Este "regresso" de forças militares norte-americanas à Somália, um dos países determinantes na geografia da África Oriental - Corno de África mais exposta ao terrorismo de raiz islâmica, acontece quase três anos depois de, em 2020, o então Presidente Trump ter ordenado a sua saída no âmbito do reforço da política interna em detrimento da política externa.

O alvo deste novo reposicionamento dos EUA na Somália é, em primeira linha, a organização terrorista próxima da al-qaeda do Magrebe, a al-shabbab, responsável por centenas de mortos em atentados terroristas na Somália e nos países vizinhos, como o Quénia, mas, em segunda linha, demonstra que os EUA se estão a reprogramar do ponto de vista da sua política externa.

Isto, quando o mundo está a observar uma nova fase de confrontação geoestratégica entre os EUA e aliados ocidentais e a Federação Russa, como se vê no apoio de Washington ao esforço de guerra da Ucrânia, e a China, com quem os Estados Unidos abriram uma nova linha de confrontação no Indo-Pacífico após a criação da AUKUS, uma organização que agrega a Austrália (AU), o Reino Unido (KU) e os Estados Unidos (US) com o objectivo assumido de travar o avanço da China nesta gigantesca região do mundo.

Desde 2016 que a China e os EUA partilham ainda o mesmo reduzido espaço do pequeno Djibuti, localizado no Corno de África, com importantes bases militares na costa que dá de frente com a Península Arábica, desde logo o Iémen e, pouco mais a norte, a Arábia Saudita.

África foi, durante o mandato de Donald Trump, entre 2016 e 2020, o continente mais desprezado pelos EUA, com um desinvestimento estridente face ao avanço galopante da China, e, embora menos acentuado, da Rússia, passando a outrora potência mais marcante no continente a ocupar um lugar secundário.

Apesar de Donald Trump ter, nos derradeiros dias da sua Presidência, feito uma jogada das mais impactantes de todo a política externa norte-americana em África, que foi reconhecer a soberania de Rabat no Saara Ocidental, levando a um renovado confronto, à beira de se tornar bélico, de Marrocos com a Argélia, tradicional aliada da Rússia, os EUA parecem, só agora, quando a Presidência de Joe Biden entra na segunda metade do mandato, querer recuperar tempo perdido, embora esta aposta numa presença militar na Somália possa, segundo alguns analistas, ter uma vertente mais virada para o continente asiático que para o africano.

Para já, segundo os media norte-americanos, apenas entre 500 e 750 militares, dependendo das fontes, serão recolocados na Somália, através da aprovação por Joe Biden de um pedido do Departamento da Defesa nesse sentido.

Para já, estas forças poderão ser retiradas, numa primeira fase, de países vizinhos onde os EUA continuam a ter uma presença importante, como o Quénia e o Djibouti, que, segundo oficiais norte-americanos contactados pela AFP, não foi suficiente para evitar um crescendo da actividade terrorista da al-shabbab.

Este reposicionamento de forças dos EUA na Somália coincide com a eleição do novo Presidente do país, Hassan Sheikh Mohamud, ao fim longos meses de intensos ataques terroristas, especialmente na capital, Mogadíscio.

A presença militar dos EUA na Somália tem sido, ao longo de décadas, complicada, como é disso bom exemplo a morte, em 1993, de vários militares nas ruas da capital, e da queda de helicópteros Blackhawk, que acabou por ser um dos mais mediáticos falhanços militares dos EUA...

Desde as Presidências de Bill Clinton e Barack Obama, a presença tem sido efectuada através de campanhas aéreas, especialmente com ataques perpetrados por drones contra posições de grupos alegadamente terroristas mas com a morte registada de inúmeros civis.