Se desde o início de 2020 os membros da OPEP+ não se sentavam fisicamente à mesma mesa devido ao Sars CoV-2, o que volta hoje a suceder, também desde Março desse mesmo ano que não ocorria um corte na produção do "cartel" tão robusto como aquele que se adivinha para hoje ao final da tarde.
Segundo algumas fontes, a organização liderada pela Arábia Saudita e pela Rússia, pode mesmo chegar a uma redução diária na sua produção de 1 milhão de barris por dia (mbpd) - algumas fontes falam mesmo em 2 mbpd - como forma de garantir que a esperada e crescente crise na economia global, com inflação a bater recordes na Europa e nos EUA, e a recessão a espreitar já com a cabeça toda de fora, não venha a criar o mesmo terramoto que a pandemia da COvid-19 que, recorde-se, em Abril de 2020 levou o barril a ser comercializado a uns incríveis 40 USD negativos, ou seja, mesmo pagando 40 USD por barril, ninguém queria ficar com a matéria-prima.
Mas, mesmo que esta quebra na produção venha a ser menos expressiva, em resultado da reunião de hoje, em Viena de Áustria, o pânico já está a tomar conta dos governos das grandes economias ocidentais - a China e a Índia temem menos este movimento porque contam com o petróleo russo em grande quantidade e vendido com grandes descontos devido às sanções em vigor por causa da guerra na Ucrânia - porque a inflação e o risco de recessão que lhes está a corroer as economias é resultado directo do aumento brutal da energia, especialmente gás e crude.
A CNN, canal de notícias norte-americano, noticiou que o Presidente dos EUA, Joe Biden, perante esta possibilidade de um novo e proeminente corte na produção pela OPEP+, reuniu de emergência a sua Administração e colocou no terreno todo o pessoal disponível para procurar, junto dos países membros, influenciar de forma a reduzir ao máximo os danos que um eventual corte robusto vão provocar de imediato.
Os EUA atravessam um período dramático devido ao refluxo das sanções aplicadas pelo ocidente à Rússia, com uma inflação a bater recordes de 40 anos, e com o risco - alguns analistas admitem ser já irreversível - de uma recessão ao virar da esquina, quando se aproximam rapidamente as eleições de meio-termo, a 08 de Novembro próximo, onde Joe Biden, que já se sabe que vai voltar a concorrer em 2024, será testado de forma como há muitos anos não ocorre, prejudicado que está fortemente pela condição decrepita da economia norte-americana, que o pode levar a perder as maiores no Senado e na câmara dos Representantes, o que seria um rude golpe nas suas aspirações.
Mas o mesmo sucede na Europa ocidental, onde alguns países, como a Alemanha, o motor da economia europeia, está a observar uma fragilização permanente da sua economia devido aos elevados custos da energia, especialmente, o gás oriundo da Rússia, do qual depende grandemente para manter viva a sua poderosa indústria, mas também do crude, estando Berlim "entalada", como, de resto, Washington, entre a urgência de aliviar o peso das consequências da guerra na Ucrânia e o refluxo do apoio substantivo político e militar a Kiev no seu esforço de guerra contra a Rússia.
O barril de crude tem vindo, esta semana, já por causa das fugas de informação que apontam para uma redução substantiva da produção da OPEP+ a definir hoje, a valorizar de forma impressiva, saindo do buraco dos 84 USD em que afundou em finais de Setembro, estando o Brent, em Londres, hoje, a valer, perto das 11:20, hora de Luanda, 91,52 USD.
Mas os analistas não duvidam que se se confirmar o corte da OPEP+ pela fasquia mais alta, perto de 1 mbpd, o barril será catapultado para cima dos 100 USD, e mesmo além disso, podendo abeirar-se deste patamar se o corte for menos pronunciado.
A componente política desta reunião da OPEP+ é outra faceta a ser observada porque em Washington, segundo os media norte-americanos, Biden & Co. estão a olhar para a situação a partir de uma atitude hostil de Moscovo e Riade, dois países a atravessar as mais difíceis e complexas relações com os EUA, a ponto de o Presidente norte-americano ter visto o príncipe saudita Mohammed Bin Salman recusar-se a atender-lhe o telefone, como noticiaram os media internacionais.
Embora, como costume, não se saiba qual a posição de Angola nesta reunião, mesmo sendo um dos maiores produtores africanos, actualmente mesmo acima da Nigéria, mas por causa de grandes problemas internos em Abuja, Luanda tem o foco neste encontro de Viena de Áustria porque ainda depende grandemente dos rendimentos do petróleo para amaciar a crise económica que o país atravessa há anos.
Alias, este momento é relevante ainda porque o crude responde a 95% das exportações nacionais, mais de 35% do PIB e perto de 60% das receitas fiscais angolanas.
E, a sublimar ainda esta posição angolana, está o facto de que a sua produção actual, perto de 1,1 mbpd, está longe da quota atribuída inter pares na OPEP+, devido, essencialmente, ao envelhecimento dos seus campos e à falta de investimento na pesquisa e na manutenção da sua infra-estrutura produtiva offshore que vem em crescendo desde 2014, ano em que a crise ganhou rubor e o barril deu um tombo ruidoso para baixo da fasquia dos 100 USD.
Outra perspectiva
Apesar deste cenário, há uma dúvida que atravessa a mesa dos 23 membros da OPEP+. Esta: Se baixar a produção, no imediato sobem os preços, aumentando os rendimentos dos produtores/exportadores, alguns deles, como Angola ou a Nigéria, muito dependentes deste sector, mas isso levará a que a inflação mantenha a sua fase de ascensão nas grandes economias consumidoras de crude, o que levará inevitavelmente a uma deterioração do seu tecido económico e, logo, a uma redução do consumo de energia, pressionando os preços em baixa.
Perante este dilema, alguns analistas, embora escassos, admitem que o cartel será levado a escolher uma posição de prudência, com uma opção reduzir pouco a produção - a anterior decisão, no início de Setembro, foi de baixar, para Outubro, em 100 mil bpd - ou então, devido à pressão de alguns dos seus membros, mais sensíveis à pressão dos EUA, manter o actual estado de coisas.
Mas não é assim que pensam, por exemplo, os analistas da JP Morgan Chase, uma das maiores casas financeiras do mundo, que, segundo a Bloomberg, avança que a OPEP+ deverá optar um corte de até 500 mil barris por dia de forma a estabilizar os preços num patamar acima dos 90 USD por barril.
Mas, com a guerra na Ucrânia em pano de fundo, os líderes de facto da OPEP+, Arábia Saudita e Rússia, deverão aproveitar para desafiar abertamente os EUA, com as relações entre Washington de um lado e Riade e Moscovo do outro, a deteriorarem-se a olhos vistos, sendo que os EUA anseiam por mais crude no mercado para menos dólares pagos por barril e menos custo a atestar as viaturas nos postos de abastecimento.