Foi-se tornando habitual, ao longo dos anos, a repetição interminável de um discurso político recheado de lugares-comuns, de banalidades, como se os seus autores funcionassem como meros emissores repetidores, sem preparação intelectual ou técnica que os levasse, enquanto integrantes transitórios de qualquer função governamental, a conseguirem ter um discurso próprio, inteligente, racional e autónomo.

Foi-se tornando comum a exposição, quantas vezes ridícula, de um conjunto de palavras-feitas, que já atestavam a profunda incompetência de quem as utilizava e continua a utilizar. Sem sequer entenderem que, a transposição mecânica de um discurso que não era o seu, demonstrava, se tal ainda fosse preciso, que nem nível tinham para exercer razoavelmente que fosse, esse papel de meros reprodutores de orientações gerais, cujo cumprimento teria de ser correspondido, adaptando-as à área concreta pela qual respondiam (respondem).

Foi-se tornando cada vez mais clara, a diferença gigantesca entre quem ocupava uma função, conhecendo-a e dominando-a e os que, por portas e travessas, acabavam por ocupar lugares para os quais não estavam (nem estão) minimamente preparados.

Foi-se tornando usual, até ao limite do cansaço, reconhecer qualidades em cidadãos e cidadãs, que tão depressa fossem nomeados para quaisquer funções, se transformavam (se transformam) radicalmente, por entenderem que governar a coisa pública era (é) arrumar a sua vida e a dos seus, não querendo saber em absoluto dos milhões que dependiam das suas decisões, das suas acções, da correcção ou não das suas atitudes.

Foi-se tornando doloroso ver o arrastar de gente que, preparada ou não, logo recorria às armas fundamentais que condenava antes de se tornar "importante". O silêncio perante uma decisão errada. O fechar os olhos quando era necessário intervir para evitar um disparate. O sim-senhor desavergonhado, mesmo quando tinha mais do que consciência de que qualquer medida não ia dar certo.

Mais grave ainda. Foi-se tornando penoso ver essa mesma espécie de gente mudar do dia para a noite. De dialogante tornar-se inamovível. De exuberante transformar-se em inaudível. De solidária passar a uma arrogância desmedida.

É bem verdade que quando se esgotam os argumentos, quando a prática coloca no seu lugar a verdade verdadeira, é muito mais fácil, a curto-prazo, responder com o silêncio, mesmo repleto de ruído; com uma vaidade agressiva e ríspida, que esconde normalmente insuficiências de todo o tamanho.

E, no entanto, as orientações estavam dadas, as instruções seguiam o seu caminho, as indicações eram precisas. Como este parágrafo que recordámos do Presidente José Eduardo dos Santos, que leva quase treze anos de idade.

Com quantos dedos das mãos se podem contar os que, em postos de responsabilidade, tentaram sequer pôr em prática o que então foi dito?

Quantos dos inúmeros dirigentes que fomos vendo serem nomeados para aqui e para acolá, alguma vez cogitaram pôr em prática as indicações que recebiam? Uns, calaram-se sempre. E do silêncio foram construindo os degraus com que foram subindo na hierarquia sem nada fazerem. Outros, escolheram a mentira, transmitindo dados e informações que invariavelmente não correspondiam à verdade; finalmente os que foram insistindo, com persistência, com teimosia, mesmo que correndo riscos, mas cumprindo o dever, em plena consciência dos seus direitos e principalmente dos seus deveres.

Estes, e só estes, continuam a fazer falta ao País.