Analisemos o contexto: o Partido-Estado que se constituiu pela força das armas em 1975, e que se deveria democratizar a partir de 1992, consolidou, a partir de 2002, a sua matriz autoritária e, por via da acumulação primitiva de capital, apoderou-se da riqueza do país e estabeleceu uma democracia tutelada que realiza eleições cosméticas, não competitivas para se manter no poder, utilizando nesse processo formadores de opinião para manipular a opinião pública e justificar os vícios dos processos e dos resultados eleitorais.

É nesse quadro que encaixo a tese, ora veiculada por Ismael Mateus, segundo a qual "a opção de fazer do discurso da fraude a principal linha discursiva da UNITA tem-se revelado um tremendo erro: em vez de discutirmos os problemas da governação e as alternativas, debatem-se os permanentes ataques ao registo eleitoral, as dúvidas sobre a boa índole da CNE e todo o clima geral de suspeição".

Ora, de nada nos vale discutirmos as alternativas às políticas de governação se não criarmos na prática a possibilidade real de haver alternativa. Considero que, para a esmagadora maioria dos angolanos, a eleição de Agosto não é tanto sobre programas de governo, mas sobre a formalização da rejeição do regime, que já ocorreu no íntimo de cada um.

Os militantes do MPLA sabem perfeitamente que sem fraude o MPLA não passa. Por isso, procuram distrair o povo com a chamada "pré-campanha" enquanto executam a mentira e a fraude por via da CNE. Não se trata portanto, do "discurso da fraude". Trata-se sim do discurso da "verificação dos factos" para impedir grosseiras violações à lei, porque são elas que ditam os resultados eleitorais cozinhados na Cidade Alta e que amiúde são anunciados pela CNE, cabendo apenas aos comunicólogos, "independentes" e "analistas" do Partido-Estado arranjar os argumentos para justificá-los e preparar a opinião pública para aceitá-los como "credo" ou "acto de fé".

Eu prefiro verificar os factos: No passado dia 9 de Maio, numa reunião com os líderes dos partidos políticos, a CNE mentiu e foi desmascarada por um dos seus membros. Ficou claro ali mesmo que a acusação que lhe fora feita dias antes em conferência de imprensa tinha fundamento: o caderno de encargos que integra um dos contratos que a CNE pretendia assinar no dia 8, para o desenvolvimento de uma solução tecnológica para a transmissão dos resultados eleitorais, não está em conformidade com a Lei, é um fundamento da fraude programada, não uma canção.

A Lei impõe dois fluxos de informação: um para o apuramento provisório e outro para o apuramento definitivo.

(A opinião de Mihaela Webba pode ser lida na íntegra na edição semanal do Novo Jornal, nas bancas, ou em formato digital, cuja assinatura pode pagar no Multicaixa)