Nesta entrevista, onde João Lourenço fala com detalhe sobre o caso Isabel dos Santos e os Luanda Leaks, o Chefe de Estado aproveita para dizer sem rodeios que as informações postas a circular pelo jornal português Expresso, e já foram também desmentidas pela PGR, segundo as quais existiriam negociações com a empresária, são falsas.

"Nós gostaríamos de deixar aqui garantias muito claras de que não se está a negociar. Mais do que isso, não se vai negociar, na medida em que houve tempo, houve oportunidade de o fazer. Portanto, as pessoas envolvidas neste tipo de actos de corrupção tiveram seis meses de período de graça para devolverem os recursos que indevidamente retiraram do país. Quem não aproveitou esta oportunidade, todas as consequências que puderem advir daí são apenas da sua inteira responsabilidade", frisou.

Sobre a possibilidade de a Justiça angolana investigar o ex-Presidente José Eduardo dos Santos, Lourenço recorda que os ex-Presidentes gozam de imunidade durante cinco anos e que não lhe compete abrir ou fechar processos-crime mas sim a justiça.

"Quem abre os processos-crime na Justiça não são os políticos. É a própria Justiça quem vai atrás de possíveis crimes. Portanto, todos aqueles que estão a contas com a Justiça que não pensem que é o poder político quem os empurrou para a Justiça. Os políticos têm a missão de traçar políticas que deixem aos órgãos de Justiça as mãos livres para poderem actuar dentro das suas competências. Portanto, não se pode pensar que é o Presidente da República quem mandou para tribunal A, B ou C. Nem teria tempo para isso. São muitos casos no país. Todos os dias, a Justiça, os tribunais aqui em Luanda, nas províncias, julgam e em alguns casos condenam casos de corrupção", explicou.

João Lourenço garante que existe uma total independência da Justiça, admite que no passado pode não ter sido assim, mas agora esta "tem as mãos livres para actuar".

E até no caso do ex-Presidente Manuel Vicente, sobre o qual o Chefe de Estado reafirma o que já disse noutras ocasiões: "Ninguém pode dizer `eu não posso ser ouvido, ser constituído arguido, porque o meu vizinho também não foi." A Justiça não funciona assim. E se quer falar no caso Manuel Vicente, o que aconteceu é que nós pedimos, de facto, que o processo fosse transferido para Angola, e foi. E isso não significa absolvição. O caso está a ser tratado pela PGR, que há dias veio a público defender que quer o ex-Presidente da República, quer o ex-vice-presidente da República gozam de imunidade durante os primeiros cinco anos".

E, nesta entrevista à DW, clarifica uma informação que há muito corre em Luanda, que Manuel Vicente é seu conselheiro.

"É falso. Eu não tenho esse senhor como meu conselheiro. Os meus conselheiros são conhecidos. Alguém acordou bem-disposto e inventou isto. (...) Ele não é meu conselheiro para área nenhuma. O que se diz é que é meu conselheiro para o sector dos petróleos, mas isso é absolutamente falso. Não trabalha para mim, nem de forma remunerada, nem de forma gratuita. E há formas de se checar isso. Portanto, quem quiser checar tem a liberdade de o fazer. E há-de chegar à conclusão de que quem está a dizer a verdade sou eu.".

À pergunta "o senhor foi secretário-geral (do MPLA) e ministro da Defesa também. Conheceu o ex-Presidente e trabalhou com ele durante um bom tempo. Porque não fez essas críticas durante aquele período?", João Loirenço responde assim: "Não, de facto eu trabalhei debaixo da orientação do Presidente José Eduardo dos Santos. Todos nós trabalhamos. Um Presidente que ficou quase 40 anos no poder. Ninguém pode dizer que não fazia parte do sistema. Todos nós fizemos parte do sistema. Mas quem está em melhores condições de corrigir o que está mal e melhorar o que está bem são precisamente aqueles que conhecem o sistema por dentro. Isso foi assim em todas as revoluções, se assim quisermos chamar."

E continua: "Quem fez as grandes mudanças não são pessoas de fora, são as que conhecem o sistema. Quem fez as reformas na Rússia foram os russos; quem fez as reformas na China foram os chineses. Quem fez as reformas em todos os países da antiga Europa do leste foram os povos e políticos desses países. Os de fora começam por conhecer mal a realidade dos países e dos povos. Isso é assim em todo o mundo, quem fez a Revolução dos Cravos em Portugal foram os portugueses e aqueles que eram do regime de Marcelo Caetano