A moção de confiança, que poderá ser discutida e votada no Parlamento de Lisboa num prazo de apenas alguns dias, foi anunciada num contexto de fortes dúvidas sobre a legalidade da relação do primeiro-ministro com uma empresa privada que o mesmo fundou há alguns anos e da qual se deveria ter desvinculado de forma total no momento em que assumiu responsabilidades políticas incompatíveis.

Apesar de ter deixado a gestão da Spinumviva, em 2022, quando foi eleito presidente do PSD, Montenegro manteve uma estreita relação com esta empresa porque as suas quotas foram passadas para a mulher e para os dois filhos, o que colide com a lei pelo facto de o seu casamento ter como moldura legal a comunhão de adquiridos, que é o caso desta empresa.

Após várias tentativas de regularizar a situação, com a passagem da titularidade da empresa para os filhos pela sua mulher, a desconfiança sobre a lisura do seu comportamento foi crescendo e ganhando dimensão de escândalo a ponto de, há cerca de duas semanas, ter sido confrontado com uma moção de censura do Partido Chega.

Esta moção foi rejeitada pelo Parlamento, apesar de a coligação eleitoral que o PSD tem com o CDS, de centro-direita, contar com uma escassa maioria relativa, mas a polémica em torno da vida empresarial do primeiro-ministro não se esfumou e foi ganhando contornos de crise política, a ponto de Luís Montenegro ter reunido o Governo para uma declaração pública no passado fim-de-semana onde este disse que seria preferível ir para eleições que manter a situação pantanosa vigente.

Horas depois destas declarações, o Partido Comunista Português anunciou nova moção de censura, que foi a debate parlamentar na quarta-feira, mas por pouco tempo, porque a situação evoluiu mesmo para crise política depois de na sua primeira intervenção o chefe do Governo ter anunciado que iria apresentar uma moção de confiança ao seu Executivo.

Desde o mais pequeno partido, o PAN, ambientalista e pró-animais, ao Partido Socialista, o maior da oposição, todos aproveitaram para deixar claro que não dariam nova oportunidade ao Governo da Aliança Democrática, que agrega o PSD e o CDS, lançando este país europeus com as conhecidas históricas ligações a Angola numa severa crise política.

Crise política que pode ter consequências relevantes para a comunidade angolana, e estrangeira, no geral, que ali vive, porque o actual Governo, tem vindo a criar políticas restritivas à imigração, dificultando, por exemplo, o acesso aos vistos Schengen.

Mas se, como tudo indica, Portugal for a eleições, a decisão dos eleitores poderá pender para um reforço do partida da extrema-direita, o Chega, que propõe ainda mais rigorosas e restritivas políticas sobre imigração, que tem hoje 50 deputados e as sondagens dão como possível o seu reforço no Parlamento.

Todavia, o cenário mais previsível é que a esquerda, liderada pelo PS, com eventual apoio parlamentar dos partidos à sua esquerda, como o Bloco de Esquerda, PCP e Livre, possa vir a ser Governo de novo em Portugal, sem que não seja igualmente uma possibilidade forte a repetição da actual maioria relativa do PSD com o seu parceiro CDS.

Perante este cenário, o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, prometeu já agir "o mais rápido possível" se a moção de confiança que o Governo irá apresentar ao parlamento for rejeitada e os media locais apontam Maio como calendário mais certo para a ida às urnas.

"Se for rejeitada, eu imediatamente convocarei os partidos, se possível para o dia seguinte, e o Conselho de Esrado para dois dias depois", disse Marcelo Rebelo de Sousa, em Viseu, prometendo depois "um calendário de intervenção o mais rápido possível", deixando entender como hipótese a realização de legislativas antecipadas em maio.

Marcelo Rebelo de Sousa, citado pela Lusa, disse, contudo, pretender ouvir primeiro os partidos, designadamente os que suportam o Governo (PSD e CDS-PP), para confirmar que pretendem apresentar-se a eleições, se forem convocadas, com as mesmas lideranças.

Se as eleições forem a saída para esta crise, Hugo Soares, o líder parlamentar do PSD, já garantiu que o "PSD apresentará o seu melhor" trunfo, que é o actual líder do partido e primeiro-ministro, Luís Montenegro.

O primeiro-ministro "tem governado com uma competência que, aparentemente, os portugueses não colocam em causa", defende o líder parlamentar dos sociais-democratas, em declarações citadas pela imprensa portuguesa.

"O PSD apresentará a eleições ou em qualquer cenário, o seu melhor. E o que é o melhor para o país. Como se demonstrou neste último ano de governação, o melhor do PSD, o melhor para o país, chama-se Luís Montenegro. Não tenho dúvidas sobre isso e não vale a pena efabular-se", afirmou, citado pelos media portugueses.

Hugo Soares, de acordo com os media lusos. disse esperar que no debate da moção de confiança, seja aprovada ou rejeitada, possa existir "uma clarificação".

"Quem tem acompanhado os últimos dias do debate político, os portugueses não percebem nada do que está a acontecer (...) E será um momento clarificador: se a oposição quer uma crise política em Portugal, então chumba a moção de confiança e diz ao país aquilo que parece evidente", disse.

Entretanto, o líder do Partido Socialista, Pedro Nuno Santos, acusou já o primeiro-ministro Luís Montenegro de atirar País para eleições para fugir a explicações, e garantiu que votará contra a sua moção de confiança, o que garante a queda do Governo e a ida para eleições antecipadas, quando o Governo actual tem pouco mais de um ano.

O líder socialista confirmou que o PS votará contra a moção de confiança que o primeiro-ministro anunciou e acusou Luís Montenegro de preferir eleições a enfrentar uma comissão de inquérito, que o PS já tinha anunciado com o propósito de investigar a sua vida empresarial e a sua conformidade ou não com a lei.

No debate da moção de censura ao Governo apresentada pelo PCP, Pedro Nuno Santos disse que Luís Montenegro sabe que terá da parte do PS o chumbo da moção de confiança, tal como já tinha adiantado durante o debate da moção de censura do Chega.

"A responsabilidade pela crise politica é do primeiro-ministro", acusou, considerando que o primeiro-ministro "preferiu atirar o país para eleições a dar explicações" e assim "fugir à comissão parlamentar de inquérito" pedida pelo PS.