Os grandes produtores africanos de petróleo, Nigéria, Angola e Argélia, são pequenas e problemáticas economias sem o fluxo permanente dos rendimentos das exportações da matéria-prima com preços razoáveis, como está a ser demonstrado pelos actuais 26 USD por barril, fazendo regressar o fantasma da recessão sobre estes países num momento em que travam duras e dispendiosas batalhas contra a pandemia da Covid-19.
Mas, como recorda a Reuters, o problema para os produtores africanos não se resume a perdas directas de dinheiro por barril, essas consequências podem ser mais devastadoras, porque o mercado do petróleo é difícil de conquistar e pode agora ser perdido por muito tempo, senão para sempre, tendo em conta que produzir um barril nos países africanos, especialmente em Angola e na Nigéria, tem um breakeven muito mais alto que o dos sauditas e dos russos.
A agência nota ainda que o desespero dos países africanos ficou bem patente na carta que o ministro dos Petróleos da República do Congo escreveu ao secretário-geral da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP) a pedir uma reunião urgente do "cartel" para que seja encontrada uma solução que permita aos Estados-membros evitar a recessão nas suas fragilizadas economias.
O barril de Brent, vendido em Londres, onde se define o valor médio das exportações nacionais, começou a semana com mais uma queda significativa superior a 6%, para os 26,29 USD cerca das 10:00 de hoje, segunda-feira, 30, demonstrado mais uma vez a incapacidade da OPEP para estancar a sangria no sector provocada pela crise na economia planetária devido à pandemia da Covid-19.
Para piorar o cenário avassalador para os países produtores e dependentes dos rendimentos do crude, como é o caso de Angola, que já tem em curso a preparação de uma revisão forçada do seu OGE 2020, os gigantes mundiais da produção petrolífera, Rússia e Arábia Saudita, envolveram-se numa guerra de egos que está a afundar o valor do barril.
Tudo, porque no início deste mês, Riade e Moscovo, no contexto da OPEP+ - OPEP mais 11 produtores liderados pela Rússia - desentenderam-se por causa do montante dos cortes na produção para reequilibrar o valor da matéria-prima, fortemente pressionada deste o início do ano pela crise gerada pela pandemia do novo coronavírus, com sauditas a ameaçar, e a cumprir, inundar os mercados com petróleo ao preço da chuva depois de os russos se terem recusado a aceitar a proposta da OPEP que era de acrescentar mais 1,5 milhões de barris por dia (mbpd) aos cortes que já estavam em curso.
Com o aproximar de 01 de Abril, dia em que oficialmente termina o acordo que ainda está, para todos os efeitos, activo de corte na produção de 1,7 mbpd, desde Janeiro de 2019, e a partir do qual, teoricamente o crude saudita vai inundar ainda mais os mercados, os restantes membros começam a pedir soluções que evitem a tragédia colectiva que será o barril chegar aos 10 USD, como algumas das mais importantes casas financeiras do mundo já admitem como cenário mais plausível.
E, depois da carta enviada pelo Congo-Brazzaville ao secretário-geral da OPEP a pedir uma reunião de emergência, também os russos começam a recuar na sua posição, após o seu ministro da Energia, Alexander Novak, ter reunido na semana passada, com os CEO das petrolíferas russas, onde terá, segundo alguns sites especializados, pressionado a procurar uma solução com os sauditas que permita travar a actual queda no valor do barril que já soma mais de 60% desde o início do ano.
Por detrás desta nova oportunidade está ainda o Presidente dos EUA, Donald Trump, que tem em curso uma pressão diplomática aberta sobre os sauditas e russos para que estes se entendam e o barril volte a subir, porque o actual cenário está a matar a indústria do petróleo de xisto - fracking - norte-americana, onde o actual inquilino da Casa Branca tem uma importante base de apoio eleitoral e que não quer perder quando as eleições de Novembro se aproximam e onde vai estar em jogo a sua reeleição.
Mas, para já, e apesar de terem chegado sinais encorajadores de Moscovo, os sauditas já fizeram saber que não estão em negociações com os russos.
Isto, quando os pesados pacotes financeiros com que os grandes blocos económicos, da União Europeia aos EUA - que atirou para a fogueira da economia 2 triliões de USD, a maior ajuda de sempre -, passando pelo Japão e pela China conseguiram atenuar o sufoco que se vivia nas bolsas mundiais, estancando a queda, com algum reflexo nos mercados do petróleo, que, no entanto, rapidamente se esvaneceram face ao aumento do rigor pandémico da Covid-19, que não dá mostras de abrandar, excepto na China e na Coreia do Sul.
Os analistas ouvidos pelas agências nas últimas horas admitem que os estímulos financeiros dos bancos centrais podem atenuar o problema mas não são uma solução duradoura, porque essa só será possível quando forem visíveis substanciais melhorias no cenário global da Covid-19 e uma luz ao fundo do túnel para o seu fim.
Satoru Yoshida, um analista ouvido pela Reuters, avança que se a Covid-19 não for controlada rapidamente, o petróleo vai estar sob forte pressão e pode resvalar para baixo dos 20 USD por barril, porque no cenário actual, as economias não estão a dar sinais de revigoramento e, logo, a procura da matéria-prima vai permanecer baixa.
O actual registo aponta para uma quebra de até 20 mbpd - 20% - no consumo de crude mundial comparado valores de 2019, o que vai exigir, se for encontrado um entendimento no seio da OPEP+, um corte muito mais severo que aquele que esteve pensado, que seria em torno dos 3 mbpd, contando já com o acrescento de 1,5 mbpd sobre os cerca de 2 mbpd que vigorava.
E, mesmo que esse entendimento ocorra, alguns analistas defendem que os estragos produzidos pela Covid-19 na economia planetária são já de tal monta que aquilo que a OPE+ pode fazer é muito pouco ou nada para amortecer a queda, que se prevê violenta, e extremamente violenta para os países mais dependentes das suas vendas de petróleo, como é o caso dos países africanos
Estes países, embora importantes numa situação normal, com a economia mundial a funcionar sem grandes sobressaltos e o barril a valer acima dos 65 USD, perante um cenário como o actual, tudo muda e deixam de ter poder de influência sobre o que se passa, mesmo dentro da OPEP, organização a que pertencem.
Isto, porque são os sauditas que, de facto, mandam a partir da sua produção de mais de 12 mbpd e ainda por cima com condições geográficas que permitem produzir um barril a menos de metade do preço da média em países como a Nigéria ou Angola, que se situa, embora esta informação dependa das fontes, acima dos 24 USD por barril, quando os sauditas o conseguem entre 7 e 10 USD por barril.
E, como se já fosse pouco, sublinha ainda a Reuters, as multinacionais do sector estão a suspender planos de forma a cortar milhões em investimento, o que compreende uma situação que se repete sempre que este tipo de crises emerge, como foi em 2014: são os campos africanos que mais sofrem com esta redução estratégica nos custos das "majors".