Com uma escalada bem vincada há pelo menos dois meses, o barril de crude está hoje a valer perto de 84,25 USD, registando uma subida de +1,29%, no Brent, sendo que o WTI, a outra grande referência global, segue a mesma tendência de ganhos, estando hoje a valer, igualmente pouco depois das 10:50, 81,39 +1,18% que na quarta-feira ao final do dia dos mercados.

Há muito que algumas das grandes casas financeiras antecipam a chegada do barril aos 90 USD, como é o caso da Goldman Sachs, mas agora também o Presidente russo, Vladimir Putin, um dos homens com mais poder no mundo dos petróleos, a admitir que essa fasquia será atingida em breve e ultrapassada de forma clara, pelo menos até aos 100 USD.

A Rússia é, actualmente, o segundo maior produtor de petróleo do mundo, com pouco mais de 10,8 milhões de barris por dia (mbpd), podendo chegar em condições normais, aos 12,5 mbpd, e um dos membros da OPEP+, liderando o grupo de 10 países que desde 2017 se juntaram aos 13 da OPEP para equilibrar os mercados em forte queda devido à crise que desde 2016 afecta fortemente o sector, que se agravou, entretanto, com a pandemia, estando agora a beneficiar do fade out da Covid-19.

Liderando a OPEP+, em conjunto com a Arábia Saudita, o 3º maior produtor nos dias de hoje, embora, tal como a Rússia, abaixo do seu potencial, que vai até aos 13 mbpd, mas que esta, actualmente, pouco acima dos 9,5 mbpd, o chefe do Kremlin tem nas mãos a capacidade de manusear o seu "arsenal" de forma a fazer evoluir os preços a seu favor, até porque junta ainda o gás natural, que, na condição de maior fornecedor europeu, lhe acrescenta capacidade de manipulação dos mercados.

Foi numa conferência sobre energia que Putin disse que o barril está a caminho dos 100 USD, embora tenha, igualmente, sublinhado que o "cartel" que integra, a OPEP+, procura estabilizar os mercados.

E isso pode ter já acontecido no início deste mês, quando o "cartel", na sua reunião mensal, mesmo sob pressão das grandes economias, EUA, Índia, Japão e China, para elevar a produção, optou por manter o plano de acrescentar apenas 400 mil bpd mensalmente e até ao final de 2021, o que levou a uma subida repentina do barril, batendo mesmo um recorde de sete anos.

Agora, numa clara demonstração de força, Vladimir Putin, que mantém um braço de ferro com a Europa e os EUA para a construção de um segundo gasoduto - Nordstream II -, vem dizer que é bem possível ver o barril nos 100 USD em breve.

Como alguns analistas têm sublinhado, os países produtores, como é, apesar do declínio da produção nacional, o caso de Angola, estão conscientes de que atravessam a fase final da bonança permitida pelo petróleo que exportam devido à urgência da transição energética importa pelo aquecimento global e o risco iminente de colapso do clima planetário que pode "derreter" as condições de vida no Planeta Terra.

E Putin não é diferente, sabendo melhor que ninguém que precisa de aproveitar os anos que restam ao petróleo como o combustível da economia mundial e fonte de riqueza para os países exportadores.

Os avisos do MOMR

Estas declarações de Putin foram reproduzidas pelas agências na querta-feira, dia em que a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP) divulgou o seu relatório mensal sobre o mercado petrolífero (MOMR, sigla em inglês), onde se evidencia que a matéria-prima está a perder ímpeto face à aceleração da inflação nas grandes economias e ainda por causa das esperadas disrupções nas cadeias de abastecimento por causa, ainda, da pandemia.

Neste seu MOMR o "cartel# mantém como perspectiva um crescimento de 5,8 milhões de barris por dia (mbpd) em 2021, embora este valor seja uma revisão em baixa do anterior, que previa mais 5,96 mbpd.

O "cartel" sublinha neste relatório de Outubro que a procura petróleo permanece "saudável", seja por causa da chegada do Inverno ao hemisfério norte, seja porque deverá ocorrer na Europa uma gradual substituição do gás natural, que está a preços no limite do suportável, por derivados do petróleo.

A OPEP mantém a estimativa para 2021 de um consumo global de 96,6 mbpd em média e para 2022 prevê um crescimento de 4,2 mbpd, sublinhando que no próximo ano o consumo voltará definitivamente aos valores pré-pandémicos, acima dos 100 mbpd, situando-se mesmo nos 100,8 mbpd.

Por detrás deste optimismo, na perspectiva dos países exportadores, está a esperada e continuada recuperação das grandes economias planetárias e ainda uma melhor gestão da pandemia da Covid-19.

Porém, dentro da OPEP, começam a surgir vozes contrárias aos robustos aumentos no valor do petróleo, como é o caso do ministro dos Petróleos iraquiano, Ihsan Abdul Jabbar, que disse à Reuters que estão criadas as condições para o adequado balanceamento dos mercados.

E, apesar de tudo, como pode Angola aproveitar este momento?

Para países como Angola, cujas economias são extremamente dependentes das exportações de crude, este momento é, seguramente, gerador de derradeiras oportunidades para investir na diversificação das suas economias com os excedentes gerados pelos elevados preços da matéria-prima, escolhendo bem onde apostar.

Com o barril quase nos 85 USD, o Executivo angolano, que elaborou o OGE 2021 com 39 USD como valor de referência para o barril, conta com um bónus de 46 dólares, o que permite, mesmo que sejam gigantescos os compromissos com a dívida externa, colocar uma boa parte deste superavit na diversificação da sua asfixiada economia.

No entanto, para já, de forma a corresponder a urgências imediatas, como é o caso da redução dos gastos com a subsidiação dos combustíveis, gasolina e gasóleo, que leva dos cofres públicos quase 2 mil milhões USD/ano, o Governo tem colocado uma boa parte das fichas na aposta da construção de refinarias, contando com o abastecimento local e com a exportação de refinados para outros países do continente onde a transição energética, espera-se, venha a demorar mais a chegar.

Porém, como alguns especialistas têm vindo a chamar à atenção para isso, o calendário destes processos não obedece às leis a que estávamos habituados no passado e podem, de um momento para o outro - a COP26, em Glasgow, no próximo mês é um bom exemplo e uma possibilidade de algo inesperado suceder - conduzir a mudanças radicais de paradigma que deitem por terra tudo isso, face à já hoje evidente urgência de mudança, como lembrou na última Assembleia-Geral da ONU, o seu Secretário Geral, António Guterres, afirmando que o mundo vive o seu último curto intervalo temporal para levar a sério o "alerta vermelho" climático.

Ou seja, se não for nos próximos 2 a 3 anos, Angola terá, exponencialmente, mais e mais dificuldades em ter como investir na modernização da sua agricultura, na diversificação das fontes de rendimento, no aproveitamento do seu potencial mineiro...

Cenário de fundo

No entanto, este é o momento para aproveitar o que houver para aproveitar. Mas mesmo isso não está a ser fácil.

Se Angola, Nigéria, Líbia ou Argélia, os grandes produtores africanos, sofreram com a baixa do consumo, a recuperação não está a ser igualmente rápida, muito devido à fraca capacidade de resposta, de forma mais acentuada em Angola e na Nigéria, por causa da deterioração da sua infra-estrutura, do desinvestimento em pesquisa, em manutenção e já, também, resultado de uma desistência global do petróleo devido à poluição e o esforço mundial para uma transição energética que afaste a ameaça das alterações climáticas sobre a humanidade.

Mas o mesmo não se pode dizer dos países do Golfo, que tiveram melhor visão estratégica ao longo dos anos, investindo mais na diversificação e na manutenção dos seus campos, que, agora, estão a dar uma resposta adequada ao aumento da procura e a gerar optimismo entre os diversos sectores económicos, como é o caso da Arábia Saudita, cujo mercado bolsista cresceu mais de 42 por cento nos últimos 12 meses.

Este exemplo é ainda mais interessante porque o crescimento mais volumoso reflecte-se, segundo os media internacionais especializados, no sector não petrolífero, como as telecomunicações, o turismo, o comércio e a indústria química..., sendo que a petrolífera nacional, a ARAMCO, no mesmo período, ganhou uns meros 3,3%.

Mas esta lancinante recuperação, que já é vista como o milagre do Golfo, abrange ainda os Emirados Árabes Unidos, com o mercado bolsista a subir mais de 14%, com destaque para os sectores da saúde, da banca e do ensino privado, ou ainda das telecomunicações, entre outros.

E o cenário é muito semelhante, como se pode perceber pelos dados que estão a ser divulgados pelas agências, no Qatar, no Kuwait, Baharain ou mesmo no Irão, apesar deste país estar sujito à pressão adicional das sanções norte-americanas.

A ficar para trás

Entre os restantes exportadores de crude, a recuperação está a ser substancialmente mais lenta, como é o caso de Angola, onde a economia se debate com a pressão da inflação, que pode chegar, segundo o INE e o BNA, aos 27% nos próximos meses, uma crise social sem precedentes desde o fim da guerra, em 2002, e uma assinalável incapacidade para que os esforços da diversificação económica mostrem sinais de estar a produzir efeito.

Como pano de fundo para este cenário difícil, o País tem o acentuado declínio da sua produção de petróleo, que está actualmente abaixo dos 1,1 milhões de barris por dia e com tendência para diminuir ainda mais.

Tudo devido aos sobejamente conhecidos problemas do abandono de algumas das majors com investimentos no off shore nacional, face a uma "infecciosa" dependência do petróleo que, ao longo dos anos, criou uma inércia geral face à urgência de diversificar a economia apesar de ser bem conhecida essa urgência.

E o resultado é o que se sabia estar ao virar da esquina perante uma realidade em que o petróleo ainda é rei e senhor na economia nacional.

Sendo Angola um dos países na linha da frente das repercussões do sobe e desce dos mercados petrolíferos, devido à sua dependência das exportações de crude para o equilíbrio das suas contas - o petróleo ainda é responsável por mais de 94% das exportações e mais de 60 por cento dos gastos do Executivo e acima de 30% do PIB, este cenário de recuperação permite, ainda assim, algum optimismo nas contas nacionais mas ainda longe de um regresso ao patamar alcançado a partir de 2008, com o barril, como exemplo, a chegar aos 147 USD no Verão desse mesmo ano, permitindo um boom económico como nunca visto até ali.

A produção actual, em constante declínio, está abaixo dos 1,1 mbpd devido ao desinvestimento das "majors" a operar no offshore nacional, especialmente a partir de 2014, quando se verificou uma quebra abrupta do valor do barril, que passou de mais de 120 USD para menos de 30 dois anos depois, em 2016, bem como devido ao esgotamento/envelhecimento dos campos mais activos.

Apesar das mudanças substanciais na legislação referente ao sector e às alterações profundas nesta indústria decisiva para o País, a produção tem vindo a perder viço especialmente por causa da deterioração da infra-estrutura produtiva que desde 2014 viu os investimentos das "majors" descer, a fraca aposta na pesquisa por novas reservas e o envelhecimento de alguns dos mais importantes poços activos no offshore nacional.

Para já, com o barril acima dos 84 USD, o Executivo de João Lourenço conta com uma folga de mais de 45 USD em cima dos 39 USD que foi o valor usado como referência para a elaboração do OGE 2021, o que permite encarar com maior optimismo esta saída esperada da crise mundial, apesar dos fortes constrangimentos que a economia nacional enfrenta.

E com a transição energética a impor cada vez mais a sua vontade, com o crude e os restantes hidrocarbonetos a ser olhado como uma infecção perigosa e contagiosa, o País tem agora de fazer o que não fez nos últimos 20 anos: diversificar a sua economia o mais rápido possível, porque o petróleo tem os dias contados. E são cada vez menos.