Os mercados que gerem o negócio do crude mundial estão hoje claramente no "verde", com o barril de Brent, em Londres, a subir quase 1% e o WTI, em Nova Iorque, a abeirar-se deste expressivo valor, o que repõe alguma normalidade face àquilo que é a realidade económica global.
Seja a saída acelerada da crise pandémica, seja o robusto controlo que a OPEP+, OPEP + Rússia e aliados, está a fazer da sua produção, resistindo mesmo à forte pressão para aumentar a extracção da matéria-prima por parte das grandes economias, como os EUA, a Europa ou mesmo China e Índia.
Com os analistas e economistas algo baralhados e sem uma explicação clara e inequívoca sobre o porque de estar a ser difícil encontrar navios para colocar contentores e com estes, por sua vez, cada vez mais caros - por exemplo, um contentor transportado da China Para Angola passou, nos últimos tempos, a custar até 4 vezes mais - e mais raros - os media económicos dizem haver uma inexplicável concentração de contentores nas Américas quando faltam na Ásia -, o petróleo começa a ressentir-se positivamente deste cenário valorizando-se, até porque começam igualmente a surgir notícias de que alguns países estão com dificuldades de repor peças essenciais à sua infra-estrutura extractiva.
Esta valorização está igualmente a ser suportada por indícios de recuperação da economia global, desde logo na China - com dados refrescantes sobre as suas exportações - onde as últimas semanas foram igualmente estranhas devido a cortes no fornecimento de electricidade que levou ao encerramento de unidades fabris importantes, por exemplo, no sector automóvel, o que obrigou mesmo o país a reactivar algumas das mais nocivas e antigas centrais a carvão que tinham sido sacrificadas em nome do combate às alterações climáticas.
Outro sinal dado aos mercados que ajudou a este momento de maior optimismo foi a aprovação pelo Congresso dos EUA de uma iniciativa legislativa do Presidente Joe Biden para investir um trilião de dólares (1,000,000,000,000) na recuperação de infra-estruturas do país, como pontes, estradas, etc. o que vai impulsionar fortemente, esperam os analistas, o consumo de combustíveis na maior economia do mundo.
E a confirmação deste novo impulso chegou do gigante petrolífero saudita, a ARAMCO, que, segundo a Reuters, subiu o seu preço de referência para os mercados asiáticos, o que só sucede quando existem dados concretos no maior exportador mundial de petróleo, a Arábia Saudita, de que a procura está a subir de forma robusta e estrutural.
O que também admite outra leitura, que é o facto de a Arábia Saudita, que, a par da Rússia, controla, de facto, a OPEP+, a organização que desde 2017 foi gerada a partir dos Países Exportadores (OPEP) e a Rússia agregada a mais nove independentes, ter insistido para que o programa em curso no "cartel" - acrescer 400 mil barris por dia, mensalmente, até ao final do ano, e desde Julho - não sofrer alterações, mantendo estreito o fluxo energético e assim os preços consolidados em alta.
Isto, porque, segundo notícias vindas a lume nos últimos meses, vários dos membros da OPEP+, como é o caso de Angola e da Nigéria, devido à falta de investimento deste 2014/2016, viram a sua capacidade produtiva diminuir drasticamente, estando mesmo a ter sérias dificuldades em cumprir com as suas quotas acordadas.
O sector da aviação está, segundo dados de organizações internacionais, citados hoje nos jornais da especialidade, a fornecer dados "animadores" sobre a retoma de muitas ligações interrompidas nos últimos 16 meses devido à restrições impostas pelos governos nas suas estratégias de combate à Covid-19.
Recorde-se que a aviação e o transporte marítimo são responsáveis por perto de 20% do consumo de crude mundial e foram os sectores mais afectados pela pandemia do Sars CoV-2.
Para Angola, que se prepara para aprovar no Parlamento o seu OGE para 2022 com o barril a ver o seu preço de referência médio estimado para os 59 USD, este momento é propício a gerar balões de oxigénio interessantes, visto que se se mantiver este ritmo em alta - há quem não duvide de que o barril vai passar os 100 USD -, O Executivo de João Lourenço terá uma folga de 25 USD, passando para perto dos 40 se a medida universal chegar aos 100 USD.
Como pode Angola aproveitar este momento?
Para países como Angola, cujas economias são extremamente dependentes das exportações de crude, este momento é, seguramente, gerador de derradeiras oportunidades para investir na diversificação das suas economias com os excedentes gerados pelos elevados preços da matéria-prima, escolhendo bem onde apostar.
Com o barril nos 83 USD, o Executivo angolano, que elaborou o OGE 2021 com 39 USD - o de 2022 está pensado, embora ainda não tenha sido aprovado, para os 59 USD - como valor de referência para o barril, conta com um bónus de 43/44 dólares, o que permite, mesmo que sejam gigantescos os compromissos com a dívida externa, colocar uma boa parte deste superavit na diversificação da sua asfixiada economia.
No entanto, para já, de forma a corresponder a urgências imediatas, como é o caso da redução dos gastos com a subsidiação dos combustíveis, gasolina e gasóleo, que leva dos cofres públicos quase 2 mil milhões USD/ano, o Governo tem colocado uma boa parte das fichas na aposta da construção de refinarias, contando com o abastecimento local e com a exportação de refinados para outros países do continente onde a transição energética, espera-se, venha a demorar mais a chegar.
Porém, como alguns especialistas têm vindo a chamar à atenção para isso, o calendário destes processos não obedece às leis a que estávamos habituados no passado e podem, de um momento para o outro - a COP26, em Glasgow, é um bom exemplo e uma possibilidade de algo inesperado suceder - conduzir a mudanças radicais de paradigma que deitem por terra tudo isso, face à já hoje evidente urgência de mudança, como lembrou na última Assembleia-Geral da ONU, o seu Secretário Geral, António Guterres, afirmando que o mundo vive o seu último curto intervalo temporal para levar a sério o "alerta vermelho" climático.
Ou seja, se não for nos próximos 2 a 3 anos, Angola terá, exponencialmente, mais e mais dificuldades em ter como investir na modernização da sua agricultura, na diversificação das fontes de rendimento, no aproveitamento do seu potencial mineiro...
Cenário de fundo
No entanto, este é o momento para aproveitar o que houver para aproveitar. Mas mesmo isso não está a ser fácil.
Se Angola, Nigéria, Líbia ou Argélia, os grandes produtores africanos, sofreram com a baixa do consumo, a recuperação não está a ser igualmente rápida, muito devido à fraca capacidade de resposta, de forma mais acentuada em Angola e na Nigéria, por causa da deterioração da sua infra-estrutura, do desinvestimento em pesquisa, em manutenção e já, também, resultado de uma desistência global do petróleo devido à poluição e o esforço mundial para uma transição energética que afaste a ameaça das alterações climáticas sobre a humanidade.
Mas o mesmo não se pode dizer dos países do Golfo, que tiveram melhor visão estratégica ao longo dos anos, investindo mais na diversificação e na manutenção dos seus campos, que, agora, estão a dar uma resposta adequada ao aumento da procura e a gerar optimismo entre os diversos sectores económicos, como é o caso da Arábia Saudita, cujo mercado bolsista cresceu mais de 42 por cento nos últimos 12 meses.
E mesmo as plataformas abandonadas para a extracção de crude, estão a ser transformadas em atracções turísticas com grande sucesso.
Este exemplo é ainda mais interessante porque o crescimento mais volumoso reflecte-se, segundo os media internacionais especializados, no sector não petrolífero, como as telecomunicações, o turismo, o comércio e a indústria química..., sendo que a petrolífera nacional, a ARAMCO, no último trimestre lucrou mais de 26 mil milhões USD, o que pode comparar negativamente com as continuadas perdas da Sonangol.
A ficar para trás
Entre os restantes exportadores de crude, a recuperação está a ser substancialmente mais lenta, como é o caso de Angola, onde a economia se debate com a pressão da inflação, que pode chegar, segundo o INE e o BNA, aos 27% nos próximos meses, uma crise social sem precedentes desde o fim da guerra, em 2002, e uma assinalável incapacidade para que os esforços da diversificação económica mostrem sinais de estar a produzir efeito.
Como pano de fundo para este cenário difícil, o País tem o acentuado declínio da sua produção de petróleo, que está actualmente abaixo dos 1,1 milhões de barris por dia e com tendência para diminuir ainda mais.
Tudo devido aos sobejamente conhecidos problemas do abandono de algumas das majors com investimentos no off shore nacional, face a uma "infecciosa" dependência do petróleo que, ao longo dos anos, criou uma inércia geral face à urgência de diversificar a economia apesar de ser bem conhecida essa urgência.
E o resultado é o que se sabia estar ao virar da esquina perante uma realidade em que o petróleo ainda é rei e senhor na economia nacional.
Sendo Angola um dos países na linha da frente das repercussões do sobe e desce dos mercados petrolíferos, devido à sua dependência das exportações de crude para o equilíbrio das suas contas - o petróleo ainda é responsável por mais de 94% das exportações e mais de 60 por cento dos gastos do Executivo e acima de 30% do PIB, este cenário de recuperação permite, ainda assim, algum optimismo nas contas nacionais mas ainda longe de um regresso ao patamar alcançado a partir de 2008, com o barril, como exemplo, a chegar aos 147 USD no Verão desse mesmo ano, permitindo um boom económico como nunca visto até ali.
A produção actual está em constante declínio devido ao desinvestimento das "majors" a operar no offshore nacional, especialmente a partir de 2014, quando se verificou uma quebra abrupta do valor do barril, que passou de mais de 120 USD para menos de 30 dois anos depois, em 2016, bem como devido ao esgotamento/envelhecimento dos campos mais activos.
Apesar das mudanças substanciais na legislação referente ao sector e às alterações profundas nesta indústria decisiva para o País, a produção tem vindo a perder viço especialmente por causa da deterioração da infra-estrutura produtiva que desde 2014 viu os investimentos das "majors" descer, a fraca aposta na pesquisa por novas reservas e o envelhecimento de alguns dos mais importantes poços activos no offshore nacional.
E com a transição energética a impor cada vez mais a sua vontade, com o crude e os restantes hidrocarbonetos a ser olhado como uma infecção perigosa e contagiosa, o País tem agora de fazer o que não fez nos últimos 20 anos: diversificar a sua economia o mais rápido possível, porque o petróleo tem os dias contados. E são cada vez menos.