O mal-estar instalado nas relações luso-angolanas, a partir do processo judicial contra Manuel Vicente, tem na Embaixada de Angola em Lisboa um novo ponto de ruptura.

Sem responsável máximo desde o início desta semana, devido à exoneração de Marcos Barrica, a representação diplomática angolana vai continuar orfã de embaixador, numa espécie de protesto da cadeira vazia, avança a edição deste sábado, 28, do semanário Expresso.

O jornal adianta que apesar de o Chefe de Estado português, Marcelo Rebelo de Sousa, já ter dado luz verde ao nome apresentado por Angola para ocupar o lugar deixado por Barrica, a substituição vai permanecer em banho-maria.

"O Governo angolano está irritado com a Justiça portuguesa e não quer escondê-lo, quer mostrá-lo. Portanto, João Lourenço não vai indicar para já o embaixador", lê-se no Expresso, que cita fonte da Presidência da República de Angola.

"Os sucessivos avisos feitos pelo Presidente [de Angola] são para ser levados a sério", disse a fonte ao jornal português.

Recorde-se que no início do ano, falando em conferência de imprensa, o Chefe de Estado e do Executivo angolano, lembrou que Angola pretende ver o processo de Manuel Vicente transferido para os tribunais angolanos.

A desconfiança de Portugal que é uma ofensa para Angola

João Lourenço sublinhou que "a responsabilidade está do lado de Portugal" porque "o processo está a decorrer em Portugal", recordando ainda que "existe um acordo judiciário no âmbito da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP), que permite que este, como outros processos, seja transferido para Angola".

"Portugal não aceitou que assim fosse feito, alegando que não confiava na Justiça angolana. Vamos aguardar, temos a paciência suficiente para aguardar", afirmou, acrescentando de forma clara que "as relações entre os dois países vão depender muito do desfecho deste caso".

"Nós não estamos a querer dizer que o sr. engenheiro Manuel Vicente deve ser absolvido ou que o processo seja arquivado, porque não somos juízes nem temos competência para determinar se é ou não responsável pelos crimes de que está acusado, o que dizemos é que seja qual for o desfecho, este deve ocorrer nos tribunais angolanos", disse.

Não revelou quais as eventuais consequências que podem resultar do desfecho deste caso, mas garantiu que "as boas relações" com Portugal dependem apenas de "um gesto", salientando o que esse gesto é apenas que "o processo seja remetido a Angola", tendo deixado como mensagem que a forma como o processo está a ser tratado por Portugal constitui uma "ofensa" para Angola.

É neste momento crispado das relações entre os dois países que ocorre a saída de Marcos Barrica. Os sinais de ruptura começaram a tornar-se claros no início de 2017, quando Luanda mandou cancelar uma visita a Angola do primeiro-ministro português, depois de ter feito o mesmo com a ministra da Justiça, Francisca Van-Dúnem.

No centro desta crise está o processo judicial movido pelas autoridades portuguesas contra o ex-vice-Presidente angolano, Manuel Vicente, por alegado envolvimento num processo de corrupção e lavagem de dinheiro a que o Ministério Público português deu o nome de "Operação Fizz".