Com uma demonstração de resiliência às adversidades dos mercados financeiros, que muitos analistas não esperavam, o sector petrolífero tem imposto a sua geoimportância na economia global, mesmo que com a ajuda da OPEP+ e dos seus membros, que têm manifestado disponibilidade para reduzir a produção sempre que isso for necessário para manter o equilíbrio nos mercados.

Alias, os valores que hoje mostram os gráficos dos mercados internacionais são ainda fruto da arrojada decisão tomada em 2022 pelo "cartel" que, desde 2017, agrega os Países Exportadores (OPEP) a um grupo de desalinhados encimado pela Rússia para defenderem os interesses dos produtores, quando retirou 2 milhões de barris por dia (mbpd) à sua produção global.

Ao mesmo tempo, a Rússia, acossada há um ano pelas gigantescas sanções impostas pelos países ocidentais, EUA e União Europeia à frente, especialmente sobre o seu sector exportador de energia, devido à invasão da Ucrânia em Fevereiro de 2022, tem feito anúncios de cortes na produção com alguma ligação ao crude e gás que deixou de enviar para a Europa ocidental, mesmo que tenha encontro a oriente, China e Índia, principalmente, alternativas robustas.

Mas o que importa é que esta disponibilidade de acção permanente por parte da OPEP+, onde a Arábia Saudita e a Federação Russa se têm imposto com histórica solidez contra a pressão dos EUA e dos europeus, e de alguns membros do "cartel" mais influenciáveis pelas potências ocidentais, tem sido a garantia de que nem as mais arrojadas acções, como foi a libertação de centenas de milhões de barris das reservas estratégicas norte-americanas, estão a conseguir fazer sair o valor da matéria-prima da zona de conforto definida pelo eixo Moscovo-Riade.

É assim que o barril de Brent, a referência principal para as ramas exportadas por Angola, esta segunda-feira, perto das 11:20, hora de Luanda, estava a valer 75,61 USD, mais 0,85% que no fecho de sexta-feira, mantendo-se, ainda que sempre na corda bamba, como, de resto, vem sucedendo nas ultimas duas semanas, ligeiramente acima do valor de referência com que o Governo de João Lourenço elaborou o Orçamento Geral do Estado para 2023.

Todavia, como a Reuters destaca esta manhã de segunda-feira, 27, os mercados petrolíferos mantém um olho fixado nos vizinhos mercados financeiros, porque, se é verdade que estes estão a aguentar bem, bastante melhor que o esperado, os embates da queda do Silicon Valley Bank e Signature Bank, nos EUA; depois o socorro feito pela UBS ao Credit Suisse, num movimento que despertou receios de uma nova crise global semelhante à de 2008, quando caiu o norte-americano Lehman Brothers, as dúvidas estão longe de estar dissipadas.

Especialmente depois de no fim da passada semana, o gigante alemão Deutsche Bank, "demasiado grande para cair - too big to fall", ter vacilado de forma assustadora, com uma queda de dois dígitos no valor das suas acções, numa das réplicas mais sentidas pelos investidores do terramoto com epicentro no Credit Suisse, comprado, como uma boia de salvamento, pelo gigante UBS, por ordem do Governo helvético e contra uma boa parte dos seus accionistas.

Analistas citados pela Reuters admitem que o comportamentos dos mercados petrolíferos vai depender da tradução que estes fizerem do momento vivido nos mercados financeiros, porque actualmente é a volatilidade que se impõe, especialmente se surgirem sinais, ao longo do dia, de que podem surgir novos solavancos no gigante alemão, porque isso poderá, segundo alguns analistas, dar origem a uma sucessão de episódios que podem desaguar numa crise semelhante à de 2008 e de novo com origem no instável mercado financeiro norte-americano.

Os analistas estimam mesmo que o petróleo Brent não vai voltar aos números do início do ano, acima dos 85 USD, até que as nuvens negras que pendem sobre o sector bancário internacional não estiverem totalmente diluídas.

E essa diluição das ameaças está quase integralmente dependente das medidas tomadas e a tomar pelas autoridades nacionais reguladoras, seja a Reserva Federal norte-americana, seha o Banco Central Europeu, disponibilizando apoio às instituições financeiras em apuros, seja na redução dos aumentos das taxas de juro directoras, que estão a ser feitos há meses para combater a histórica inflação que emergiu do contexto de guerra na Ucrânia...

O comportamento instável do petróleo é ainda resultado das evidentes dificuldades de Governos e bancos centrais das grandes potências ocidentais para conter a inflação, que permanece há meses em níveis historicamente elevados, e a recessão que já está entranhada nalguns países, na condição de ameaça ou efectiva, como a Alemanha e a Suécia.

Para Angola, que é um dos produtores e exportadores que mais dependem da matéria-prima em todo o mundo, devido à escassa diversificação económica, este momento dos mercados, apesar de a casa dos 70 USD satisfazer as necessidades básicas do Estado, está aquém do necessário para que o país possa realizar a necessária transformação económica libertando-se da dependência do crude, mesmo que tal venha a verificar-se nos últimos anos, se bem que menos que o desejado.

... com o barril a valer pouco mais de 75 USD, o Governo angolano volta a estar encostado à parede no que diz respeito a uma possível revisão do OGE 2023, se os mercados não conseguirem estabilizar no preço actual ou acima desta fasquia.

Este cenário é especialmente importante para Angola porque ainda depende em grande medida do seu sector energético, considerando que o crude representa mais de 90% das suas exportações, perto de 30% do PIB (tem vindo a descer nos últimos anos o peso do sector) e mais de 50% das receitas fiscais do Estado, sendo certo que o sector do gás natural já é uma importante fonte de receitas, superando mesmo o diamantífero.

Aliás, o Governo de João Lourenço, que elaborou o seu OGE para 2023 com um preço de referência para o barril nos 75 USD, tem ainda como motivo de preocupação a divulgação em Novembro de 2022 de um relatório da consultora Fitch Solutions, onde se antecipa uma redução da produção de petróleo na ordem dos 20% na próxima década, com origem no desinvestimento em toda a extensão do sector, deste a pesquisa à manutenção, quando se sabe que o offshore nacional, com os campos a funcionar, está em declínio há vários anos devido ao seu envelhecimento, ou seja, devido à sua perda de crude para extrair.