Território de reduzida dimensão no interior do Azerbaijão, Nagorno-Karabakh tem grande importância estratégica porque se situa na rota das exportações de gás natural e crude do Azerbaijão para a Europa, especialmente para a Turquia, sendo que a esmagadora maioria da sua população tem origem étnica na Arménia.
Apesar de as Nações Unidas reconhecerem que integra o Azerbaijão, desde 1994, quando terminaram, por um acordo de cessar-fogo que vigorou até agora, quase cinco anos de uma das mais brutais guerras da segunda metade do século XX na Europa, a autoridade no território é ainda substancialmente influenciada pela Arménia.
Este conflito, que se reacendeu há menos de uma semana, tem um enorme potencial de se alastrar para a região e de colocar frente a frente duas das grandes potências militares europeias, a Rússia, que tem bases militares na Arménia e uma longa história de cumplicidade com este país, ambos de maioria cristã ortodoxa, e a Turquia, que já veio a público dizer que apoia de forma clara e inequívoca o Azerbaijão, com quem comunga interesses estratégicos na área dos hidrocarbonetos e religiosos, sendo ambos de maioria muçulmana.
Nagorno-Karabakh fica no interior do Azerbaijão, entalado no Caucaso, mas a escassas dezenas de quilómetros da Arménia, região geográfica vizinha do Irão, da Turquia, da Geórgia e da Rússia, e com o estratégico Mar Cáspio a leste, com 146 mil habitantes em cerca de 4.500 kms2 marcados por uma orografia essencialmente montanhosa, onde a Europa se separa da Ásia e se concentra um potencial barril de pólvora que se sabe como pode começar a arder mas ninguém pode dizer como se apagam a suas chamas.
Este enclave, também conhecido por República de Artsakh, tem uma história conturbada ao longo dos séculos mas a recente tensão, dos anos de 1980/90, é fruto do desmembramento da antiga URSS e do recrudescimento das tensões nacionalistas entre os dois países, sendo que a razão para este reatar das hostilidades, com a intervenção de artilharia pesada, aviação e milhares de homens no terreno, ainda está por explicar com exactidão, sendo que ambos os lados se culpam mutuamente do primeiro tiro.
O perigo de uma escalada regional do conflito é evidente, especialmente depois de o Presidente turco, Tayyip Erdogan, ter, de forma agressiva, ter dito publicamente que vai apoiar, sejam quais forem as circunstâncias, o seu aliado Azerbaijão, existindo já relatos do território que aponam para a presença de centenas de mercenários levados pela Turquia da Líbia para Nagorno-Karabakh.
Para conter as hostilidades, países como a França, Alemanha, Rússia e EUA estão a proceder a esforços diplomáticos para voltar a colocar os dois lados da barricada a negociar uma saída para mais este espinho cravado na Europa.
A dificuldade, para já, é que o Azerbaijão, o que coloca em dúvida a posição da Turquia, que é a quem mais interessa que o território volte a ser controlado pelo seu aliado pelo acesso ao petróleo e gás natural, parece não aceitar sequer a possibilidade de voltar ao anterior status quo, exigindo que seja cumprida a disposição da ONU que determina que prevaleça a sua autoridade sobre Nagorno-Karabakh, o que a Arménia, alegando a defesa dos interesses e protecção da sua população, rejeita liminarmente. Tudo condimentos para a continuação das agressões bélicas.
Para já, nas televisões mais atentas a este reatamento de um dos mais antigos conflitos europeus, a RT russa e a Al jazeera, os Ministérios da Defesa dos dois beligerantes têm divulgado vídeos onde as suas artilharias, aviação e drones atingem duramente o inimigo.
Na guerra de 1988-1994 morreram cera de 30 mil pessoas e mais de um milhão foi deslocada devido à guerra, o que deixa em aberto a possibilidade de mais um prolongado conflito na Europa.
Efeitos colaterais
O Azerbaijão tem reservas de petróleo estimadas em 7 mil milhões de barris, cerca de 0,5% das reservas mundiais conhecidas, produz diariamente cerca de 840 mil barris e cerca de 30 mil milhões de metros cúbicos de gás natural, quase tudo exportado para a Europa através do Caucaso.
Recorde-se que a Líbia, devido ao conflito que decorre internamente, deixou de produzir cerca de 500 mil barris por dia, o que levou a um aumento do valor do barril de crude, tendo contribuído esse facto para aliviar a pressão em baixa da crise pandémica da Covid-19 nos últimos dois meses, com Angola a ser um dos países "beneficiados" com essa consequência.
Se este conflito entre o Azerbaijão e a Arménia evoluir para um confronto aberto, existe igualmente a possibilidade de impactar no negócio global do petróleo e do gás natural.