Na quinta-feira, último dia útil devido ao feriado da sexta-feira de Páscoa, os 22 países agregados na denominada OPEP+, que junta os Países Exportadores (OPEP) e um grupo de não-alinhados liderados pela Rússia, reuniram para mais um encontro mensal, um dos mais importantes desde o início de 2020, coincidindo com a "explosão" da pandemia da Covid-19, para anunciar ao mundo que a produção do "cartel" vai aumentar até 1,1 milhões de barris por dia (mbpd) até Julho.

Ou seja, os países da OPEP+ vão injectar mais 350 mil bpd em Maio, outros tantos em Junho e, por fim, em Julho, o mercado global vai receber mais 400 mil barris por dia, aproximando a produção deste grupo à media diária pré-pandémica.

A OPEP+ é uma agremiação criada já em 2017 para equilibrar os mercados face às várias perturbações que foram surgindo mas que ganhou maior relevância com o surgimento do Sars CoV-2 no início de 2020.

Inicialmente, a OPEP+ retirou de circulação mais de 7,7 mpbd, tendo, posteriormente diminuído para cerca de 7 mbpd, aos quais acaba agora de anunciar mais 1,1 mbpd até Julho, o que levou os mercados a reagir em baixa, como era esperado pelos analistas tendo como pano de fundo uma importante frustração global pelo atraso nas campanhas de vacinação e no esperado domínio da pandemia que vai possibilitar a reposição da normalidade.

É com este ambiente que o barril de Brent estava hoje, perto das 10:00 de Luanda, a perder 1,79%, para os 63,55 USD, relativo aos contratos de Maio, enquanto no WTI de Nova Iorque, à mesma hora, o barril perdia 1,92%, para os 60,27 USD, igualmente para entregas em Maio.

Este cenário, que retira conforto às contas públicas angolanas, já de si pressionadas pela desvitalização a que a principal matéria-prima de exportação tem estado sujeita nos últimos anos, desde, especialmente, 2014, quando desceu de forma abrupta da saudável fasquia dos 100 USD por barril, tem ainda como pano de fundo um pedido com alguma veemência feito pela nova Administração Biden (EUA) à Arábia Saudita no sentido de manter os preços da energia comportáveis para os consumidores, numa altura em que a Europa e o Japão estão, ainda, a viver tempo amargurados devido aos retrocessos no combate à pandemia.

Importante também neste tabuleiro negocial ao qual Angola está especialmente atenta é a quase certa retoma das negociações entre os EUA e o Irão, um grande produtor que tem visto as suas exportações amarradas pelas sanções que o anterior Presidente Donald Trump recuperou ao abandonar unilateralmente o acordo nuclear a que Barack Obama tinha chegado com Teerão, incluindo outras potências mundiais.

Com a chegada de Joe Biden à Casa Branca, que foi o vice-Presidente de Obama, o regresso a este acordo era uma questão de tempo, bem como a condição principal das negociações, que é a liberdade de Teerão para exportar a sua produção de crude, que, em tempos normais, pode chegar aos 5 mbpd, o que vai, seguramente, causar perturbações nos mercados e atirar o valor do barril para baixo, e a garantia de que o seu programa nuclear não evolui além do estabelecido e muito antes de permitir a produção de uma arma atómica.

Isto e a forte aposta na maioria das "majors" na transição energética para as não poluentes, vai, como defende a maior parte dos analistas, mais cedo ou mais tarde, empurrar o petróleo para uma cada vez mais saliente perda de importância e valor face às energias limpas, desde logo a denominada revolução do hidrogénio, mas também a energia solar, eólica, hídrica...

Neste contexto, o regresso dos EUA de Joe Biden ao Acordo de Paris é igualmente importante na evidente conjuntura mundial de protecção ambiental face aos evidentes malefícios da queima de hidrocarbonetos.

No entanto, apesar de um aumento de produção, em tempo de retoma económica planetária, poder significar um alívio para alguns países, que ganham em volume o que perdem na unidade (barril), Angola debate-se com um problema estrutural que mantém o País fora deste grupo de ganhadores devido às fortes limitações que a sua infra-estrutura produtiva ostenta actualmente, vítima do desinvestimento dos últimos anos em pesquisa, ao envelhecimento dos seus principais poços, e, não menos importante, à deslocação de meios das "majors" para outras geografias onde o breakeven da extracção é claramente mais baixo que o angolano.

Ou seja, segundo dados das principais organizações internacionais que recolhem dados dos países produtores, como a AIE ou a própria OPEP, a produção angolana está actualmente, no seu limite de topo, nos 1,3 mbpd, e em declínio acentuado, apesar das fortes contramedidas geradas pelo Executivo de João Lourenço, especialmente na legislação aplicável ao sector, especialmente as que incidem sobre os "bónus" no investimento em pesquisa ou, como exemplo, na exploração dos campos marginais onde as companhias foram libertadas de forma significativa das taxas então aplicadas.

A almofada

Apesar desta quebra no vigor do barril de crude, alguns analistas admitem que as perdas poderiam ser mais graves ainda não fora alguns sinais de retoma da economia mundial, como seja o anúncio de que os voos comerciais e de carga estão a aumentar de forma significativa.

Os dados agora revelados pela FlightRadar24, serviço global de observação do trafego aéreo, como o Novo Jornal noticiou, mostram que desde o início de 2020, coincidindo com a "explosão" da Covid-19, não havia tantos voos comerciais como na semana passada.

Estes dados, que se referem a voos comerciais e de carga, mostram, segundo os analistas, que o mundo se prepara para uma saída ruidosa do "longo silêncio" pandémico, com o avanço das campanhas de vacinação, gerando um vendaval de optimismo que permite - como raramente sucede - observar uma subida do valor do crude nos mercados coincidindo com o anúncio do aumento da produção pela OPEP+.

Existem ainda dados que sugerem fortemente que o trafego marítimo está igualmente em recuperação acelerada. O que é igualmente importante porque o transporte marítimo e o transporte aéreo são responsáveis por 20% do consumo mundial de petróleo.

Por detrás desta demonstração de força económica estão os EUA, a China e o Japão, enquanto, em sentido inverso, a Europa mostra estar ainda encalhada nos efeitos pandémicos, com novos confinamentos à vista em França e na Alemanha, as duas forças motrizes do continente, apesar de as campanhas de vacinação não terem parado, estando somente aquém do que era esperado.

Actualmente, num processo de desvitalização evidente, a produção nacional está abaixo dos 1,23 mpbd e com tendência para descer, apontando alguns organismos internacionais que até 2023 esta poderá estar a rondar "apenas" 1 mbpd, especialmente por causa do envelhecimento dos poços activos, a falta de aposta na pesquisa com, em pano de fundo, os efeitos da aposta global na transição energética para as não poluidoras pelas "majors", quase sem excepção.

Ainda assim...

A produção nacional média em 2020 foi de 1,22 mbpd, evidenciando o constante declínio devido ao desinvestimento das "majors" a operar no offshore nacional, especialmente a partir de 2014, quando se verificou uma quebra abrupta do valor do barril, que passou de mais de 120 USD para menos de 30 dois anos depois, em 2016.

As exportações de petróleo e gás de Angola caíram 7,26% no ano passado, para 18,2 mil milhões de dólares, resultantes das vendas de 446 milhões de barris de petróleo e gás equivalente.

Estes valores condizem com a exportação de 446 milhões de barris de petróleo e gás, avaliados num preço médio de 41,8 dólares por barril, segundo números fornecidos pelo director do Gabinete de Estudo Planeamento e Estatística do Ministério dos Recursos Naturais e Petróleo, Alexandre Garrett, citado na página oficial do MIREMPET.

Isto compreende ainda a exportação média de 1,22 milhões de barris por dia, consubstanciando uma diminuição de 7,2% em relação a 2019, mostrando uma continuada perda anual da produção nacional.

Apesar das mudanças substanciais na legislação referente ao sector e às alterações profundas nesta indústria decisiva para o País, a produção afasta-se cada vez mais dos patamares que se viram no passado.

Para já, com o barril na casa dos 63 USD, o Executivo de João Lourenço conta com uma folga de cerca de 24 USD em cima dos 39 USD que foi o valor usado como referência para a elaboração do OGE 2021, o que permite encarar com maior optimismo esta saída esperada da crise mundial, apesar dos fortes constrangimentos que a economia nacional enfrenta.

O crude é ainda responsável por mais de 94% das exportações angolanas, mais de 50% do PIB e representa 60% das receitas do Executivo para poder gerir as necessidades da governação, o que, face a uma lenta e demorada diversificação da economia nacional, se traduz numa mais optimista entrada no novo ano e nova década do século XXI.

E no que respeita ao futuro breve, o sector exige reflexão e claramente uma forte aposta na diversificação da economia, porque, como é hoje já consensual, o petróleo não tem muito mais tempo como principal combustível da economia mundial.

O alerta da Carbon Tracker

Alias, um estudo internacional recente, elaborado pela iniciativa Carbon Tracker aponta Angola como um dos países mais vulneráveis ao processo global de descarbonização da economia por razões de protecção climáticas que se traduz mesmo no desinvestimento das petrolíferas no sector para investirem nas denominadas energias limpas.

Este estudo denominado "Beyond Petrostates" nota que Angola enfrenta, até 2040, um défice de receitas na casa dos 76%, o que coloca o País na linha da frente das maiores vítimas deste processo planetário de substituição do petróleo como grande fonte energética mundial, o que exige de Angola um redobrado empenho na diversificação da sua economia.

O estudo diz isso mesmo, que os países nestas condições estão obrigados a definir políticas fortes de substituição de fontes de rendimento sob risco de enfrentarem dificuldades devastadoras para o seu futuro.

Para exemplificar esse abismo que têm pela frente, o estudo revela que as quedas das receitas nos próximos anos vão ser superiores a 13 mil milhões de dólares.

A Carbon Tracker é um think tank financeiro independente que desenvolve análises detalhadas e aprofundadas sobre o impacto da transição energética nos mercados de capitais e no potencial investimento em combustíveis fósseis.