Em Portugal há quatro anos, neste momento a fazer uma pós-graduação na área de gestão, Isaura Sakaita, uma das filhas de Jonas Savimbi deu, ao semanário Expresso, um testemunho raro sobre o homem que fundou a UNITA.
"Era um pai amoroso, mas também gostava muito que os filhos fizessem as coisas muito corretas e direitas com a escola. Não facilitava asneiras", conta a herdeira do antigo guerrilheiro, morto a 22 de Fevereiro de 2002, no Moxico.
Quinze anos após o desaparecimento do ex-líder da UNITA, Isaura, recorda a última vez em que o viu, tinha apenas 10 anos e estava adoentada.
"Largou o que estava a fazer para vir ter connosco. Estivemos ao colo dele, perguntou-me se estava melhor e pediu a alguém para nos dar de comer. Não durou muito tempo, mas brincámos, e ele foi alegre como sempre. Parecia um encontro como todos os outros", relata ao jornal luso, desfiando o álbum de memórias privadas.
"Há uma diferença entre o Savimbi militar e o Savimbi pai de família", sublinha, de volta às recordações da infância: "Sabia que havia qualquer coisa que era diferente, porque andávamos sempre com segurança. E eu percebia que o meu pai era quem mandava na UNITA".
Entre a imagem pública e o retrato íntimo do fundador do "Galo Negro", Isaura revela que o pai "não era uma pessoa de cara trancada, 24 horas por dia, sem querer saber de ninguém. Era uma pessoa que se emocionava quando a família se juntava toda nos anos dele e no Natal".
Para além dos momentos de comunhão familiar - "Às vezes, passava em casa muito tarde, dizia que não tinha tempo, só podia naquele dia, e a minha mãe acordava-nos" -, a herdeira de Savimbi recupera a relação de pai para filha.
"Não gostava de me ver de calções muito curtos nem que usasse postiços no cabelo. Tinha muito bom humor, ria-se imenso e dava muitas gargalhadas. Mas nunca brinquei com ele", diz.
A estudante, cuja universidade é custeada pela UNITA, recorda também que só depois de mudar do Bié para Luanda - após a morte de Savimbi - é que se convenceu do falecimento do pai.
"Chorava imenso. Principalmente quando vi a fotografia dele morto, na capa de um DVD que os miúdos vendiam na rua. Fiquei revoltada, como é possível divulgarem aquela fotografia, dele morto, como uma coisa boa?".
Apesar da revolta inicial, Isaura garante que vive em paz com a sua herança. "Sou uma pacifista, mas o espírito de luta fica", garante, defendendo que uma guerra não há vencedores.
"Todos perdem. Eu também perdi o meu pai, e ele perdeu a vida".