Para 24 deste mês, quinta-feira, estava já agendada um encontro em Genebra, na Suíça, entre o experimentado ministro dos Negócios Estrangeiros russo, Sergei Lavrov, e o Secretário de Estado dos EUA, Anthony Blinken, o que, no imediato, era uma garantia de que a "guerra" só faria sentido depois desta derradeira conversa, mas eis que o assunto acaba de ser colocado num patamar de topo, com os Presidente Joe Biden e Vladimir Putin a marcar um encontro a dois para o próximo Domingo. A paz acaba de ganhar pelo menos mais uns dias.

Todavia, nem isso é certo, porque o Kremlin veio colocar água fria no cozido da paz, dizendo que esta Cimeira entre Putin e Biden está a ser anunciada de forma demasiado extemporânea, embora não a recusando.

"O entendimento actual é que deve continuar o diálogo entre ministros. Falar sobre cimeiras entre Presidente é ainda prematuro", avisou o porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, coloando água na fervura do optimismo.

Nesta crise, a mais grave na Europa em décadas, e a que mais possibilidades mostrou para que a Europa volte a ser palco de uma guerra devastadora como não se via desde a II Guerra Mundial, a inevitabilidade de uma invasão russa à Ucrânia só está a ser propalada pelos norte-americanos e pelo seu principal aliado, o britânico Boris Johnson, porque tanto Putin, que sempre negou a iminência de uma invasão, como o francês Emmaneul Macron, e o alemão, Olaf Scholz, nunca deixaram de manter a porta aberta para a paz, apontando que a diplomacia era o único caminho viável.

Agora, como acabam de noticiar as agências internacionais, para o próximo Domingo, embora sem um agendamento ainda definitivo, Biden e Putin vão sentar-se à mesa, por proposta de Emmanuel Macron, que é, de longe, o líder europeu mais empenhado nos esforços para evitar a guerra, tendo como assunto único a discussão da crise no leste europeu.

Esta informação foi avançada pela Presidência francesa em comunicado enviado às redacções, sendo o "mapa" para a paz composto por esta Cimeira a dois, Biden/Putin, e depois com todos os intervenientes, desde logo o Presidente ucraniano, Volodymyr Zelenskyy, e os lideres das Repúblicas separatistas do Donbass, a área ucraniana composta pelas regiões de Donetsk e Lugansk, que faz fronteira com o sudoeste da Federação Russa, Putin, Biden e as potências europeias, desde logo a União Europeia.

HIstórico

As forças independentistas de Donetsk e Luhansk, com apoio de Moscovo, mantêm, desde 2014, estes territórios livres das forças leais a Kiev, mas, com a presença de largas dezenas de milhares de militares e equipamento pesado da Rússia junto à fronteira, o que despoletou uma reacção em cadeia dos países da NATO, EUA e Europa Ocidental, parecem estar agora a querer fechar o círculo de fogo e avançar para uma integração na Rússia, faltando apenas o reconhecimento formal do Governo de Vladimir Putin, embora o Parlamento russo já tenha votado uma proposta nesse sentido.

Desde 2014 já morreram mais de 14 mil pessoas neste conflito de baixa intensidade, no Donbass, onde a população é esmagadoramente russa, cultural e linguisticamente, a maioria civis, mas também do Exército ucraniano e das milícias independentistas, mas nas últimas horas os combates estão a evoluir para um intensidade que não tinha há muito tempo, o que levou já o Presidente russo a lamentar este "agravamento do conflito", apontando o dedo às forças controladas por Kiev a quem acusa de estarem a levar a cabo um genocídio de população russa nestes territórios.

E, para deixar claro que as coisas estão mesmo a evoluir negativamente, o líder separatista da autoproclamada República de Donetsk, Denis Pushilin, não só veio a público confirmar que está a acontecer uma evolução desta guerra para a "larga escala" como informou que uma parte da população civil, que são perto de três milhões de pessoas no total, está a ser evacuada para a Rússia, onde foram criadas condições para o seu acolhimento.

As acusações mútuas sucedem-se, as trocas de tiros entre as forças separatistas das duas repúblicas independentistas repetem-se com cada vez maior cadência, abrindo caminho para uma situação que, segundo os serviços secretos norte-americanos, citados abundantemente pelos media ocidentais mais importantes, é de pré-invasão do leste ucraniano pelas forças russas estacionadas do outro lado da fronteira, mais de 150 mil homens apoiados por tanques, artilharia pesada e meios aéreos de combate. segundo diz a NATO, muito menos, e em fase de retirada, na versão oficial russa .

Até aqui, as armas nucleares estavam fora do cenário. Mas hoje, Sábado,19, isso mudou, com o Kremlin a anunciar que o líder russo, Vladimir Putin, iria para o terreno supervisionar os exercícios com armas nucleares, que incluem lançamento de misseis que, estando armados, podem destruir cidades inteiras, embora considerando sempre que se trata de uma actividade que estava escalonada há muito e que nada tem a ver com a situação actual.

Horas antes, na sexta-feira, Putin, em conjunto com o seu homólogo e aliado, Alexander Lukashenko, disse, em tom de aviso, que ao Governo de Kiev não resta outra alternativa que não seja negociar com os separatistas, o que deixa perceber que Moscovo pode estar apenas interessado em fazer do Donbass parte do território russo, sendo tudo o resto mero engodo para desviar as atenções do objectivo.

E se Volodymyr Zelenskyy, o Presidente ucraniano, não negociar com os separatistas? O caminho para a diplomacia estreita dia após dia. E isso nem sequer está a ser equacionado, o que quer dizer que o Presidente norte-americano, Joe Biden, pode estar certo, quando ainda há menos de 24 horas, veio, com a solenidade de um discurso à Nação, anunciar que Moscovo vai lançar os tanques sobre a Ucrânia, indo mais longe ao dizer que o objectivo não é apenas o Donbass mas sim a própria capital, Kiev.

Moscovo mantém a tese de que se trata de histeria ocidental, que não está a preparar nenhuma invasão, que está a retirar meios e homens da zona de fronteira e que apenas exige da NATO negociações sérias sobre a sua própria segurança mais abrangente face ao crescimento para os países do leste europeu, próximos das suas fronteiras, da Organização Atlântica que foi criada em 1947 contra a então União Soviética e o seu Pacto de Varsóvia, que colapsaram em 1989.

Alias, Putin insiste que quer negociar com base nos Acordos de Minsk, que contêm um mapa para a paz na região, como forma de solucionar a crise no leste europeu, e depois voltar à mesa das negociações para a criação de um novo paradigma que permita à Rússia e aos europeus a ocidente, viveram em paz as suas vidas sem ameaças mútuas.

Um passo nesse sentido, há quem diga que o último onde uma guerra, contida ao Donbass, ou mais abrangente, pode ser evitada, vai ter lugar nas próximas horas com um encontro entre o ministro russo dos Negócios Estrangeiros, Sergei Lavrov, e o secretário de Estado norte-americano, Anthony Blinken, por proposta deste último, com o objectivo de redesenhar caminho para a diplomacia colocando o diálogo na ponta do dedo em vez do gatilho.

Certo, certo é que o caldeirão do Donbass ferve cada vez mais e a margem para negociar parece ir estreitando, especialmente nas manchetes dos media ocidentais, claramente com Moscovo como vilão, enquanto nos media pró-russos, como a RT, o canal internacional russo, o ocidente é retratado como sedento de guerra e com atitudes irresponsáveis quando Moscovo quer apenas conversar seriamente sobre a construção de um futuro de paz...

O Kremlin insiste que as tropas que estavam estacionadas na área de fronteira com a Ucrânia, estão a regressar às suas bases de origem.

Nada disso, atira o Presidente norte-americano, Joe Biden, desde Washington, onde avisou, em discurso televisionado, na semana passada, que a Rússia pode invadir a Ucrânia em breve, nos próximos dias e que não viu ainda sinais de uma retirada das forças russas.

Biden foi mesmo mais agressivo, neste discurso, dizendo que Moscovo está a preparar artificialmente uma razão que justifique a intervenção, repetindo a ameaça de sanções sobre a Rússia e os seus dirigentes nunca vistas, em consonância com os países europeus, caso os tanques avancem, embora já tenha deixado claro que, não sendo a Ucrânia um país-membro da NATO, não haverá, nesse caso, uma resposta militar da organização.

A envolvência económica, como os efeitos desta crise nos mercados do petróleo, as razões históricas, o que uns e outros podem ganhar ou perder... algumas respostas para estas e outras questões nos links em baixo, nesta página.