Vivemos tempos de metamorfoses políticas vulcânicas. Aqui e lá fora. Vivemos tempos que estão a dar lugar, aqui dentro, ao nascimento de novos movimentos sociais que não se constroem inspirados em dogmas partidários.

Vivemos tempos de dinâmicas incompatíveis com o descompasso da selecta agremiação que assentou arraias sobre vários tentáculos dos poderes em Angola.

Vivemos tempos que estão a dar lugar ao nascimento de movimentos que estão a nascer do pulsar das ruas, da explosão de emoções, do apelo a novos voluntarismos e do içar da bandeira do populismo.

Vivemos tempos de abate público do enriquecimento ilícito, de hinos à democratização da distribuição da renda nacional e de cobrança de mais e melhor educação e ensino, mais e melhor emprego e mais e melhor habitação.

Vivemos e sentimos o crescendo destes hinos e destas cobranças porque vivemos tempos "de pobreza e mais desemprego". Vivemos tempos que nos fazem sentir que "os poderes estão distantes dos cidadãos".

E que, comunicando "com eles pelas redes e pela televisão, ficam com a ideia de que são amados ou entendidos porque acham que são populares."

Vivemos tempos de cólera para uns, mas, para quem os tempos são radiosos, "nunca se passa nada e o que se passa, fica escondido". Vivemos tempos em que "muitos deles se esqueceram há muito do que é a vida normal ( e por isso) não vivem sem estarem acompanhados por um séquito de assessores, consultores, cortesãos e criaturas de gabinete, que lhes medeiam a vida publica".

Mas, como vivem enclausurados em redomas de vidro, "esquecem-se de que quase toda a vida é pública". Disfarçados de homens sérios e comprometidos, "adoram ser tratados como príncipes e estarem permanentemente no púlpito"...

Com estes príncipes escondidos no armário, o Presidente trouxe-nos tempos de esperança, mas a dinâmica dos novos tempos rapidamente se encarregou de destapar a crise de pessoas, de valores e de ideais que envolve e aniquila a nossa sociedade.

Vivemos tempos de esperança que se estão a esfumar, agora, ante a cólera da irracionalidade política e de um radicalismo estreito, que se estão a revelar altamente nocivos à inevitabilidade da despoluição do ambiente político que nos rodeia.

Vivemos tempos de precariedade, que, estando a tomar conta do dia a dia, não podem tornar-se no nosso modo de vida. Vivemos tempos de protestos, mas os movimentos sociais que os desencadeiam, em vez de serem hostilizados pelo poder das baionetas, precisam de ver atendidas as suas inquietações e o seu descontentamento.

Vivemos e haveremos de continuar a viver tempos de protestos que existirão sempre que as vítimas das injustiças sociais se sintam excluídas, como por aqui se sentem cada vez mais largas franjas da população.

Se a substituição do antigo elevador social que, durante décadas, nos provocou danos colossais torna incontornável e inadiável a descompressão social e a instauração de um clima de descomplexado debate económico, este desafio não pode, porém, deixar de ser visto em primeiro lugar como um desafio de natureza política.

É certo que há ressentimentos nos protestos, mas é preciso diagnosticar as razões que estão na origem da reivindicação da mudança sem cair na tentação de ceder a uma deriva autoritária, que se arrisca a perder espaço e a mergulhar num terreno demasiado movediço.

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