Já que a realidade, dura, implacável e inegável, continua a subsistir, para gáudio e aproveitamento de uns quantos, cuja prática de vida é, há décadas, diametralmente oposta aos seus discursos e intervenções públicas e partidárias.

A grave regressão civilizacional, que se vai verificando um pouco por toda a parte deste mundo, não consegue esconder alguns aspectos óbvios que se tornam mais interessantes ainda por se estarem a verificar num momento em que a Igreja Católica, instituição conservadora e serôdia por regra e tradição, tem à sua frente, o mais aberto, democrata e humanista "chefe" de que há memória, provavelmente só comparável a João XXIII.

Em boa verdade, têm sido do Papa Francisco, e na linha dos já septuagenários co-criadores da Teologia da Libertação, as mais veementes intervenções na linha da urgência do reforço da uma efectiva libertação das mulheres.

É verdade que, aqui e ali, na América do Sul - apesar de, neste final de mandato de Barack Obama, ser cada vez mais clara a intervenção dos Estados Unidos e das oligarquias de direita e de extrema-direita a tentarem inverter o quadro daquela região, a fim de o recolocar ao serviço do imperialismo, utilizando outros métodos que já não os golpes de estado militares - ainda se assiste à manutenção de alguns dos direitos conquistados pelas mulheres.

Mas é, claramente, no nosso continente onde se verifica a constância nos recuos sistemáticos dos seus direitos, via da regra pela ligação dos poderes políticos a igrejas, seitas e gente normalmente criminosa, que assenta a sua acção no esbulho do pouco dinheiro das populações miseráveis e na defesa da manutenção do papel subserviente da Mulher.

Uma das queixas que nos tem chegado com alguma regularidade, quer no que diz respeito ao partido no poder, quer aos partidos de oposição, tem a ver com um recuo real, no que diz respeito ao acesso das mulheres a cargos elegíveis, a todos os níveis.

Já ninguém tem a coragem de discutir - pelo menos os que ainda conseguem manter alguma seriedade intelectual - as aptidões do sexo feminino, desde a capacidade de mais rapidamente conseguir descortinar determinadas pulsações até ao seu pragmatismo, de longe superior ao dos homens, fruto de terem sobre os ombros - qualquer que seja o extracto social a que pertencem - o peso de responsabilidades das mais diversas, a maior parte das quais jamais constituem "problemas" dos homens.

A ausência das mulheres em funções de poder real, de poder efectivo, o seu aparecimento, as mais das vezes em funções a maior parte das vezes decorativas, não se coadunam, no mínimo, com os programas partidários que nos são apresentados, pelo menos para consumo público.

E, francamente, com o sem-número de aspectos em que a sociedade angolana já retrocedeu, cuja justificação não pode ser apresentada em nome de nenhuma crise que não seja um machismo estrutural e um aparente complexo de superioridade só explicável pelo pavor de ver as mulheres ascenderem a altas funções da Nação, era o que mais faltava também no domínio das questões do género estarmos a assistir a um retrocesso sério, conservador e, no mínimo, permitido, nem que seja pela via do silêncio.

É urgente dar mais espaço à Mulher na nossa sociedade. É obrigatório fazê-lo. Na linha dos compromissos assumidos com toda a população angolana, a maior parte ainda por cumprir.

De que têm medo os políticos e politiqueiros de uma praça tão pobre, tão indigente como a nossa, qualquer que seja o ângulo de observação: político, cultural, ético, moral e ideológico?