A água, a energia, o esgoto, a recolha de lixo, a alimentação escolar e a assistência médica (verificação das condições de saúde das crianças, num país onde abundam doenças contagiosas a exemplo da tuberculose, no início das aulas como acontecia antes da Independência), entre outros exemplos, não são da responsabilidade do MED e, infelizmente, foram ignorados por todos os níveis de governação.

Por isso, as nossas escolas são campos de batalha diária, sem os mínimos olímpicos de condições, quer de higiene, quer de conforto. Por todo o país, temos alunos sentados em pedras, no chão e dois ou três crianças numa mesma carteira. O interior da maioria das escolas é escuro, sujo, cheira mal, não tem cor nem permite a nenhuma criança sonhar com um futuro melhor. São poucas as escolas que têm água canalizada. As casas de banho ou não existem ou estão fechadas. A maioria dos alunos e professores urina e defeca ao ar livre, nas imediações da escola ou dentro do quintal. As meninas mais pobres faltam à escola quando estão menstruadas, por incapacidade de garantir a sua segurança, por não terem dinheiro para comprar pensos higiénicos. Dentro da sala não há praticamente material didáctico, a maioria dos quadros é pintada na parede. A escola pública é deprimente, não é esta a escola que as crianças merecem. E não podemos esquecer as centenas de escolas que funcionam debaixo das árvores, que em 18 anos de paz não se justificam.

Nestas condições, fiquei admirada quando ouvi o senhor director da Educação para o Ensino Geral, na televisão, defender que, num mês e meio, iam conseguir resolver todos os problemas crónicos que as escolas públicas têm, e aqui refiro-me apenas aos que sejam imprescindíveis para lutar contra a Covid-19. Infelizmente, nesta primeira abordagem, o senhor director não conseguiu sequer convencer o jornalista pela quantidade de questões a que não conseguiu responder, remetendo muitas delas para Julho. Não será fácil colocar álcool-gel em todas as escolas, pois nem conseguimos pôr giz, quanto mais papel higiénico, sabão, lixívia, água limpa, máscaras para todos e auxiliares que garantam a desinfestação das salas entre turnos.

Em 2019, o representante do Banco Mundial disse, numa reunião pública passada na televisão, que tinham feito um estudo e concluíram que "uma criança em Angola anda 8 anos na escola e apenas aprende o equivalente a 3 anos". Não vi ninguém desmentir esta informação oficialmente, portanto concluo que o estudo é válido. Se assim for, não percebo qual é a pressa de abrir as escolas, quando a África do Sul, que tem um sistema de escolas muito mais respeitável e organizado que o nosso, decidiu adiar até estarem garantidas todas as condições de segurança.

Não merecemos a escola que temos quando sabemos que o país, nos anos dourados da primitiva acumulação de riqueza, podia ter alterado este drama, mas não o fez por interesses pessoais e miopia estratégica. Mas, neste momento, devíamos desenhar um programa de reabilitação de todas as escolas, sobretudo as primárias, que são as mais abandonadas, e colocar as condições necessárias que todas as crianças merecem com ou sem Covid-19 e reabrir o ano lectivo em Setembro, caso o país registe níveis aceitáveis de segurança sanitária.

A Assembleia Nacional, o segundo sítio mais protegido, mais bem apetrechado e mais caro deste país depois do Palácio Presidencial, não reúne 220 deputados. Têm dezenas de casas de banho, água potável, energia sem cortes, posto médico, gastam milhões em papel higiénico, salas de trabalho amplas e arejadas, o plenário é enorme e refrigerado, os corredores são seguros, não faz sessões plenárias ao vivo, não obstante todo o edifício ser sistematicamente desinfestado. Mas aceita que as escolas, nas condições que todos conhecemos, abram.

As crianças merecem uma escola que as estimule, que as faça esquecer os dramas provocados pela pobreza em que vive a maioria do povo, que seja colorida, segura, que alimente o intelecto e o físico, pois nenhuma criança aprende com fome. As crianças só serão prioridade neste país no dia em que o Governo compreender que a Escola Pública, com qualidade e eficiência, em todos os sentidos, é a única ferramenta que poderá permitir que a pobreza seja derrotada e o desenvolvimento se instale. Angola só terá paz quando forem materialmente garantidos, a TODAS AS CRIANÇAS, Direitos iguais à nascença.