Ao contrário de outros tempos, em que a data da fundação da cidade era festejada com pompa e circunstância, este ano não há grandes novidades, destacando-se apenas dois espectáculos musicais denominados "Festshow Cidade de Luanda", que vão contar com a participação de 32 cantores e serão realizados nos dias 25 e 26, na Nova Marginal.

Apesar da crise, os luandenses estão decididos a comemorar o aniversário da capital. Em vários bairros foram montadas barracas de comes e bebes para viver a festa.

"Estamos habituados com o sofrimento, o momento que atravessamos não nos vai impedir de festejar", alegra-se Rondina da Silva, que vende cerveja no bairro Golf II.

Rondina e as amigas vão organizar, também, uma maratona sem apoio das autoridades administrativas locais.

"Até aqui ninguém da administração nos disse sobre a festa da cidade. Mas como a data é já conhecida, optámos por organizar a nossa festa", adiantou.

De entre as poucas actividades agendadas para saudar os 442 anos da fundação da cidade de Luanda, o ambientalista Pedro Filipe Kalunga escolheu o lançamento da campanha "Nossa Luanda sem malária", por ser, na sua opinião, "uma acção relevante".

"A sensibilização das comunidades sobre o risco da malária, sobretudo nesta fase de chuvas, é uma boa iniciativa das autoridades neste aniversário da cidade", acrescentou.

A jovem Antónia Lemos escolheu estar presente na Marginal para assistir ao "Festshow Cidade de Luanda".

"Eu e as minhas amigas já criámos as condições para estarmos presentes no "Festshow Cidade de Luanda". Lá estaremos para ver os Moikanos a cantar", disse.

O ancião Santos Patrício, que mora no bairro Rocha Pinto, vai seguir o festejo da fundação da cidade de Luanda, ao lado dos netos, na sua quinta na comuna de Calumbo.

"Está de parabéns a nossa cidade, mas este ano, infelizmente, o ambiente não é oportuno devido à crise. Estávamos habituados, nos anos anteriores, a assistir, nesta altura, à inauguração de infra-estruturas, mas agora está tudo num silêncio absoluto", frisou.

"Neste momento, a cidade de Luanda é a mais cara do mundo. Com a crise que assola o nosso país, Luanda será um "inferno de fogo", brinca o pedreiro Ramos Timóteo, que vive em Luanda há mais 13 anos e não está para comemorações.

"Ver para crer"

O estudante universitário, André Baião, vai comemorar o aniversário de Luanda com satisfação, mesmo num momento de crise.

"O 25 de Janeiro de 2018 é um dia especial para mim. O país tem um outro rumo e as coisas parecem terem mudado com a nova administração liderada pelo Presidente João Lourenço", confessou.

André Baião espera que o novo Executivo dê uma especial atenção à cidade, que, segundo ele, apresenta "problemas sérios de saneamento básico".

Um agente de protecção civil, que não quis identificar-se, juntou-se ao ponto de vista do estudante universitário ao reconhecer o desordenamento de alguns bairros da capital, que condiciona a capacidade de resposta e a intervenção dos efectivos quando solicitados para acudir a sinistros.

"São estes graves problemas que a nossa cidade enfrenta e a que o novo Executivo deve dar uma resposta urgentemente", resumiu.

A doméstica Celeste Ramos está satisfeita com a data, porque após 20 anos sem ver uma gota de água a jorrar das torneiras, o seu bairro tem, finalmente, água potável.

"Vivo no bairro Maria Eugénia Neto, Golfe II. Há um mês que o bairro tem água potável e as doenças diminuíram", frisou.

No bairro da Fubu, uma equipa de chineses já se movimenta, instalando postos de energia eléctrica. Este é um motivo de satisfação para a moradora Inês da Silva, que tem confiança que o actual Governo resolva os problemas do seu bairro.

"Temos garantias das autoridades de que dentro de duas semanas já teremos o bairro iluminado. É um ganho para nós e para a nossa cidade que faz 442 anos", sublinhou.

O serralheiro Sebastião Kinda ainda está incrédulo em relação às medidas prometidas pelo novo Governo sobre o desenvolvimento da cidade de Luanda, mas espera ver para acreditar.

"Luanda enfrenta vários problemas. Espero que o novo governador da província faça algo para melhorar a vida dos cidadãos", desafiou.

Delinquência à solta na cidade

Com a crise económica, a delinquência na cidade fundada a 25 de Janeiro de 1576 pelo fidalgo e explorador português Paulo Dias tem alcançado proporções alarmantes.

Na opinião do sociólogo Pedro Mavango, a delinquência juvenil é mais frequente nos bairros periféricos, onde os jovens, constituídos em grupos de marginais, se dedicam a vários crimes.

"Por falta de emprego, a delinquência preocupa a sociedade. Espero que o Executivo encontre políticas para a criação de emprego", aconselhou, defendendo, por isso, a necessidade de uma conjugação de esforços para manter os jovens ocupados, bem como a integração dos mesmos em centros de formação profissional.

Os habitantes da capital apontam a falta de patrulhamento e espaços de diversão para a juventude como uma das principais causas do aumento da criminalidade.

"Os olhos estão virados para o novo Governo, não obstante ter já dito que haverá este ano concursos na Função Pública", explicou ao Novo Jornal Online o sindicalista Artur Semedo Neto.

O sindicalista está ainda preocupado com uma onda de assassinatos a que se assiste nos bairros, sem o devido esclarecimento da polícia.

"Isso tem de acabar, porque, em plena paz, não é justo observarmos pessoas a morrer sem ninguém dar informações precisas", afirmou o sindicalista.

Fundação da cidade

Reza a história que, em 1575, o capitão português Paulo Dias de Novais, ao desembarcar na Ilha do Cabo, estabeleceu o primeiro núcleo de colonos portugueses: cerca de 700 pessoas, das quais 350 homens de armas, religiosos, mercadores e funcionários públicos.

Um ano depois (1576), reconhecendo não ser aquele lugar adequado, avançou para terra firme e fundou a vila de São Paulo da Assunção de Luanda e lançou a primeira pedra para a edificação da igreja dedicada a São Sebastião, onde se encontra hoje o Museu das Forças Armadas.

Trinta anos mais tarde, com o aumento da população europeia e do número de edificações, a vila de São Paulo da Assunção de Luanda tomou foros de cidade, estendendo-se de São Miguel ao largo fronteiriço ao antigo Hospital Maria Pia (actual Josina Machel).

No período da União Ibérica, em 1618, foi construída a Fortaleza de São Pedro da Barra. A cidade tornou-se no centro administrativo de Angola desde 1627.

Em 1634 foi construída a Fortaleza de São Miguel de Luanda. A cidade foi conquistada e esteve sob o domínio da Companhia Neerlandesa das Índias Ocidentais de 1641 a 1648, quando foi recuperada para a Coroa Portuguesa por uma expedição enviada da Capitania do Rio de Janeiro, no Brasil, por Salvador Correia de Sá e Benevides.

De 1550 a 1850, Luanda foi um importante centro do tráfico de escravos para o Brasil. A cidade limitava-se a funções militares, administrativas e de redistribuição e a indústria era praticamente inexistente e a instrução pública pouco evoluída.

Em 1847, incluindo os edifícios públicos, a cidade contava com 144 casas com primeiro andar, 275 casas térreas e 1058 cubatas (cabanas de indígenas).

Cidade de degredados, com cerca de cinco mil habitantes, possuía perto de cem tabernas, pelo que os viajantes a qualificavam como de moralidade duvidosa.

Em 1889, o governador Brito Capelo inaugurou um aqueduto que forneceu a cidade de água potável, anteriormente escassa, abrindo caminho para o grande crescimento de Luanda. Em 1872 Luanda recebeu o epíteto de "Paris de África".