Após o anúncio de que a torneira do gás russo seria fechada para quem não o pagasse em rublos, as economias europeias e do G7 responderam com um rotundo "não" à pretensão de Putin, o que abriu de imediato o cenário para uma nova tempestade sobre a economia mundial.

E, agora, quando ainda existia uma nesga de esperança de que a Rússia não cumprisse a ameaça, eis que os media russos, replicados pelas agências ocidentais, como a Reuters e a Bloomberg, acabam de divulgar que Vladimir Putin assinou um decreto que regulamenta a negociação do gás russo com os países "hostis".

Neste documento está explicito que esses países, todos na União Europeia, o Japão, a Coreia do Sul e a Austrália, vão ter de pagar o gás que importarem da Rússia em rublos e, para isso, devem abrir contas nos bancos russos deixando claro que os contratos estão congelados até serem cumpridos com as novas regras de pagamento.

Numa declaração feita hoje em Moscovo, Putin explicou, segundo a Russia Today, que Moscovo "ofereceu condições claras e transparentes" para esses países de forma a que possam continuar a comprar gás russo com a abertura de contas em bancos russo através das quais devem começar a pagar as contas do gás a partir de 01 de Abril.

Deixou a garantia de que a Rússia vai continuar a cumprir as suas obrigações de fornecer gás aos seus clientes em quantidades e em preços conforme os contratos existentes, sendo a única alteração que estes devem ser pagos em rublos.

Com esta imposição, Putin procura contornar as sanções aplicadas ao seu país depois de ter invadido a Ucrânia, a 24 de Fevereiro, nomeadamente o congelamento das contas do seu Banco Central e a proibição de importação e exportação de um conjunto alargado de bens de consumo, tendo o ocidente deixado de fora das sanções o sector energético.

Esta medida implica que os países consumidores do gás russo devem, para obter rublos, ignorar uma boa parte das sanções que subscreveram contra a Rússia, nomeadamente no capítulos das importações.

A Alemanha já deixou perceber que vai sentir fortes dificuldades, tal como os Países Baixos e outros, podendo ter de ser feito o racionamento do gás nestes países, privilegiando as unidades de saúde e de segurança, e ainda as famílias, com a sujeição das empresas a esse regime, o que levará seguramente ao fecho de muitas indústrias e ao desemprego de milhares de pessoas na Europa.

Muitas das unidades industriais alemãs, por exemplo, são responsáveis pela colocação de compostos essenciais para o funcionamento da economia global, desde logo a agricultura, o que leva ao risco acrescido de insegurança alimentar onde este problema já está presente com a saída do mercado dos cereais russos e ucranianos, que são o celeiro do mundo, devido à guerra.

Esta medida coincide ainda com a assinatura de um acordo entre a União Europeia e os Estados Unidos, durante a visita do Presidente Joe Biden à Europa, para a compra de 15 mil milhões de metros3 de gás americano e à tentativa dos países europeus para encontrar fontes alternativas, como o Qatar, a Nigéria ou mesmo Angola...

Contexto da guerra na Ucrânia

A 24 de Fevereiro, depois de semanas de impaciente expectativa, as forças russas iniciaram a invasão da Ucrânia por vários pontos, tendo o Presidente russo dito que se tratava de uma "operação especial", sublinhando que o objectivo não é a ocupação do país vizinho mas sim a sua desmilitarização e assegurar que Kiev não insiste na adesão à NATO, o que Moscovo considera parte das suas garantias vitais de segurança nacional, criticando fortemente o avanço desta organização de defesa para junto das suas fronteiras, agregando os antigos membros do Pacto de Varsóvia, organização que também colapsou com a extinção da URSS.

Moscovo visa ainda garantir o reconhecimento de KIev da soberania russa da Península da Crimeia, integrada na Rússia, depois de um referendo, em 2014, e ainda a independência das duas repúblicas do Donbass, a de Donetsk e de Lugansk, de maioria russófila, que o Kremlin já reconheceu em Fevereiro.

Do lado ucraniano, a visão é totalmente distinta e Putin é acusado de estar a querer reintegrar a Ucrânia na Rússia como forma de reconstruir o "império soviético", que se desmoronou em 1992, com o colapso da União Soviética.

Esta guerra na Ucrânia contou com a condenação generalizada da comunidade internacional, tendo a União Europeia e a NATO assumido a linha da frente da contestação à "operação especial" de Putin, que se materializou através de bombardeamentos das principais cidades, por meio de ataques aéreos, lançamento de misseis de cruzeiro e artilharia pesada, e com volumosas colunas militares a cercarem os grandes centros urbanos do país.

Na reacção, além da resistência ucraniana, Moscovo contou com o maior pacote de sanções aplicadas a um país, que está a causar danos avultados à sua economia, sendo disso exemplo a queda da sua moeda nacional, o rublo, que chegou a ser superior a 60%.

Estas sanções, que já levaram as grandes marcas mundiais a deixar a Rússia, como as 850 lojas da McDonalds, abrangem ainda os seus desportistas, artistas, homens de negócios...

Milhares de mortos e feridos e mais de 4 milhões de refugiados nos países vizinhos da Ucrânia são a parte visível deste desastre humanitário.

O histórico recente desta crise no leste europeu pode ser revisitado nos links colocados em baixo, nesta página.