É muita "fruta" para uma equipa como a do Sagrada Esperança, habituada, tal como as restantes do País, a jogar uma vez por semana e, vez por outra, duas vezes no máximo, com desafios ao fim e no meio da semana. Na Europa, algumas equipas chegam a disputar três partidas por semana. Mas há cada vez mais vozes a levantarem-se por causa da sobrecarga de jogos e, não tarde, provavelmente as entidades que comandam o futebol mundial (FIFA e UEFA) vão pôr cobro a esta situação. Afinal, as reclamações procedem dos principais fazedores do espectáculo: jogadores e técnicos.
No caso concreto do Sagrada Esperança, não há objectivamente razões que justifiquem a disputa dessa sequência de jogos em tão curto espaço de tempo. Devido às viagens que terá de efectuar o campeão nacional, o competente órgão da Federação Angolana de Futebol (FAF) deveria protegê-lo, de modo a que dispusesse de melhores condições para passar a eliminatória. O calendário nacional não é assim tão preenchido que não se consiga encontrar uma data para a disputa da partida com o Desportivo da Huíla ou outras que estiverem no meio de uma eliminatória africana.
Era suposto que a FAF criasse todas as condições óptimas para o Sagrada Esperança desempenhar-se sem problemas maiores. E criar essas condições significaria adiar o jogo com o Desportivo da Huíla, dando possibilidade de plena recuperação física e emocional à equipa da Lunda-Norte. Mal algum, aliás, viria ao mundo se as gentes que gerem o futebol doméstico adiassem o desafio do Lubango. Antes pelo contrário, à partida, beneficiaria o seu filiado e, por extensão, o futebol angolano. Pelo menos é assim que gente sensata da "tribo do futebol" angolano esperava que fosse feito.
A entrada do Sagrada Esperança (e do Petro de Luanda também) na fase de grupos da Liga dos Campeões é deveras importante para o futebol angolano que, desse modo, cimenta a sua posição no G-12, o selecto grupo de países que competem com quatro emblemas nas "Afrotaças". Além de reforçar a posição, coloca os seus jogadores numa montra que hoje é visitada amiúde por "caçadores de talentos", a fim de exportá-los para a Europa, o centro do futebol mundial. E não podemos perder de vista que ainda há compensação financeira razoavelmente boa, tendo em atenção que está cada vez mais difícil injecção de dinheiro no desporto nacional.
Ora, com a "maratona" de jogos e viagens que tem durante a abordagem do último obstáculo antes da fase de grupos da "Champions" africana, teoricamente as possibilidades de o Sagrada Esperança superar o adversário são menores. O cansaço das viagens e o pouco tempo de recuperação entre os três desafios podem ser fatais, mesmo tendo em atenção que o campeão do reino de Eswatini não é da primeira linha continental. Ainda assim, é sempre bom lembrar que hoje já não há equipas fracas e a antiga Swazilândia cresceu muito em termos futebolísticos nos últimos tempos.
Como se isso fosse pouco, o campeão nacional não disputa os desafios caseiros no seu estádio. Tudo porque, estranhamente, o recinto não mereceu a aprovação da Confederação Africana de Futebol (CAF) para a edição 2021/22 das "Afrotaças". Curiosamente, além dos estádios de Luanda (Coqueiros e 11 de Novembro), o outro que recebeu "luz verde" da entidade continental é o "Mártires Kanyala", na Caála, cujo proprietário, o Recreativo local, no último "Girabola" sempre esteve longe dos lugares de acesso às competições africanas de clubes, ao contrário da formação "diamantífera" que desde cedo frequentou o topo da classificação da prova.
Mais estranho ainda se torna o facto de o Estádio Sagrada Esperança não ter sido validado pela CAF, visto que pouco antes do início das "Afrotaças" lá esteve uma equipa de inspecção da FAF, dirigida por José Neves, do Conselho técnico-desportivo. E a turma não foi lá em tarefas relacionadas com a competição doméstica. Foi lá, em representação da CAF, como recomendam as normas quando a entidade continental não pode por alguma razão enviar os seus representantes. Aliás, o Sagrada Esperança pagou as despesas de deslocação, acomodação e afins dessa equipa com base em padrões continentais, que era a categoria da missão.
De acordo com o normativo, após a inspecção, é enviado um relatório ao competente órgão da CAF para a validação (ou não) do estádio, no caso vertente, o localizado no Kamakenzo. Sobre este assunto em concreto não há nenhuma posição oficial pública da FAF e sequer se sabe se o relatório foi enviado ou não à entidade máxima do futebol continental. Pelo menos do site, o mais importante veículo da instituição, onde deveria constar toda a informação relevante da instituição, nada consta sobre os temas em referência.
Com a Selecção Nacional em muito maus lençóis, era imperioso que pelo menos a nível de clubes Angola conseguisse performances honrosas, mais ou menos como a do 1.º de Agosto em 2018, quando foi afastado da final da Liga dos Campeões da CAF por uma arbitragem descaradamente caseira a favor do Espérance. Ou próximo disso para assegurar por muito tempo a permanência no G-12. Desse modo, há sempre uma janela de oportunidade aberta para o "salto" em direcção à Europa. E quantos mais jogadores um país tem na Europa, mais facilmente forma uma selecção competitiva e está mais próximo de ganhar nas provas continentais.

Do modo como as coisas vão sendo levadas na FAF, até parece que o "dream team" que manda na FAF desconhece que quanto mais forte forem as equipas de clubes, mais forte será a Selecção Nacional, cujos louros administrativos (e não só) recaem em primeira instância sobre a direcção da Federação. Será distracção ou algo mais do que apenas isso?