Hoje a ordem é diferente da anterior. E, na verdade, esta abordagem minimalista do combate ao crime remete-nos para uma pergunta simples: que modelos até hoje a Polícia Nacional experimentou para pôr termo à situação?! E será única e exclusivamente sua a responsabilidade de combater estes actos? A resposta é obviamente que não, que devia a polícia ocupar-se com a prevenção de actos criminosos e não com o crime propriamente, uma vez que os crimes, quando consumados, envolvem elevados custos operacionais e humanos.

Mas é preciso não se ficar pela rama da questão, porque o problema da criminalidade em Angola, e em Luanda particularmente, nunca foi o crime como tal, mas a incapacidade de gestão de um espaço urbano que se tornou insuportável e porque ao longo de vários anos Luanda se limitou a receber um fluxo enorme de populações que acorreram à capital, primeiro, por conta do conflito armado, e, segundo, porque a governação desinvestiu em outras partes do país, o que levou a que muita gente tivesse encontrado na capital um espaço de afirmação e de fonte de sustento da família. Não é por acaso que Luanda tem mais de seis milhões de habitantes.

Resultado: todos os investimentos foram feitos na capital. Todas as políticas de incentivo a ideias inovadoras e empreendedoras faliram, e com elas faliram também valores e princípios, uma vez que as famílias se tornaram as principais vítimas de um processo de desestruturação generalizada, que envolveu o sistema de ensino que não consegue dar respostas eficazes, quer do ponto de vista qualitativo, quer do ponto de vista quantitativo.

Por outro lado, há uma geração entregue à sua própria sorte, que vive intensamente os fracassos que o país tem vindo a registar ao longo de vários anos em que imperou a corrupção e o descaso com a gestão da coisa pública. Um dia a corda teria de rebentar em um dos lados, e este dia chegou. Hoje vemos os criminosos a actuarem a menos de um quilómetro do Comando Provincial da Polícia Nacional. O Estado gastou muito dinheiro com campanhas de desarmamento da população civil, mas os crimes com recurso a armas de fogo são hoje os mais visíveis. E esta percepção só é hoje admitida pela própria Polícia Nacional porque a tecnologia - o recurso a filmagens através de telemóveis e as redes sociais - consegue provar que afinal a razão da afirmação do aumento da criminalidade sempre esteve com quem a dizia publicamente.

Como não é crível que se consiga gerar tantos postos de trabalho em tão curto espaço de tempo, o ideal seria que a Polícia Nacional passasse a comunicar melhor e adoptasse uma nova abordagem sobre o fenómeno da criminalidade que passasse pela prevenção, e isso consegue-se se ela alterar a sua postura perante as pessoas. Porque é preciso que se crie uma cultura de denúncia, enquanto as condições sociais das populações não melhoram com os actos de governação. É preciso que cada um dos cidadãos olhe para um agente da polícia como um defensor acérrimo da legalidade e um fiel depositário da ordem e tranquilidade públicas.

Se, por um lado, há responsabilidades que devem ser, sim, imputadas à Polícia Nacional, por conta de uma certa postura que tem colocado em causa a credibilidade dos agentes da ordem, por outro lado, o Executivo tem a obrigação de vir a público apresentar soluções para uma franja da sociedade que está desprovida de valores e que acredita na realização material como o fim último das suas vidas. Um maior controlo das armas de fogo é outra das questões que se impõe, porque o país não pode continuar a ser visto como um pequeno Texas a olho nu. Não se pode admitir que haja tantas armas em posse dos cidadãos e não haja uma explicação convincente para isso. Os resultados desta onda de crimes violentos já têm sido enormes. Não esperemos pelo pior para tomarmos uma posição mais séria quanto a isso!