Nas páginas das Nações Unidas e das suas agências vocacionadas para o sector alimentar facilmente se encontram dados que arrepiam, como a ideia de que dos quase 8 mil milhões de pessoas que habitam no Planeta Terra, além dos 41 milhões em risco de vida, 811 milhões viveram períodos de fome significativa em 2020, quase mil milhões (957), o equivalente a toda a população africana ou o dobro da que vive no espaço da União Europeia, vivem em pobreza extrema, o que significa que, além de comida, também lhes falta água potável, saneamento, educação e abrigo...

Desse universo populacional em condições de miséria, a quase totalidade vive com 1,25 USD ou menos, o que nestes países, dezenas deles em África, mesmo nos mais pobres, não chega sequer para comprar um litro de leite.

Mas a degradante imagem que estes dados dão do escasso empenho dos mais ricos para evitar a fome no mundo, a ONU, como avançou o Secretário-Geral da ONU, António Guterres, aproveitou a primeira cimeira mundial dos Sistemas Alimentares no âmbito da Assembleia Geral das Nações Unidas, para sublinhar o outro lado desta moeda de fraco valor facial, que é o facto de 2 mil milhões de pessoas em todo o mundo sofrerem problemas de obesidade, muitas destas, no entanto, também por falta de uma alimentação saudável devido à pobreza.

Esta cimeira dos Sistemas Alimentares visa gerar contextos para a garantia de que o mundo tem ferramentas adequadas para fornecer alimentação suficiente em todo o mundo a quem vive carências alimentares graves.

Um dos recados deixados por António Guterres é o de que a comunidade global precisa de "incrementar ou reforçar sistemas de alimentação e nutrição em casos de emergência nas áreas afectadas por conflitos ou desastres naturais" e precisa de investir "em sistemas de alerta precoce para prevenção da fome".

É urente "fortalecer a resiliência dos sistemas alimentares locais a choques externos, como conflitos, mudanças climáticas e pandemias", disse ainda o SG da ONU.

Ainda sobre o relatório da ONU, fica em evidência que as causas para uma deficiente alimentação são muitas e vão desta a distribuição ineficiente da riqueza, como é o caso de alguns países africanos com muitos recursos concentrados em poucas pessoas, conflitos ou fenómenos climatéricos agrestes, como secas ou inundações...

Em números, as Nações Unidas sublinham o facto de haver alimentos suficientes no mundo para todos mas 16,6 por cento dos 8 mil milhões de pessoas no planeta passam fome ou estão na condição de subalimentados.

Em 2020, ano de forte impacto da pandemia da Covid-19, que esteve por detrás de um incremento substancial dos problemas de carências alimentares e outras, como, por exemplo, a diminuição da acção dos programas de vacinações em todo o mundo contra doenças como a pólio, foram, ainda assim, os conflitos foram a razão preponderante para a ocorrência de situações de fome em larga escala abrangendo 99 milhões de pessoas em 23 países.

Ficou ainda a saber-se que a subnutrição foi responsável em 2020 por 45% das mortes de crianças em todo o mundo, sendo que em média morrem anualmente 3,1 milhões de crianças por causa de consequências directas e indirectas da fome, como as diarreias.

O problema da subnutrição afecta a grande maioria dos países africanos e Angola é um dos que nos últimos anos tem sentido esse prolema de forma severa devido à prolongada seca nas províncias do sul do País.

Angola

Em Angola, de acordo com os últimos dados do Programa Alimentar Mundial (PAM), há, pelo menos 1,3 milhões de pessoas com fome extrema nas províncias do sul do País devido à seca, com destaque para as províncias da Huíla, Cunene e Namibe, onde este problema surge ciclicamente ao longo dos tempos mas nos últimos anos com mais gravidade devido às alterações climáticas, mas também no Bié e no Kuando Kubango.

Como o Novo Jornal tem noticiado ao longo dos anos, a seca prolongada no sul de Angola, e, no resto da África Austral, tem a sua razão de ser no agravamento do impacto das alterações climáticas, especialmente devido ao El Nino, um fenómeno meteorológico que resulta da alteração da temperatura das águas dos oceanos.

Como resposta a este agravamento da penúria alimentar no sul de Angola, milhares de famílias têm estado a migrar para a vizinha Namíbia, onde, em grande parte dos casos, encontram situações semelhantes, embora a maior capacidade de resposta do Governo de Windhoek, e a sua organização de segurança social mais aprimorada, permitam, apesar de tudo, estar melhor do lado de lá da fronteira.