Ora, ficando tudo a nu - todos vêem. Vêem como os sujeitos - políticos de bibe cheios de ranho - maltratam funções de relevo no Estado e, como, a uma velocidade supersónica, conseguem trepar na sua hierarquia.
Com golpes e contragolpes de esgrima, fazem-no com pompa e circunstância, sem nunca na vida terem dobrado a mola. Fazem-no atropelando tudo e todos.
Fazem-no capturando os seus lugares chave e oleando a sua máquina com tiques de insuportável sabujice política. Entronizados lá dentro, tentam, a todo o custo, transformar o Estado numa feira de vaidades e as suas instituições em presas da sua agenda pessoal.
Não sendo um mal que nos seja exclusivo, esse mal já não provém apenas de uma velha pandemia. Esse mal já não provém apenas da importação em série de recursos humanos do estrangeiro, nomeadamente de Portugal, que, ao apostarem numa estratégia de renovação permanente dos seus contratos em Angola, sempre se distinguiram por recusar libertar do seu chip o essencial para os angolanos: o conhecimento.
A culpa, é claro, não é dos importados. Recai inteirinha sobre os importadores, mas agora, as consequências desse mal, em parte, provêm do recrutamento, a partir das mesquitas partidárias, de criaturas que, não tendo noção alguma do que é a administração pública e do que é trabalhar, passaram a inundar e a cativar lugares de chefia nos Ministérios, Secretarias de Estado e empresas públicas.
O nosso mal foi termos recusado pensar que a fidelidade partidária e a confiança política, hoje por hoje, constituem cada vez mais atributos que valem zero no mercado de trabalho.
Com essa recusa, vindos das "jotas" - o parque de diversão natural da tribo - vemos os representantes da raça serem promovidos a aspirantes a governantes e o resultado é o desastre que temos à vista.
Uma vez na rampa de lançamento, para abocanharem tachos e mais tachos, esses sujeitinhos não resistem ao deslumbramento dos cargos e, no seu exuberante exercício, chegam a fazer o impossível: detendo tantos pelouros, evidenciado pela montanha de papéis que acumulam em cima da secretária, vão a tantas reuniões, fazem tantas visitas relâmpago... "às províncias", viajam tanto para o estrangeiro, que, na verdade, ninguém sabe quanto tempo lhes sobra para pensarem ou para (não) trabalharem...
Uma vez almofadados no Estado e nas suas instituições, por lá ficam anos e anos e depois de - "sem saberem ler nem escrever" - terem sido directores nacionais, acham que só podem ser Ministros, Secretários de Estado, administradores chefes de bancos, seguradoras ou das grandes empresas públicas.
A maioria deles até é licenciada, mas abomina tanto os desafios do mundo do trabalho, que prefere fazer carreirismo político no Estado e nas empresas públicas em vez de trabalhar.
Fazem esta aposta amparados por soberba ociosidade política porque receiam enfrentar o mercado de trabalho. E receiam enfrentá-lo porquê? Porque têm medo da concorrência. Porque reconhecem que representam um poço de incompetência!
Sedentos de boa vida, protegem-se por lá durante anos e anos e quando são promovidos atribuem aos nomeadores - seja ao Presidente, seja aos Ministros - qualidades divinas que só eles sabem descortinar.
Por lá ficam anos e anos, convencidos de que nasceram predestinados a serem apenas chefes. Por lá ficam anos e anos, correndo atrás de lugares e empregos - não confundir com trabalho.
Por lá ficam anos e anos, perseguindo estilos de vida acima das suas fracas qualificações, a possibilidade de mandarem cada vez mais e a oportunidade de corromperem e de serem corrompidos na mesma proporção.
Por lá ficam anos e anos e, ao arreigarem cada vez mais o conceito de carreira profissional à ideia do carreirismo político, este passa a comandar o percurso dos feirantes nas mais diversas instituições públicas.
Sem carreira profissional, os carreiristas detestam que se fale das suas inabilidades. Odeiam abordar a sua mediocridade. É bom que saibam e que lhes seja lembrado, no entanto, que o monstro existe e que os seus efeitos vêm conspurcando, de forma grave, o ambiente de trabalho em muitos organismos do Estado.
Por lá ficam anos e anos até se tornarem insuportáveis e do alto da sua arrogância julgarem que são o centro do mundo, ao ponto de não quererem saber o que é ser servidor público. Não sabem, porém, escalar, sem cunhas e sem o amparo dos partidos, as suas várias categorias.
Não sabem também que, cá fora, os cidadãos sabem que, lá dentro, não passam de alpinistas que se sentem permanentemente inseguros nos seus postos artificiais.
Não sabem ainda que, aquilo que os cidadãos pensam sobre o seu itinerário carreirista, não coincide com o que eles pensam sobre si mesmos. Não pensam sequer em si. Só pensam em surgir "encadernados" de fato e gravata como os nossos novos príncipes do carreirismo laboral.
O resto, que é o essencial - o trabalho - não lhes interessa pensar porque lhes convém permanecerem atados ao peso napoleónico que a partidarização passou a ter no seu destino. Sem esse peso, não se revêem no espelho...

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