Durante o dia de hoje a situação agravou-se a ponto de gasolina já não estar disponível em nenhum posto de abastecimento visitado pelo NJOnline e o gasóleo estava disponível apenas em dois - entre dezenas - que também estavam quase a secar.
Em algumas das bombas da cidade as filas chegam a atingir 2 quilómetros e muitos dos automobilistas nem sequer tentam noutros locais porque o combustível que têm nas suas viaturas não permite fazer os quilómetros suficientes e também porque o passa-palavra não deixa margem para dúvidas: Luanda secou de combustível.
As razões para esta situação, dadas pela Sonangol, no Sábado, permanecem actualizadas e passam pela dificuldade da empresa em aceder às divisas que lhe permita adquirir o combustível, sendo que 80 por cento do gasóleo e da gasolina consumidos em Angola são importados.
Apesar de Angola ser o segundo maior exportador de petróleo do continente africano, com cerca de 1,4 milhões de barris por dia, a sua capacidade de refinação, processo que permite transformar o crude em bruto em gasolina, gasóleo e outros refinados, como lubrificantes, é muito limitada, o que obriga a que a solução passe pela importação, o que consome anualmente cerca de mil milhões de USD aos cofres do Estado.
A única refinaria do país, construída na longínqua década de 1950, situada em Luanda, tem uma capacidade limitada de refinação, apenas 60 mil barris por dia, quando o país carece de mais de 200 mil barris por dia.
Todo o restante combustível é adquirido nos mercados internacionais a um preço médio de cerca de 1,5 dólares norte-americanos, o equivalente a cerca de 480 kwanzas, quando o valor na bomba para venda ao consumidor em Angola é de 160 Akz/litro, o que corresponde a um subsídio estatal - via Sonangol - de pelo menos 320 kwanzas por cada litro de gasolina consumida no país.
A Sonangol alude ainda a dívidas pesadas das empresas industriais angolanas, que são responsáveis por 40 por cento do consumo de combustíveis no país, seja na laboração da maquinaria, seja na geração de energia eléctrica através de grupos geradores.
O ajuntamento de automóveis nas bombas de gasolina começou a engrossar na sexta-feira, mas já ao longo da passada semana os combustíveis começaram a rarear em alguns postos de abastecimento (PA).
Por toda a cidade começaram a surgir as habituais placas com os dizeres "Não há gasolina", ou "não há gasóleo" ou, nas piores situações "Não há gasolina nem gasóleo", com os respectivos cones laranja e brancos em frente às mangueiras das bombas.
Sexta-feira, pela hora da saída do trabalho, foi um caos enorme gerado pela circulação de milhares de viaturas em busca de um PA com combustível, e hoje, se não surgir uma solução de emergência, a situação deverá repetir-se ao final do dia, porque, entretanto, são cada vez menos os PA com gasolina ou gasóleo e cada vez menos os carros com combustível nos depósitos.
Ainda no comunicado da Sonangol enviado às redacções é explicado que a esmagadora maioria dos combustíveis consumidos em Angola são comprados no exterior em divisas e são vendidos no território nacional em Kwanzas, tendo esses valores atingido, só no primeiro trimestre deste ano, mais de 221,4 milhões de dólares.
No documento, a empresa explica ainda esta falha no abastecimento com avarias nos navios de cabotagem que transferem os combustíveis para terra, ou o mau estado das estradas e as condições climatéricas.
A empresa avança, no entanto, que a resolução do problema já está em curso - o comunicado é de Sábado - e há combustíveis importados em processo de descarga para serem distribuídos.
A petrolífera nacional, referindo-se a este problema sentido nas províncias do sul do país, informa que foram feitos testes aos combustíveis que revelaram inconformidades, o que levou a Sonangol Logística a retirar o produto dos postos de abastecimento.
O fim anunciado dos subsídios
Duas novas refinarias, recorde-se, estão em fase de lançamento em Angola, uma em Cabinda, com capacidade para 70 mil barris de crude bruto refiando por dia, e a do Lobito, com 200 mil barris diários de capacidade.
Mas, como o Fundo Monetário Internacional (FMI), já veio dizer de forma clara, o maior problema de Angola nesta questão resulta dos gastos avultados com a subsidiação dos combustíveis via Sonangol, estando em curso um processo de retirada desses mesmos subsídios pelo Estado para que o mercado se possa regularizar.
Isso mesmo foi dito pelo Ministério dos Recursos Naturais e Petróleo (MIREMPET), no mês passado, ao anunciar que a subvenção aos combustíveis, que permite manter em Angola o preço da gasolina e do gasóleo muito abaixo do preço de mercado, vai cair até meados de 2020.
Esta decisão do Executivo, que, como o NJOnline explica aqui, é uma exigência do FMI com vários anos, vai ser aplicada quando, em Junho de 2020, entrar em vigor o novo modelo de importação de derivados do petróleo, que liberaliza a importação da gasolina e do gasóleo, o que deverá gerar uma profunda alteração nas regras que hoje garantem o preço fixo nos postos de abastecimento.
Num comunicado do MIREMPET é ainda avançado que esta decisão foi transmitida pelo ministro Diamantino Azevedo, num encontro que manteve, na ltura, com a Comissão Interministerial de Acompanhamento do Reajustamento da Organização do Subsector Petrolífero (CIAROSP).
Nesse encontro, que teve como objectivo manter os operadores actualizados sobre a reestruturação do sector, o ministro disse aos empresários que "a liberalização da importação de derivados vai acontecer assim que for retirada a subvenção aos combustíveis".
Quanto às "políticas, princípios, objectivos, procedimentos e desenvolvimento integrado e eficiente do conteúdo local no sector petrolífero angolano", o ministro, segundo o Gabinete de Comunicação do MIREMPET, explicou que o Projecto de Decreto Presidencial que vai redefinir estas regras "será submetido à consulta pública em Maio deste ano".
A ideia de proceder à liberalização total do mercado de importação de derivados de petróleo foi avançada primeiramente em 22 de Novembro de 2018 pelo então secretário de Estado dos Petróleos angolano, Paulino Jerónimo, actual presidente da Agência Nacional de Petróleo, Gás (ANPG), em que indicou que seria aberta às empresas petrolíferas interessadas no negócio.
"Vamos liberalizar totalmente para que entrem outras empresas distribuidoras de derivados de petróleo", afirmou na ocasião Paulino Jerónimo, realçando que a Sonangol, por decisão do Governo, não é a detentora do monopólio.