Velha

"Cinco e meia da manhã

Sol ainda não nasceu mas a velha se levanta

Na esperança de encontrar um amor que já perdeu

E a vida que não teve

Seis e meia da manhã

Vai buscar a roupa suja para esfregar num tanque velho

Suas mãos já calejadas

Relembram mágoas passadas e manhãs de outros tempos

Sete e meia da manhã

Sai a kota já na rua para por o pão na mesa

Me acorda devagar me diz pra me ir lavar

Pra tomar meu matabicho

E aí o bicho acorda e começa a chorar

Vou chamando a minha velha para vir-me ajudar

A botar uma camisa que me custa a entrar

Vou chamando a minha velha para vir-me ajudar

E ela chega carinhosa tira a dor da minha alma

Me pede só para ter calma que ela também está cansada

Saio de roupa lavada pra brincar com meus amigos

Enquanto ela cochilava junta à porta do quintal

E o tempo foi passando

Seus mauindos implorando para ver se ela parava

Ela sempre ignorando foi seguindo trabalhando

Sem perder sua alegria

Sexta-feira sete horas

Bate-papo com a vizinha lembra das suas malambas

Recordando ardentemente um passado bem recente

Tempos de menina e moça

Hoje acorda oito e meia

Frio na terra distante minha velha está cansada

Lembra do antigamente do calor das cinco e meia

Hora que ela levantava

E aí eu chego perto e lhe faço um carinho

N"gana Zambi a minha velha que mudada que ela está

Seus olhos olham distantes e começam a chorar

Eu abraço a minha velha para não chorar sozinha

Conto então velhas histórias que a velha tinha contado

Cochilando nos seus braços eu recordo o meu passado"

Paulo Flores