar um vazio, não há, salvo raras excepções, restaurantes, espaços de convívio, bares, salas de música, aquilo que é, afinal comum, principalmente para aqueles que tanto viajaram e nunca se preocuparam, no mínimo, em copiar bem aquilo que tanto elogiam e mostram conhecer.

O Teatro Avenida, prometido depois da construção daqueles duas torres horrendas que lá vão nascendo, deverá ser entregue à comunidade no dia de são nunca à tarde. A Rua dos Mercadores e os Coqueiros (que escaparam à desaustinada necessidade de afirmação de riqueza e já agora de miséria intelectual) vão-se deteriorando, sem que aqueles que insistem na sua recuperação como espaços nobres para actividades culturais e recreativas sejam tidos nem achados.

Acreditemos que o sentido humanista que está a ser recuperado pela governação, atinja também os que tomam decisões neste capítulo. E nos proporcionem a possibilidade de tentar que a própria sociedade civil se junte e apoie a recuperação da Rua dos Mercadores e de toda aquela zona circundante, permitindo que possamos voltar a usufruir da parte baixa da cidade - ou do que resta dela - e tornar a fazer nascer uma zona privilegiada, de intensa vida cultural e lúdica, deixando de ser um lugar onde as pessoas têm medo de ir.Para voltar um dia ao Baleizão, poder pedir um fino, uma sanduiche de presunto ou um gelado (um baleizão) de múcua.