1. Na linha de uma retórica inconsequente - basta ver como, à época em que se diziam progressistas, tinham plena consciência do efectivo papel imperialista que ainda hoje os Estados Unidos da América e grande parte da Europa Ocidental mantêm incólume - e hoje, defensores do liberalismo económico, da desestatização e das vantagens do exclusivamente privado, logo, com ligações privilegiadas às capitais dos grandes impérios, acusam-nos, sempre que dá jeito, de se imiscuírem nos assuntos internos de África.

Em contrapartida, é lá que estão os seus interesses essenciais e é com cidadãos desses países que normalmente têm ligações de grande promiscuidade e até mesmo de parcerias. Se não somos nós os culpados dos erros nas definições das grandes políticas de desenvolvimento, quem serão? Se não somos nós os culpados de desconseguirmos a construção de Estados sólidos, unidos, solidários, ao serviço efectivo das comunidades, quem serão? Se não somos que não conseguimos criar sistemas de educação e ensino minimamente aceitáveis, andando a criar aparentemente, e só aparentemente, fornadas e fornadas de licenciados que nem um parágrafo na língua oficial conseguem escrever, quem serão? Se não somos nós a promover a incúria, o desleixo, o descontrolo total nos gastos públicos, a alimentar centenas de indivíduos que, sem produzirem, vivem como nababos, com privilégios e regalias que não lembram a nenhum dirigente dos países mais desenvolvidos, quem o faz?

Enquanto não cessar esta demagogia interminável que nos desresponsabiliza de tudo, que nunca encontra culpados nem responsáveis, que nunca faz ninguém pagar pelos erros cometidos, por políticas mal definidas, pelos disparates mais incoerentes e idiotas na condução das políticas públicas, a culpa será sempre do outro. Há sempre uns quantos "culpados" a jeito, enquanto outros assobiam alegremente para o lado e, entre viagens de luxo e despesas que nós pagamos, se vão divertindo à nossa custa. "Debicando o seu pedaço".

2. Prendam-se as kinguilas todas do País. Julguem-nas sumariamente. Culpem-nas pelos valores assustadores que dólares e euros estão a atingir na rua. A pedido do Banco Nacional de Angola. Que não sabe como se desenrola o processo que faz com que elas (e eles...), o último elo, e o mais fraco, de toda esta cadeia, sejam os culpados da existência de divisas nas ruas que deveriam estar nos bancos comerciais, ao serviço dos cidadãos e da repentinamente tão famosa diversificação da economia. O Banco Nacional não sabe como as divisas vão parar ao mercado negro. Os bancos comerciais não sabem como as divisas vão parar ao mercado negro. Quem dirige a política monetária angolana não sabe como as divisas vão parar ao mercado negro. Não faz mal nem virá daí grande mal ao mundo.

Postas as kinguilas na prisão, outras e outros virão. Dentro de casa, fora de casa, em qualquer esquina de qualquer árvore, voltarão. Como sempre.

Dentro de um ano, o Banco Nacional não saberá como as divisas hão-de continuar a ir parar ao mercado negro. Os bancos comerciais não saberão como as divisas vão parar ao mercado negro. Quem dirige a política monetária continuará sem saber responder como é que as divisas vão parar ao mercado negro.

E quem continua a enriquecer, quem está na origem real do desvio das divisas que fazem tanta falta e que escasseiam cada vez mais, continuará a gozar com todos e a contribuir para a degradação do estado das contas públicas. E ninguém sabe quem são...