Qual é a sua visão sobre as autarquias em Angola?

Apraz-me dizer que, por ser um imperativo constitucional, as autarquias já deviam ter sido institucionalizadas. Se quisermos fazer história, veremos que, como membros dos PALOP, somos os únicos que até ao momento não nos dignamos a dar sequer um passo nesse sentido, o que representa uma grande lacuna na nossa governação. Acredito, tal como os entendidos na matéria, que um aprofundamento da democracia e da liderança participativa a nível local poderia contribuir para o crescimento e desenvolvimento sustentável pretendido, tendo como o fim último o bem-estar social das populações. Sobre esse facto, temos tido exemplos gritantes de situações que ocorrem nos municípios, a exemplo de Luanda, onde há as administrações que não conseguem resolver problemas básicos das populações, tais como: o fornecimento de água potável e o saneamento básico (a recolha de resíduos sólidos), tudo devido a uma governação demasiadamente centralizada. No contexto actual, as autarquias constituem condição imprescindível para um desenvolvimento harmonioso em todo o espaço nacional.

A UNITA e o MPLA têm posições divergentes sobre as autarquias?

Sim e não. Sim, pelo facto de até agora não ter havido um grande esforço e impulso da parte do partido maioritário na realização das autarquias locais que, por sinal, já vêm estabelecidas desde a vigência da Lei Constitucional de 1992, talvez por terem medo de perder o controlo administrativo de algumas áreas. Não, porque, até que eu saiba, a legislação sobre o poder autárquico foi aprovada quase que toda por consenso ou unanimidade pelas forças políticas com assento parlamentar, embora ter faltado a lei mais importante, que é a da institucionalização das autarquias locais, que, no nosso entender, deve ser feita em todos os municípios e em simultâneo. Nesse sentido, tal como aconteceu com as outras propostas, o ideal seria agendar essa proposta de lei, (Institucionalização das Autarquias), para que seja objecto de debate no Parlamento. Ocorre-me na memória, e como reflexão interessante, uma passagem de Hugo Schlesinger: "dialogar é construir pontes. Onde há ponte, existe comunicação. E a comunicação é o caminho para a verdadeira compreensão". Portanto, bastava vontade política.

No seu entender, quais são os grandes desafios da UNITA para este ano?

São vários os desafios da UNITA, tendo em conta o momento que o País e o mundo vivem. A situação política do País espera da UNITA uma posição clara sobre a galvanização das forças patrióticas, para a alternância do poder, que é um factor primordial na construção de uma Angola mais inclusiva. Como exemplo de outras bandas onde é possível vencer aqueles que vinham governando por muito tempo, aqui também se aconselha que haja bom-senso, compreensões que priorizem o objectivo principal e inadiável, que permita esta desejável e urgente alternância em Angola. Por aquilo que ocorre diariamente, o País já não tem mais muito tempo a esperar, pelo que se apela à consciência de todo o patriota sobre este facto.

Pode comentar a investigação que alegadamente envolve o ministro da Energia e Águas?

Para ser sincero comigo mesmo e para com os nossos leitores, não gostaria de responder a esta pergunta, personalizando-a, mas, sim, encarando-a num contexto geral. De facto, tenho acompanhado, com alguma atenção e apreensão, as várias denúncias que têm surgido aqui e acolá, dentro ou fora do País, à volta do saque financeiro que o País vem sofrendo. Dá-me a sensação de ter sido uma estratégia falhada do MPLA, de criar uma elite, embora atípica, forte politicamente e abastada economicamente, como forma de se perpetuar no poder, porque essa engenharia toda foi engendrada e materializada sob olhar passivo dos órgãos que velariam ou salvaguardariam os interesses do Estado. O que aconteceu se assemelha com o que dizia o economista e jornalista francês Frederic Bastiat, e passo a citar: "Quando o saque se torna um modo 3 de vida para um grupo de homens, eles criam para si próprios, no decorrer do tempo, um sistema jurídico que os autoriza e um código moral que os glorifica". Portanto, está aí uma das fraquezas de um estado que se preocupa mais em criar dirigentes fortes ao invés de instituições fortes. Entretanto, a demonstração do que o País é hoje está a ser espelhado pelas várias denúncias, tal como o famoso banquete, consórcio de jornalistas, e o Luanda Leaks, cujos culpados são todos que têm à testa o MPLA.

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