Num momento histórico em que se tenta, de alguma forma, uma recuperação económica que levou ao desemprego e ao sub-emprego de milhares de pessoas, empurrando-as, em resultado de políticas claramente erradas e de opções que não têm até hoje qualquer explicação plausível, para situações de absoluta indignidade, é preciso recuperar a antiga, mas nunca ultrapassada ideia, de que é pelo respeito e não pelo medo, que cada um se impõe, esteja onde estiver, faça o que fizer.

Formas intimidatórias de agir, a tristemente famosa prepotência, a arrogância, tal como o exercício de práticas quotidianas que entram na mais absoluta contradição com a vida pobre e miserável que a esmagadora maioria dos nossos concidadãos têm, devem ser, pública e claramente desencorajadas.

Em meio a um processo estranho de enriquecimento "por decisão superior", já aqui recordámos muitas vezes, que o recurso a uma distribuição seleccionada da distribuição da riqueza resultou que proliferassem o que chamamos muitas vezes de lumpen-burguesia. Bem podem ter poder económico, esbanjar luxo, desprezo e arrogância pelos mais pobres, que tal não os converte em cidadãos plenos, por via dos bolsos cheios.

A ostentação grosseira, a falta de solidariedade para com a comunidade, a prática do luxo na miséria, o desprezo pelos que acabaram por ser colocados numa situação de serviçais, exprimem bem o que um certo tipo de gente - sem educação, inculta e boçal, foi levada a considerar-se acima de todos nós.

É por isso que a educação (não só o ensino...) se transformam na arma principal - além de uma profunda alteração na definição das políticas - para a a transformação a médio e longo-prazos, da sociedade em que vivemos.

Poucos, muito poucos são aqueles (ou aquelas) que nasceram naquilo que se chamava antigamente de "berço de ouro". Uma classe burguesa que, por herança familiar, ou pela via da acumulação de capital, grande parte das vezes, por vias pouco sérias, mas que ia ganhando alguma notoriedade, acima de tudo, pela via da educação, do estatuto social e de algumas boas maneiras. Entre as quais se encontrava a preocupação com a cultura, com o ensino, procurando consolidar não apenas a conta bancária, mas, mas numa fase imediata a seguir ao enriquecimento o ganhar também de algum nível intelectual, cultivando o gosto pela leitura, pelas artes em geral, pela actividade artística. Este processo tem séculos de existência. Muitos agentes da transformação social, política e cultural verificada em Angola, nasceram desta classe, virando-se contra a sua classe de origem e transformando-se em combatentes e activistas pela liberdade.

Grande parte desta burguesia, apressada e erradamente possuidora de grande poder económico, é o espelho da forma trapalhona e sem nenhum objectivo estratégico com que foram abonados por razões que até hoje nos escapam. Daí ao exercício do uso e abuso desse poder, confundindo-o quase sempre com um estatuto de gente inamovível, escolhida por qualquer deus do céu ou da terra, acabe por tropeçar, via de regra, no que é a realidade. Gente mal-educada, sem valores, sem princípios, sem respeito por nada nem por ninguém e que se comporta muito pior do que os colonialistas o faziam.

É chegado o momento deste tipo de gente aprender que não vive à margem da nossa realidade, a verdadeira, a brutalmente verdadeira, e não aquela que, situados em outras galáxias, julgavam que viviam. Impondo o medo, porque não se podem impor pelo respeito, umas vezes que desconhecem o que isso é. Cultivando alguma modéstia, algum pudor, em consideração à imensa miséria que vive à sua volta.

Os "cházinhos" e as manifestações de "pena" pelos "mais pobrezinhos" têm que dar lugar a uma acção solidária, vigorosa, socialmente útil e que os conduza, pelo menos, aquilo que nunca fizeram na vida. A trabalharem pelo bem comum.