Quando a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP), reunidos em Viena de Áustria, decidiram cortar a produção em 1,2 milhões de barris por dia (bpd), para 32,5 milhões bpd, o efeito nos mercados foi imediato, passando, a subir, em Londres, os oito por cento e um valor muito próximo em Nova Iorque (WTI).

Mas este era o resultado esperado e já anunciado como quase garantido pelas agências económicas; já a adesão aos cortes da Rússia, o terceiro maior produtor mundial, e de outros países onde Moscovo mantém forte influência, como o Cazaquistão e o Azerbaijão, não era um dado adquirido. É-o agora e o efeito foi outro impulso no preço do barril, estando já acima dos 55 USD.

No entanto, estes cortes são para vigorar no arranque de 2017, onde se vai ver, efectivamente, quanto valem como alavanca para elevar o preço do barril, sendo que alguns especialistas admitem que possa chegar rapidamente aos 65/70 USD, para depois corrigir em baixa, mantendo-se na casa dos 60 USD, se a economia mundial não for fustigada por nenhum golpe inesperado.

Este dado novo, o encontro entre os países da OPEP e os não-membros, que já terá tido hoje uma reunião prévia preparatória mantida em segredo, deverá ocorrer, segundo a Bloomberg, no próximo Sábado e isso, como se pode ler nos sites especializados, não deixará de ter um forte impacto no preço do barril, porque é a confirmação de que os principais países do Cartel, Arábia Saudita no topo da lista como o maior produtor mundial (acima de 11 milhões bpd), estão decididos a tudo fazer para elevar de forma sustentável o preço da matéria-prima.

OPEP parece não estar para brincadeiras, mas...

A verdade é que a OPEP não tinha um momento de glória como o da passada quarta-feira há muitos anos e já poucos se lembravam do poder que este cartel do "ouro negro" teve em tempos idos, como nas décadas de 1970 e 1980, quando uma ameaça de corte ou subida na produção fazia a economia mundial pôr-se em sentido.

A razão para isso é simples: há 40 anos, a OPEP dominava quase em absoluto a produção mundial de petróleo, o que lhe dava poder de influenciar o rumo da economia mundial, como na célebre crise de 1973/74, quando provocou uma subida de mais de 400 por cento do preço do barril.

Cenário que hoje não existe. A OPEP "só" controla cerca de 40 por cento da produção diária de petróleo e tem os três maiores produtores - Arábia Saudita, Irão e Iraque - em permanente conflito, precisando, para ganhar capacidade de influência, do apoio da Rússia, o terceiro maior produtor mundial, com 10 milhões de barris por dia (bpd), atrás dos EUA, com cerca de 10,5 milhões bpd e dos sauditas, que ultrapassam os 11 milhões.

E foi o que aconteceu ontem. A Rússia tinha avisado que só se juntaria à OPEP se o cartel acabasse com as "criancices" que teimosamente impediam um acordo. Aconteceu quando a Arábia Saudita admitiu que o Irão, sujeito a embargos internacionais até há pouco tempo, mantenha em crescendo a sua produção até que alcance antigos números.

A questão para o mundo é que, com a Rússia ao lado, a OPEP volta a ter músculo e o mundo sabe que o "consórcio" tem agora poder para abanar tudo com um murro na mesa.

É por isso que os mercados foram logo aos cofres tirar dinheiro para pagar o barril a mais 10 por cento que no início desta semana, com o Brent (referência para o crude angolano) a bater nos 50 USD, tal como o nova-iorquino WTI.

Mas... admitindo que o acordo pode equilibrar o mercado, o antigo ministro do petróleo saudita, Ali Al-Naimi, avisou que é preciso ter cuidado porque o cartel e os seus membros "tendem a aldrabar" nas contas.

E como foi possível, afinal?

O que dizem os analistas para justificar este acordo que, diga-se em abono da verdade, poucos anteviam como sendo, afinal, fácil de alcançar?

Numa primeira ordem de razões está a questão da fragilidade das economia dos países membros e da Rússia, com défices acumulados que não são brincadeira, alguns deles provocados por máquinas que alimentam guerras, como é o caso da Rússia e da Arábia Saudita, com a Síria e o Iémen em pano de fundo, a pondo de Riade ter registado um défice nas suas contas públicas como não acontecia há muitos anos.

Sabe-se que o mercado petrolífero é de grande melindre e os investidores pensam a longo prazo mas os consumidores estão sujeitos às continhas do dia-a-dia e os exportadores, com economias de rastos, como a Venezuela ou a Nigéria, ou mesmo, embora em menor escala, Angola e a Rússia (não membro da OPEP), olham para as tabelas de preços ao segundo.

Recorde-se que há umas semanas, um importante estudo da consultora Mackenzie lembrava que os baixos preços tinham provocado uma quebra no investimento na procura de novas reservas, o que, em efeito bola de neve, tinha levado ao esvaziamento das existentes, e que isso iria desembocar numa diminuição da oferta equilibrando em breve com a procura e, em cinco a seis anos, levando a que a procura seja muito superior à oferta, o que terá como consequências uma nova explosão de preços, podendo mesmo ser semelhante à de 2008, quando o barril bateu nos 147 USD...

O que se pensa é que, perante todo este cenário, o melhor será mesmo ir aumentando os preços já para evitar explosões incontroláveis de preços em poucos anos, o que permitirá às multinacionais voltar à busca por novos blocos e investir nos que já existem mas que são muito caros, como os no pré-sal ou no terrível e altamente poluente "fracking" norte-americano, que usa água a grande pressão para retirar petróleo e gás da rocha de xisto a grande profundidade, mas que só é viável a partir dos 60 a 70 USD por barril.

Mas as cautelas são ainda necessárias por outra razão... é que os preços actuais, já com o aumento pós reunião de Viena, ontem, são apenas iguais aos que existiam quando em Setembro, a OPEP tinha admitido cortar a produção, na reunião de Argel.

A diferença é que em Setembro, estava em cima da mesa um corte de 750 mil bpd, apenas metade do excesso de produção mundial, e agora, com o apoio da Rússia, a produção pode ser cortada em 1,8 milhões de bpd, somando os 1,2 milhões de corte da OPEP e os 600 mil da Rússia (300 mil) e de eventuais outros aderentes, o que ultrapassará o excesso de produção actual.

Quem corta o quê?

Segundo a Reuters, e como era de esperar, a Arábia Saudita terá a fatia maior nos cortes, com meio milhão de bpd e os seus vizinhos do Golfo, Qatar, Kuwait e Emirados 300 mil em conjunto.

O Iraque vai diminuir 200 mil bpd, a Rússia, como já se disse, 300 mil bpd e o Azerbaijão e o Cazaquistão admitiram chegar aos 300 mil, embora estes números possam sofrer alterações.

Angola é um dos países que pode ganhar muito com este acordo, porque apenas lhe é exigido que corte 87 mil bpd, número relativamente pequeno e potencialmente recuperável com o aumento do preço por barril da remanescente produção, à volta dos 1,7 milhões bpd.

Só para se ter uma comparação, na África produtora de petróleo, a Argélia, cortará 50 mil bpd, o Gabão 9 mil. Já a Nigéria, o maior produtor africano vai poder manter a produção intacta justificando isso com os prolongados ataques das guerrilhas no Delta do Níger, a sua grande região produtora, como se explica aqui.