Não temos dúvidas sobre as melhores intenções de Yannick e seus colegas no sentido da denúncia do preconceito e da discriminação que há anos determinados grupos vêm sofrendo. Não há como desmentir que se foram criando na nossa sociedade um conjunto de estereótipos negativos associados aos grupos etnolinguísticos, mas não só. Esses comportamentos abrangem igualmente a origem das pessoas na relação entre asfalto/musseque; cidade/mato; Luanda/província recheando o nosso relacionamento com comportamentos de discriminação, quer ao nível institucional, quer ao nível interpessoal. São exactamente as mesmas cabeças ocas e ignorantes que ainda resistem, apesar do processo de rejeição da nossa sociedade contra isso, e praticam vários tipos de preconceito como, por exemplo, contra as mulheres; homossexuais; velhos; pessoas gordas; pessoas com deficiências físicas e/ou mentais; contra albinos etc. etc.

Sempre houve um certo escrúpulo na abordagem pública desta uma realidade existente e a esbater-se gradualmente. Ao mesmo tempo que há uma rejeição de tais atitudes, também havia uma espécie de tabu, um certo escrúpulo na abordagem pública deste tema exactamente para que isso, mais do que ajudar, não viesse ampliar e publicitar ainda mais esses estereótipos. Yannick e a sua música recentram o foco e as atenções no preconceito quando a realidade de hoje não pode ser comparada com a de alguns anos, quando as famílias se opunham a que seus filhos se casassem com pessoas "do mato", "do musseque", "bailundos" ou "bakongo". Mesmo a título institucional se registou, discretamente, um avanço em que a nomeação de servidores públicos ou os cargos de visibilidade deixou, na governação como nos principais partidos políticos, de ser subordinada a "ditames" de ordem étnica. Hoje não é forçoso que um governador ou um dirigente tenha de ser filho da terra ou de uma certa origem, tal como na relação interpessoal mais ninguém quer saber a que município, província, ou grupo etnolinguístico o seu interlocutor pertence. Temos, pois, imensas dúvidas quanto à relevância e oportunidade de ampliação pública deste problema social feita pelo cantor Yannick usando a música, que é reconhecidamente um dos meios mais eficazes na formação de opinião dos consumidores.

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