Apesar de ser ilegal à luz da legislação actual, segundo os comerciantes de medicamentos nos mercados informais de Luanda, contactados hoje pela Lusa, homens e mulheres continuam a procurar por medicamentos como o "Cytotec" e o "Primolut" para interromperem a gravidez.

Além disso, garantem que existem igualmente centros clínicos nos arredores de Luanda que, de forma clandestina, praticam o aborto cobrando entre 7.000 a 10.000 kwanzas.

"Agora, o mais seguro é mesmo ir num posto médico. Dão uma injecção e expulsam logo o feto em cinco minutos. Nos mercados já estão a vender comprimidos Cytotec falsos e ainda na semana morreu uma vizinha minha, devido a isso", contou à Lusa Filomena Tchowá, vendedora ambulante de medicamentos em Luanda.

Outro vendedor de medicamentos, Nsimba Josué, explicou à Lusa que uma lâmina com três ou quatro comprimidos para interromper a gravidez pode custar entre 2.000 a 3.000 kwanzas, por vezes até menos.

"Mas eu não vendo disso", advertem estes vendedores, temendo represálias num momento de controvérsia no país sobre o tema.

Noutros pontos, estes vendedores, embora com cuidados redobrados e sem nunca se identificarem, explicam a forma de tomar os comprimidos (três a seis), garantindo que a taxa de sucesso neste tipo de aborto é superior a 90%.

A proposta do novo Código Penal, na primeira versão levada em Fevereiro à Assembleia Nacional, previa a possibilidade de realizar legalmente o aborto no país, por exemplo em caso de violação ou por motivos de saúde. Contudo, já no parlamento, face às propostas de alteração apresentadas pelos deputados, o documento passou a penalizar, com cadeia, qualquer caso de aborto.

O MPLA solicitou, entretanto, a retirada deste ponto da agenda da última reunião da Assembleia Nacional, para aprofundamento junto das várias sensibilidades do país, quando um grupo de mulheres promoveu uma marcha contra a penalização do aborto, a 18 de Março.

"Nós pretendemos que este assunto não caia no esquecimento, para que esta lei, que penaliza o aborto, não seja aprovada de forma clandestina. Ou seja, queremos continuar a fazer mais barulho, queremos atingir a mais pessoas, para que elas estejam atentas, para que não haja aprovação de uma lei que a maioria não aprova", disse à Lusa Mónica Almeida, uma das organizadoras desta marcha, que juntou dezenas de mulheres em Luanda.

Já os bispos católicos angolanos classificaram na sexta-feira como "um exemplo para todos" a decisão do parlamento, de retirar da proposta inicial do novo Código Penal as excepções ao aborto, proibindo-o em absoluto, apesar da contestação de alguns sectores da sociedade.

A posição foi expressa pelo presidente da Conferência Episcopal de Angola e São Tomé (CEAST), Filomeno Vieira Dias, arcebispo de Luanda, durante a cerimónia de abertura da primeira reunião plenária anual da conferência, que está a decorrer na província de Benguela, tendo sublinhado que a Igreja Católica é contra o aborto e que defende a "dignidade e a inviolabilidade da vida de cada ser humano" por considerar que há âmbitos da existência que "não são debatíveis".

"É nosso dever como pessoas cristãs afirmá-lo sem ambiguidades. Neste momento agradecemos especialmente aqueles legisladores cristãos e não cristãos que com o seu voto se comprometerem publicamente com a vida do que está para nascer, o seu voto é um exemplo para todos", fundamentou.