A referida negociata terá rendido milhões a Edeltrudes Costa, ministro de Estado e director do Gabinete do Presidente João Lourenço, num caso que consubstancia crimes de corrupção, desvio de fundos e tráfico de influência.

Passadas mais de três semanas da divulgação do mais grave escândalo de corrupção do consulado de João Lourenço, nenhuma palavra do todo-poderoso Edeltrudes Costa, ao que tudo indica o novo DDT (Dono Disto Tudo) Angola, tal é a impunidade de que goza ou a indestrutível aliança com o PR, para o bem e para o mal.

Na reportagem da TVI, é explicada detalhadamente a forma ardilosa como uma empresa de consultoria de Edeltrudes Costa se envolve num negócio cujo objectivo era a modernização dos aeroportos angolanos.

Este terá rendido várias dezenas de milhões de euros em contratos públicos, autorizados pelo chefe de Estado angolano, em adjudicação directa, sem qualquer concurso.

Parte dos fabulosos lucros (milhões de dólares) terá servido para o "braço direito" de João Lourenço comprar sumptuosas casas em Sintra e Cascais, na região da Grande Lisboa.

De acordo com a investigação televisiva, o homem de confiança do Presidente angolano aparece em vários negócios milionários com o Estado, sendo apontado como titular de uma conta à ordem com mais de 20 milhões de euros, em Portugal.

O que se esperava de Edeltrudes Costa, que sempre desempenhou funções políticas, é que, para além de um cabal esclarecimento do caso, colocasse imediatamente o seu lugar à disposição, em nome da ética republicana e/ou pelo menos por Amor à Pátria angolana, que jurou servir.

Se o silêncio de Edeltrudes Costa é repugnante, a inacção do seu chefe perante este escândalo que o descredibiliza interna e externamente, num momento em que sua popularidade está em níveis baixissimos, cria muita perplexidade.

Tal é o enfático poder de Edeltrudes Costa que o Presidente, ao defender, com o seu silêncio, a manutenção do seu "braço direito" no gabinete, demonstra que a sua própria sobrevivência política poderá estar indexada ao novo DDT Angola.

Se a sobrevivência política do mais alto servidor público do País estiver indexada a alguém indiciado de crimes de colarinho branco, significa que a decência política já terá caído na sarjeta.

Compreende-se que Edeltrudes Costa, com o nome enlameado desde o consulado anterior, não tenha percebido que o leopardo quando morre deixa a sua pele e os seres humanos, a sua reputação.

Percebe-se isso pela sua falta de sentido republicano. O que é impossível de compreender é como o PR permite que o seu nome, função e País sejam achincalhados e arrastados para esse nauseabundo charco lamacento.

Será que, como afirma o activista Luaty Beirão, João Lourenço não poderia descartar o seu homem, porque o mesmo teria de o arrastar ao fogo, num caso de «piromanias e marimbondagens palacianas»?

Em época de avanço dos populismos que tem como discurso central a moralização da sociedade, um certo saneamento daqueles que consideram como os inimigos da "moral e bons costumes", a inacção do Presidente de Angola torna-o cúmplice de um dos actos contra o qual ergueu o seu estandarte.

É bom recordar que, ao tomar posse, há três anos, como timoneiro do País, João Lourenço reconheceu que "a corrupção e a impunidade têm um impacto negativo directo na capacidade de o Estado e os seus agentes executarem qualquer programa de governação".

Feito o diagnóstico, convocou os angolanos a trabalharem "em conjunto para extirpar esse mal que ameaça seriamente os alicerces da nossa sociedade".

Com esse acto de protecção do seu "braço direito", Lourenço transforma as suas próprias declarações em mera demagogia.

A atitude sintonizada de Edeltrudes Costa e de João Lourenço é um pedregulho na defesa da justiça como elemento central da construção de uma sociedade democrática.

E vai contra o próprio Chefe de Estado angolano que no aludido discurso de investidura afirmou: "Ninguém é rico ou poderoso demais para se furtar a ser punido, nem ninguém é pobre demais ao ponto de não poder ser protegido".

Num paradoxo típico das autocracias, as primeiras vítimas desse escândalo, como é apanágio dos detentores do Poder, são a comunicação social e outros alicerces da construção de um Estado Democrático.

Criaram-se manobras de diversão e actos de perseguição com o reforço daquilo a que Salambende Mucari chama de "CAP Digitais", que abundam nas redes sociais, impregnados de jornabófias, com a missão de vigiar, enxovalhar, ameaçar os críticos da governação do actual poder e os denunciantes dos escândalos de corrupção que envolvem familiares e/ou colaboradores dilectos do Presidente da República.

Para além disso, há também a proibição de divulgação de matérias jornalísticas ou de opinião sobre o Edeltrudes Leaks, como aconteceu há dias com o "Directo ao Ponto" da intervencionada TV Zimbo, rubrica de grande audiência do jornalista e economista Carlos Rosado de Carvalho, uma das vozes incómodas para o poder político.

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