O "cartel", que é composto por 23 países, os 13 da OPEP e 10 desalinhados liderados pela Rússia, fez saber, segundo as agências, que não reconhece como razão para a volatilidade nos mercados quaisquer razões alicerçadas na economia real, apontando como facto por detrás do sobe e desce no valor do crude o escaldante momento geopolítico que o mundo vive com epicentro na guerra da Ucrânia.

Angola, que faz parte do grupo, não comunicou qual foi a posição assumida no debate, como é costume, mas esta decisão é de extrema importância para o país porque o petróleo ainda é responsável por 95% das suas exportações, 35% do PIB e 60% das despesas de funcionamento do Estado.

A decisão coincide com o dia em que o barril de crude Brent, que serve de referência para as ramas exportadas por Angola, caiu hoje mais de 6% depois de os Estados Unidos da América terem anunciado que vão injectar nos mercados, nos próximos quatro meses 180 milhões de barris de petróleo das suas reservas estratégicas.

Há mais de meio século, estima a agência Reuters, que os EUA, a maior potência económica e o maior produtor e consumidor de crude do mundo, não recorriam com este peso às suas reservas para aliviar a pressão nos mercados, prometendo um milhão de barris diariamente nos próximos quatro meses.

Com esta decisão, a Administração norte-americana alivia ainda o bolso dos cidadãos que estão a pagar a gasolina a preços recorde quando o Presidente Joe Biden tem umas decisivas eleições intercalares este ano e sabe que é a abastecer os seus carros que os eleitores decidem, em grande medida, o seu voto.

Ao anunciar esta medida, Joe Biden arrefeceu fortemente os escaldantes mercados que têm estado a valorizar o barril em permanência nas últimas semanas devido à guerra na Ucrânia considerando que a Rússia, o invasor, é um dos maiores produtores de emergia do mundo e estar sob fortes sanções dos países ocidentais e em risco de ver as suas exportações de crude e de gás interrompidas, pelo menos parcialmente, visto que os EUA já o fizeram totalmente.

Apesar de volumosa, esta libertação de reservas dos EUA não é suficiente para aliviar toda a pressão nos mercados, sendo opinião dos especialistas que só uma acção concertada neste sentido pode levar a uma estabilização dos preços em valores aceitáveis.

E é isso que pode vir a suceder já na sexta-feira quando reunirem de emergência os membros da Agência Internacional de Energia (AIE), para analisar a possibilidade de uma libertação sincronizada de reservas destes países.

O anúncio dos EUA, cujas reservas estratégicas se aproximam dos 700 milhões de barris, coincide com a realização, hoje, quinta-feira, 31, da reunião mensal da OPEP+, a organização que desde 2017 junta os 13 Países Exportadores (OPEP) e 10 desalinhados com a Rússia à frente, para equilibrar os mercados, e que desde Julho de 2021 estão a acrescentar, todos os meses, 400 mil barris por dia, sendo que nestes encontros podem ser redefinidos estes planos.

Até este anúncio a expectativa era de que o "cartel" mantivesse o programa de recuperação da produção, o que tem sido feito há meses, provocando a fúria das economias ocidentais que lidam mal com preços elevados no sector.

E foi isso que sucedeu, de facto. A OPEP+ manteve, na reunião desta quinta-feira,31, o aumento de pouco mais de 400 mil barris por dia para o mês de Maio.

O barril de Brent estava a ser vendido hoje, perto das 14:30, hora de Luanda, a 107 USD, manos 5% que no fecho de quarta-feira, sendo esta já uma das maiores quedas em semanas.

Recorde-se que o barril chegou, depois do início da guerra na Ucrânia, a atingir os 139 USD, a 09 de Março, ficando a escassos 7 dólares do recorde de sempre, 147 USD atingidos em Junho de 2008. Entretanto, com as negociações de paz a decorrer, os mercados têm oscilado.

Porém, hoje foi o dead line estabelecido pelo Presidente russo para fechar a torneira do gás russo à Europa, caso os países não aceitem, como parece ser o caso, pagar em moeda nacional russa, o Rublo.

Se tal vier a suceder, o que só ao final do dia se saberá, os mercados sevem voltar a sobressaltar-se.

O desafio de Putin do "gás por rublos"

Mas se esta semana ficou, até hoje, 31 de Março, quinta-feira, marcada pelas negociações na Turquia e pelo encontro de Lavrov na China com Yi, e, já hoje, com o homólogo indiano, Subrahmanyam Jaishankar, em Nova Deli, a economia mundial pode estar prestes a dar um salto na cadeira, mais um, com o possível fechar da torneira do gás russo para a União Europeia, depois deste exigir o pagamento da matéria-prima na moeda nacional, o Rublo - que com o início do conflito caiu mais de 60% mas já recuperou integralmente dessas perdas iniciais -, mas com a resposta a chegar de imediato: não!.

Putin deu como prazo limite para que os clientes do gás russo se conformarem a esta exigência 31 de Março, hoje. Se cumprir, as grandes economias europeias podem entrar em estado de choque, como é o caso da Alemanha, cuja indústria vive da energia russa, e onde os dirigentes das grandes indústrias já admitiram, como a BASF, que podem ter de fechar a totalidade das suas unidades produtivas, ou com o Governo de Berlin a dizer que terá, eventualmente, de racionar o abastecimento, com perdas de largas centenas de milhares de empregos.

O Presidente da Rússia apresentou hoje ao chanceler alemão, Olaf Scholz, e ao primeiro-ministro italiano, Mario Draghi, as razões para o gás russo ter de ser pago em rublos, garantindo que não prejudicará as empresas europeias.

"A alteração do mecanismo de pagamento é implementada porque, violando as normas do direito internacional, os países membros da União Europeia (UE) congelaram as reservas cambiais do Banco da Rússia", explicou o Kremlin num comunicado onde resume uma conversa telefónica de hoje entre Putin e Scholz.

O Presidente russo também falou com o chefe do governo italiano, a quem explicou igualmente os detalhes desta medida, referiu o Kremlin.

Putin assegurou ao líder alemão que esta decisão "não vai piorar as condições estabelecidas nos contratos para as empresas europeias que importam gás russo", referiu a Presidência russa, que não deu detalhes.

"Foi acordado que haverá conversações adicionais entre peritos de ambos os países", segundo o Kremlin.

A Alemanha tem sido um dos países mais relutantes em incluir o sector energético nas sanções contra Moscovo devido à guerra na Ucrânia, uma vez que 55% do gás que consome provém da Rússia.

Após o anúncio de Putin de exigir em rublos o pagamento pelo gás russo, a UE rejeitou categoricamente esta exigência, dizendo que constitui uma violação dos contratos existentes.

Contexto da guerra na Ucrânia

A 24 de Fevereiro, depois de semanas de impaciente expectativa, as forças russas iniciaram a invasão da Ucrânia por vários pontos, tendo o Presidente russo dito que se tratava de uma "operação especial", sublinhando que o objectivo não é a ocupação do país vizinho mas sim a sua desmilitarização e assegurar que Kiev não insiste na adesão à NATO, o que Moscovo considera parte das suas garantias vitais de segurança nacional, criticando fortemente o avanço desta organização de defesa para junto das suas fronteiras, agregando os antigos membros do Pacto de Varsóvia, organização que também colapsou com a extinção da URSS.

Moscovo visa ainda garantir o reconhecimento de KIev da soberania russa da Península da Crimeia, integrada na Rússia, depois de um referendo, em 2014, e ainda a independência das duas repúblicas do Donbass, a de Donetsk e de Lugansk, de maioria russófila, que o Kremlin já reconheceu em Fevereiro.

Do lado ucraniano, a visão é totalmente distinta e Putin é acusado de estar a querer reintegrar a Ucrânia na Rússia como forma de reconstruir o "império soviético", que se desmoronou em 1992, com o colapso da União Soviética.

Esta guerra na Ucrânia contou com a condenação generalizada da comunidade internacional, tendo a União Europeia e a NATO assumido a linha da frente da contestação à "operação especial" de Putin, que se materializou através de bombardeamentos das principais cidades, por meio de ataques aéreos, lançamento de misseis de cruzeiro e artilharia pesada, e com volumosas colunas militares a cercarem os grandes centros urbanos do país.

Na reacção, além da resistência ucraniana, Moscovo contou com o maior pacote de sanções aplicadas a um país, que está a causar danos avultados à sua economia, sendo disso exemplo a queda da sua moeda nacional, o rublo, que chegou a ser superior a 60%.

Estas sanções, que já levaram as grandes marcas mundiais a deixar a Rússia, como as 850 lojas da McDonalds, abrangem ainda os seus desportistas, artistas, homens de negócios...

Milhares de mortos e feridos e mais de 4 milhões de refugiados nos países vizinhos da Ucrânia são a parte visível deste desastre humanitário.